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terça-feira, 15 de maio de 2012

O trabalho e a construção do belo


“O trabalho revigora a alma, dá sentido, notoriedade e utilidade. O trabalho, seja intelectual, conceitual, operacional, braçal, ainda que condicionante, revela-se como o exercício capaz de nos elevar, de exercer a nossa capacidade mais humana que é criar.”

*por Eliane Assunção

Diante da quantidade de provas corrigidas hoje, véspera do Dia do Trabalhador, feriado, com Bernardo clamando minha atenção, à beira de um ataque de nervos e todos passeando, me veio a reflexão sobre o trabalho que remeteu-me a uma frase de Aristóteles: ”A atividade existe em função do ócio e as coisas necessárias em função das belas”. Esse pensamento traduz a correlação perfeita que atribuímos ao sentido do trabalho, do mais clássico ao contemporâneo, não há como negar, existe sofrimento.

Buscaria todas as correntes de pensamento e nenhuma delas deixaria de pontuar a capacidade que a relação de trabalho tem de subjugar e explorar o homem. No entanto, faz-se necessária, inclusive por conta da necessidade de sobrevivência e de convivência em sociedade - o trabalho trata-se do protocolo mais importante para fins de convívio social - sem trabalho não há referência e segundo Hanna Harendt, independe da natureza humana, trata-se da condição humana, as formas de vida que o homem impõe a si mesmo para sobreviver.

Afinal, por que tanto condicionamento? Confesso que, avaliando a evolução histórica das relações de trabalho, verifico todos os paradoxos possíveis quando definimos que vivemos a revolução tecnológica, telecomunicações, energia nuclear, robótica, um planeta globalizado com um novo cenário econômico dotado de novas estruturas organizacionais, da valorização da informação e da transitoriedade dela e, acima de tudo, da necessidade de novos perfis profissionais: pessoas inovadoras, proativas, participativas, com habilidades, conhecimentos e, acima de tudo, atitude. Ora, características suficientes para não deixar-se condicionar.

Na verdade, nos condicionamos pelos nossos próprios atos, aquilo que pensamos, nossos sentimentos, valores, em suma, os aspectos internos do condicionamento. Quanto aos aspectos externos, meu professor Virgílio Bastos dizia que o sentido dado ao trabalho seguiria as condições sócio históricas em que vivemos, do nosso acesso à tecnologia, aos recursos naturais, da nossa posição na estrutura social, das ideias e da cultura do nosso tempo, do exemplo de trabalhador que cada um de nós tem em nosso meio particularmente devo citar o meu pai, Assunção – nome de guerra - como sempre foi chamado pelos colegas militares. Atribuo a ele a minha entrega ao condicionamento, disciplina e gosto pelo trabalho. Penso que painho seja discípulo de Max Weber: “A perda de tempo é o mais grave de todos os pecados”, traduzida para “acorda para comer corda”, frase com a qual éramos acordados todos os dias, bem cedo.

Por fim, nos condicionamos ao exercício do trabalho, por conta do domínio do saber fazer, conseqüentemente, da vaidade trazida pela habilidade. Essa, sim, nos faz extrapolar os limites da relação institucionalizada, constituída legalmente, operacionalizada pelo cumprimento de horários, de regras e normas traçadas pelas estruturas formais e hierarquizadas desde que a Revolução Industrial transformou o trabalho em emprego e da consolidação das leis trabalhistas em 1943.

O trabalho é uma atividade produtiva com valor para a sociedade e com significado para o indivíduo. Do ponto de vista psicológico e vocacional é um instrumento extremamente positivo que assenta nas forças humanas permitindo o desenvolvimento e o bem estar pessoal. O trabalho revigora a alma, dá sentido, notoriedade e utilidade. O trabalho, seja intelectual, conceitual, operacional, braçal, ainda que condicionante, revela-se como o exercício capaz de nos elevar, de exercer a nossa capacidade mais humana que é criar. Ainda que esgotante, o trabalho é potencialmente satisfatório e significativo e, segundo Ryan, cumprindo determinadas condições, constitui um contexto ideal para a expressão das capacidades e competências pessoais e para a vivência de experiências de auto-determinação, o que implica estabelecer objetivos, tomar decisões, lidar com conflitos, enfim, a base natural para a aprendizagem e o desenvolvimento intelectual.

Enfim, voltando à correção das provas, ainda que Maurício Sena, meu esposo, diga que todas as escolhas são minhas, e desde que Alcides Santana, meu amigo, intitulou-me operária da educação, penso que, como docente, estou construindo algo necessário em função do belo.

*ELIANE ASSUNÇÃO é administradora, professora da Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC), da Faculdade Juvêncio Terra e gerente de projetos da Agência de Desenvolvimento Trabalho e Renda da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista

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