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sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Estudante militante: é possível harmonizar estudo e militância estudantil?

Antônio Ozaí da Silva

* Por Antonio Ozaí da Silva

O estudante militante é um aluno diferenciado. Ao contrário dos muitos que se dedicam com esmero e se concentram em passar de ano, ser aprovados e conquistar o prêmio merecido, o aluno-militante, em geral, desenvolve uma atitude crítica em relação à sociedade, à instituição universitária, ao curso e disciplina. Isto não significa que o acadêmico não militante seja incapaz da reflexão crítica e de posicionar-se criticamente. Contudo, ao contrário daquele que abraça causas coletivas, ele age por motivações essencialmente individuais e se mantém atrelado ao paradigma do aluno ideal que cumpre as tarefas acadêmicas, é plenamente adaptado ao habitus academicus, com capacidade de leitura e facilidade de assimilação e escrita; está entre os que alcançam as melhores notas e sucesso na carreira acadêmica.


De fato, o aluno padrão corresponde às expectativas dos docentes, são os que têm maiores possibilidades de serem escolhidos como monitores e potenciais candidatos a serem orientados em PIC, PIBIC e futuros mestrados e doutorados. Claro, o estudante militante também pode apresentar estas qualidades, mas ele tende a se diferenciar pela atuação política extraclasse, o que, aliás, pela afinidade política-ideológica com este ou aquele docente, abre outras possibilidades de acesso aos espaços institucionalizados – as afinidades eletivas também acontecem para o aluno modelo, mas isto é mascarado com razões pretensamente acadêmicas, aparentemente formais e isentas de valores.

Nesta tipologia, também devemos considerar o aluno rebelde, aquele que não se encaixa no modelo ideal, nem necessariamente está comprometido com a militância. Neste caso, a rebeldia é vista negativamente. A não ser que a atitude rebelde evolua para o comprometimento militante ou para a adaptação às exigências do sistema político-pedagógico, ele terá muitas dificuldades para seguir adiante e concluir satisfatoriamente o curso. Suas chances serão melhores se houver compreensão e apoio docente.

Há, ainda, que levarmos em conta o típico aluno que, por sua história de vida, habitus, pouco capital social e cultural, tem imensos obstáculos para se adequar ao habitus acadêmico – pois faltam-lhe as habilidades e condições básicas para atender às exigências do ensino formal universitário. Estes são os que mais precisam da compreensão e ajuda dos docentes, mas destinam-se, salvo exceções de auto-superação, a serem preteridos pelos alunos mais adaptados ao sistema pedagógico institucionalizado. O aluno modelo permanece sendo o ideal do professor e o sucesso acadêmico é, em grande parte, determinado pela maior ou menor aproximação efetiva a este aluno idealizado. É possível ainda que, diante das dificuldades encontradas no desempenho como estudante, este aluno encontre na militância uma forma compensatória de auto-realização – o que, inclusive, também lhe abre portas no campo acadêmico.

Em qualquer das situações, o estudante militante diferencia-se – ainda que incorpore outras características tipológicas. A depender da postura política-pedagógica, esta diferenciação pode ser encarada de maneira positiva ou negativa. Pessoalmente, concebo positivamente – e isto está vinculado à minha experiência docente e história de vida. Quando fiz a graduação, já incorporava a militância na Teologia da Libertação, no movimento operário e no partido. O apelo a participar do movimento estudantil foi contrabalanceado por este acúmulo prático-teórico. Desde aquela época, pareceu-me claro que o estudante precisa, sobretudo e especialmente, estudar – perdoem o pleonasmo. É isto que se espera dele! A militância não libera o aluno da responsabilidade de cumprir seus deveres acadêmicos, não o desobriga das leituras necessárias à sua formação intelectual, de elaborar as atividades solicitadas, respeitar prazos e ser assíduo, etc.

A qualidade de militante não implica em privilégios – tratamento diferenciado gera injustiças. O estudante militante, por seu compromisso político e social para além da sala de aula, tem a obrigação moral de superar-se academicamente. Em suma – e, novamente, perdoem a redundância – ele não pode descuidar-se de… estudar! E, tratando-se de uma universidade pública, isto adquire o status de um imperativo categórico. Afinal, é a sociedade que financia os estudos e a universidade, embora pública, é seletiva. Muitos dos que gostariam de estudar não passaram pelo funil do vestibular. Diante dessa realidade social, os que tiveram o mérito de ocupar as vagas disponíveis não tem o direito de negligenciar os estudos. O militante que relega seus deveres de estudante corre o risco de perder o respeito daqueles que se propõe a representar. Talvez este seja um dos fatores que induzem ao isolamento cada vez mais intenso do movimento estudantil, restrito aos convertidos e sem vínculos reais com a realidade da maioria dos estudantes.

Conheci estudantes que, admiravelmente, conseguiram harmonizar militância estudantil e estudo. Alguns deles, inclusive, estão na pós-graduação. Também conheci outros que priorizam a militância em detrimento dos estudos e parecem estudantes profissionais, candidatos a jubilar. Conheço muitos que tentam harmonizar a militância com as exigências do habitus academicus e, na prática, não se dedicam a estudar como deveriam. O resultado é o abandono de disciplinas, reprovações ou aprovações não convincentes do ponto de vista do desempenho acadêmico. Nem sempre estudar e militância são compatíveis e, seja como for, sempre apresenta um grau de dificuldade e dilemas às vezes insuperáveis. Quando se é jovem isto pode parecer que não é um problema. Mas o tempo passa para todos. Será que vale a pena envelhecer numa instituição universitária em nome da militância? Como ser militante estudante sem perder o foco no estudante? A reflexão é necessária!

* Antonio Ozaí da Silva: Graduado em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André (1994), Mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1997), Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (2004) e Pós-graduado em História das Religiões, Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá (2007). Docente no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá. Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Teoria Política Contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: política, partidos políticos, educação, pedagogia libertária, anarquismo, marxismo e literatura política. É editor da Revista Espaço Acadêmico [http://www.espacoacademico.com.br], da Acta Scientiarum. Human and Social Sciences (UEM) e coordenador da Revista Urutágua (DCS/UEM), disponibilizada em http://www.urutagua.uem.br. Blog: http://antoniozai.wordpress.com Desenvolve projeto de pesquisa sobre Sociologia da prática científica.

Supremo Tapetão Federal



"Pior ainda quando todos sabem que um outro presidente, o tucano Fernando Henrique Cardoso, assistiu à compra de votos a céu aberto para garantir a reeleição e nada lhe aconteceu. Por mais não fosse, que se mantivessem as aparências"

* Por Ricardo Melo
 
Derrotada nas eleições, a classe dominante brasileira usou o estratagema habitual: foi remexer nos compêndios do “Direito” até encontrar casuísmos capazes de preencher as ideias que lhe faltam nos palanques. Como se diz no esporte, recorreu ao tapetão. O casuísmo da moda, o domínio do fato, caiu como uma luva. A critério de juízes, por intermédio dele é possível provar tudo, ou provar nada. O recurso é também o abrigo dos covardes. No caso do mensalão, serviu para condenar José Dirceu, embora não houvesse uma única evidência material quanto à sua participação cabal em delitos. A base da acusação: como um chefe da Casa Civil desconhecia o que estava acontecendo? A pergunta seguinte atesta a covardia do processo: por que então não incluir Lula no rol dos acusados? Qualquer pessoa letrada percebe ser impossível um presidente da República ignorar um esquema como teria sido o mensalão.

Mas mexer com Lula, pera aí! Vai que o presidente decide mobilizar o povo. Pior ainda quando todos sabem que um outro presidente, o tucano Fernando Henrique Cardoso, assistiu à compra de votos a céu aberto para garantir a reeleição e nada lhe aconteceu. Por mais não fosse, que se mantivessem as aparências. Estabeleceu-se então que o domínio do fato vale para todos, à exceção, por exemplo, de chefes de governo e tucanos encrencados com licitações trapaceadas. A saída foi tentar abater os petistas pelas bordas. E aí foi o espetáculo que se viu. Políticos são acusados de comprar votos que já estavam garantidos. Ora o processo tinha que ser fatiado, ora tinha que ser examinado em conjunto; situações iguais resultaram em punições diferentes, e vice-versa.

Os debates? Quantos momentos edificantes. Joaquim Barbosa, estrela da companhia, exibiu desenvoltura midiática inversamente proporcional à capacidade de lembrar datas, fixar penas coerentes e respeitar o contraditório. Paladino da Justiça, não pensou duas vezes para mandar um jornalista chafurdar no lixo e tentar desempregar a mulher do mesmo desafeto. Belo exemplo.

O que virá pela frente é uma incógnita. Para o PT, ficam algumas lições. Faça o que quiser, apareça em foto com quem quer que seja, elogie algozes do passado, do presente ou do futuro –o fato é que o partido nunca será assimilado pelo status quo enquanto tiver suas raízes identificadas com o povo. Perto dos valores dos escândalos que pululam por aí, o mensalão não passa de gorjeta e mal daria para comprar um vagão superfaturado de metrô. Mas como foi obra do PT, cadeia neles.

É a velha história: se uma empregada pega escondida uma peça de lingerie da patroa para ir a uma festa pobre, certamente será demitida, quando não encarcerada –mesmo que a tenha devolvido. Agora, se a amiga da mesma madame levar “por engano” um colar milionário após um regabofe nos Jardins, certamente será perdoada pelo esquecimento e presenteada com o mimo.

Nunca morri de admiração por militantes como José Dirceu, José Genoino e outros tantos. Ao contrário: invariavelmente tivemos posições diferentes em debates sobre os rumos da luta por transformações sociais. Penso até que muitas das dificuldades do PT resultam de decisões equivocadas por eles defendidas. Mas num país onde Paulo Maluf e Brilhante Ustra estão soltos, enquanto Dirceu e Genoino dormem na cadeia, até um cego percebe que as coisas estão fora de lugar.
terça-feira, 19 de novembro de 2013

UMA PÁGINA NA MINHA VIDA: PERSEGUIÇÃO, PRECONCEITO E CONQUISTAS NA LUTA


* Por Edgar Borges 


Vitória da Conquista, 13 de novembro de 2013.

Nesta semana, em pleno novembro negro, fui instigado a refletir e lembrar-se de uma página que passou em minha vida no exercício de minhas atividades enquanto servidor municipal. E, antes de ir para a lembrança, pergunto, há racismo institucional no governo municipal?


Pois bem, passado 18 anos, minha memória avivada traz essa página que tanto marcou minha vida. Por um lado a perseguição e intimidação tentava barrar a militância em torno de ideais na luta. Era o ano de 1995, entre os meses de agosto e novembro, que antecedia a eleição do Sindicato dos Servidores Municipais, realizada em dezembro daquele ano. No mês de agosto, depois de uma representação sindical significativa para os servidores lotados na Secretaria de Finanças da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, além de uma gestão exemplar na Tesouraria do SINSERV, mesmo sem ser liberado, meu nome foi indicado para encabeçar a chapa da Diretoria do Sindicato como presidente.

 Foi neste momento, final de agosto e início de setembro de 1995 que as intimidações começaram. Como servidor lotado na Contadoria Geral, técnico em nível médio com formação em contabilidade, responsável por serviços como o conta corrente, o razão, os empenhos por estimativa, fechamento de balanço e folha de pagamento, em sumo, acesso a toda documentação reveladora das ações de um gestor. E, dentre as motivações pela colocação à disposição, minha chefa D. Mércia foi a primeira a alertar, comunicar e até aconselhar que devesse rever minha posição pela responsabilidade que o setor propiciava. Alegava ainda que mesmo sabendo da capacidade e honestidade a minha investida na política sindical confrontava com os interesses do governo. Outros motivos que Mércia  alertou foi quanto à família; e por certo, naquele momento meus filhos  eram menores de dois anos e as responsabilidades familiares com o baixo salário que a prefeitura pagava foi alertado por ela. Mesmo assim não recuei e mantive minha posição. Resultado veio, depois de 08 anos como servidor municipal, mesmo antes ter exercido a função de Gari e de Almoxarife I na merenda escolar, fui pela primeira vez, COLOCADO A DISPOSIÇÃO DO SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO EM SITUAÇÃO DE INTIMIDAÇÃO/PERSEGUIÇÃO.

Esta situação foi constrangedora e muito dolorida quando tive que afastar impiedosamente antes de acontecer à eleição; mais também foi pensada e decidida pessoalmente, visto que defender a categoria dos servidores era meu objetivo. No entanto, 03 três meses antes do previsto, à disposição enfrentei o secretário de administração. Este, o Sr. Vicente, também tentou em suas palavras reverter e desencorajar o que eu já havia determinado. Nas palavras houve ameaças de corte de salários, demissão e aconselhamento. Não temi e mais alertei sobre direitos quanto às normas sindicais e que em edital e inscrição de chapa, concorria à eleição, portanto a administração não poderia transferir ou retirar direitos, perseguir politicamente. RESULTADO, O SECRETÁRIO DECRETOU QUE NÃO PODERIA RETORNAR A CONTABILIDADE E QUE A PARTIR DAQUELE MÊS EU IRIA EXERCER MINHAS FUNÇÕES NO LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLINICAS NA SECRETARIA DE SAÚDE.
Nesta nova atribuição, mesmo não compatível com a função, fui bater exames de fezes, sangue e entregar resultados dos exames do laboratório municipal que existia no fundo da Secretaria de Saúde. Foram 03 meses em que não tive contato com secretário (parece que era Dr. Uagnis) e a coordenadora (acho que a sra. Mônica Achy), porém lembro muito bem do bioquímico (dr. Ubirajara Cairo) e dos técnicos (seu Arnaldo e Moarene) e da colega que entregava e datilografava os exames (Marlene). Mesmo com as dificuldades de entender e ler os exames patológicos e laboratoriais, foram três meses de experiência e que após a eleição do SINSERV, com a posse no final de dezembro/95, deixei colegas e uma experiência que até hoje carrego; que mesmo  com essa “humilhação” imposta e se assim poço dizer “perseguição” foi um aprendizado e que hoje reflito: será que tudo isso teve além das questões políticas, outras motivações como as de questões raciais? Ou foram coincidências e consequências da conjuntura?
Agora, com um olhar para o outro lado, foram momentos importantes que marcaram minha vida. Não submeti as intimidações, ao preconceito e mesmo tendo que abrir mão das relações pessoais e acometer dificuldades aos familiares; poço dizer e lembrar hoje que ao ser COLOCADO A DISPOSIÇÃO POR PERSEGUIÇÃO E OU INTIMIDAÇÃO teve resultados importantes para a coletividade dos servidores municipais - a história do Sindicato dos Servidores Municipais ficou marcada com minha gestão após o relato dessa página de lembranças. E, pessoalmente na minha ficha funcional e profissional não aparecer em nenhum momento faltas, suspensão, inquérito administrativo ou malversação do erário público neste mais de 26 anos de vida como servidor público municipal. Colocado a disposição por qual motivo? Deixou de realizar as atividades atribuídas? Abandono e afastamento das funções? Que resposta?

Portanto, fica aqui esse apontamento, que hoje, 13 de novembro de 2013, em pleno mês que rememoramos a luta contra o racismo e o preconceito fui incitado a descrever esta página de minha vida, vivenciado, neste mais de 26 anos dedicados a servir a população conquistense com serviços nas áreas de: limpeza pública, abastecimento e distribuição de merenda nas escolas municipais, serviços contábeis para assegurar a gestão municipal aprovação das contas públicas, defesa dos direitos e melhorias para os servidores municipais, preservação das áreas ambientais do município, estudos e elaboração do planejamento urbano, mobilização da população para a gestão do orçamento público, coordenação das ações de moradia e habitação às famílias de baixa renda, atuação e incentivo ao controle social da população junto fiscalização aos recursos públicos.  Foram esses serviços que enriqueceram e trouxeram para mim este curriculum público sujeito ainda a ser colocado à disposição sem porque e para que.  

Edgar Borges – Servidor Público da Prefeitura de Vitória da Conquista
domingo, 17 de novembro de 2013

Historiador e Jornalista Fábio Sena faz justa homenagem aos anos 80.


*  Herberson Sonkha

O vídeo publicado pelo Blog do Fabio Sena silenciou uma geração de nostálgicos ao exibir momento memoráveis com alguns notáveis que de maneira especial viveram os dias de gloria no Poirão, na Bartolomeu de Gusmão ou na Vitor Brito ao som da boa musica na Bahia e suas implicações sócio-históricas. O curta-metragem em forma de documentário originalíssimo, sem qualquer edição, faz um resgate histórico da memoria coletiva dos conquistenses, ao retirar do fundo do baú uma pérola, ou melhor, uma relíquia artístico cultural que trata com riqueza de detalhes a sócio-história cultural da Bahia, com forte influências em, e, de Vitória da Conquista, num momento impar para a produção musical no Estado da Bahia, vale lembrar que naquele período não havia qualquer inserção de grande importância no mercado nacional e internacional para a musica produzida na Bahia. 


O produto Axé Music (aqui cabe o devido registro da diferença entre o musicista Luiz Caldas criador desta expressão na musica e o que derivou do produto de mercado Axé Music pós Luiz Caldas) deu visibilidade a grandes musicistas baianos, no entanto, para manter-se produtivo a musica passou por um processo de profissionalização mercantil, adequando-o aos interesses econômicos que idiotiza qualquer saber para facilitar o marketing perdendo sua aquiescência de musica com propósito social, crítico e muita musicalidade. É preciso conhecer um pouco mais desta história dos Conquistenses para perceber a simbologia e identificar a sentimentalidade desta importante publicação. 

Vitória da Conquista dos anos 80 era uma cidade pequena, racista, xenófoba e elitizada com arroubos de grandeza (questionável) característica de província governada por coronéis conservadores e reacionários. Havia poucas opções de diversão, principalmente festa de largo, como oportunidade para os filhos dos trabalhadores e a maioria da população que era pobre e negra. As Barraquinhas, Festa da Padroeira na frente do Clube Social; Barracões descentralizados, realizados nos bairros e o Carnaval que saia da porta do Clube Social passando pela Praça das Borboletas e no final dos anos 80 mudou para outro circuito saindo da Praça do Gil e a Bartolomeu de Gusmão. Fora isso, havia as casas de show como Taquara, Ticronais, Cafezal, Cabana da Sereia, Urca, 706 e o Kailak no Patagônia e os clássicos Bordeis de Beto, Fogo Azul e os violentos prostibulos da Rua da Brasília. 

O espaço urbano extremamente elitizado, a cidade não foi pensada para atender aos trabalhadores e por isso parte desta massa se deslocava para a Barragem do Poço Escuro e quando foi extinta pelo governo de José Pedral para alimentar a Praça Tancredo Neves, antigas Praça das Borboletas, as pessoas deslocava-se para a barragem de Anagé, Maçal e Água Fria na Barra do Choça e mais tarde Águas do Catolé. O primeiro clube a surgir foi o Clube Social Conquista inaugurado em 1945, depois a AABB fundada desde 1965 e o Country Club Primavera criado em 1982. Havia espaço para quem pertencia a leite conquistense, seja como profissional liberal, seja como comerciante, seja como empresário do setor agropecuário. O que não havia mesmo era espaço de diversão e entretenimento para os trabalhadores.

É neste contexto que surgem as Escolas de Samba e o Carnaval de Rua em Vitória da Conquista. Os clubes, espaço privativo aos endinheirados Conquistenses de cidades circunvizinhas, começavam perder sua força porque a festa de salão cedeu à força do Carnaval de Rua e tornava-se mais popular no inicio do século XX e seu carro chefe eram as marchinhas carnavalescas mais animadas e como textos mais próximos da vida suburbana. Trazida da Europa no século XVII, os setentistas eram fidalgos, filhos dos barões do agronegócio no Brasil, esta festa foi trancafiada nos clubes para evitar que os penetras (a população negra e mestiça) participassem ou era realizada pelas ruas centrais me desfiles nos famosos cordões e famosos cortejos de automóveis luxuosos excluindo a população, particularmente trabalhadores e a população negra. 

O século XX marca um novo tempo para a arte no Brasil, sendo fortemente influenciada pelos artistas comunistas da semana da arte moderna (1922). O surgimento da primeira escola de samba vai ocorrer em agosto de 1928 quando foi criada no Brasil, no Rio de Janeiro, a Escola de Samba “Deixa Falar”, anos depois passaria a ser chamada de Estácio de Sá passando a fazer parte das Ligas de Escolas de Samba e os campeonatos com seus belíssimos enredos, vestimentas e animação. O carnaval de Rua começa a se alastrar pelo país como febre e no nordeste recebe toda a carga cultural regional marcadamente pela expressão nordestina e consolidando as ruas como geoespacialidade própria para realização da maior expressão popular do mundo.

Os anos 80 em Vitória da Conquista o Carnaval de Rua ganha dois circuitos claramente distintos: Praça do Gil e Bartolomeu de Gusmão. O governo municipal daquele período instituiu estes espaços e eles foram ao longo desta curta trajetória se consolidando e forjando sua própria personalidade, pois mesmo saído da Praça do Gil, espaço da elite conquistense, a chegada a Vitor Brito e conclusão na Bartolomeu de Gusmão modificava-se o perfil dos foliões e a musicalidade fluía com mais animo e alegria. Havia o Bloco Mássicas e o Executivo para a elite e a classe média, mas havia também o Bloco Fascinação voltado para os trabalhadores e pobres, Blocos alternativos e as escolas de Samba que traziam, além do enredo com a temática de classes sociais distintas, havia também a força marginalizada dos cânticos, vestimentas e danças das religiões de matriz africana.

O trecho do circuito a partir da Praça Vitor Brito tinha capilaridade complementares do circuito porque contava com varias barracas, parque de diversão e o inexorável poeirão e os galpões das escolas de samba que deixava este trecho popular com a cara da periferia da cidade. O poeirão era um lugar de shows empoeirado que a prefeitura contratava para realização de shows de intervalos visando evitar a migração em massa das populações pobre à Praça do Gil. O Poeirão servia de controle de espaço para evitar o desconforto da elite conquistense de ter que dividir seu espaço com “gentinha”, pois esse era o tratamento dado às populações periféricas neste trecho. 

Não era muito difícil identificar essa “galera”, folião “populacho”, porque se vestia a rigor da festividade com shorts jeans desbotado e rasgado; camiseta regata ou sem mangas e bem cavada; bolso estufado pela carteira da Caerê; tênis de marcas populares (Kichute, bamba, All Star, conga, Montreal, Rainha e Adidas); cabelo com gel new wave e um cantil (conexões de canos tigre) cheio de batida de maracujá com leite condensado. A dança geralmente era coletiva e cheio de passos bem sincronizados alguns oriundos do Break ou agressiva com cotoveladas porque sempre estava a espreita da disputa de espaços com “gangs” rivais e para recordar não poderia deixar de lembrar de algumas históricas brigas de “gang” entre o bairro Alto Maron e o São Vicente; bairro Alegria com patagônia, este último que quase sempre rivalizava com a “gang” da Rua do Piolho, que era uma perigosa rua de “mulheres” que ficava num recorte geoespacial por causa do Aeroporto situado entre o Bairro Patagônia e o Alegria, limítrofe com o Orfanato e as Bateias, portanto era odiado pela “gang” do patagônia”.

As musicas tocadas no carnaval dos anos 80 tratavam do cotidiano de gente comum, anônima, mas havia a mística e a crítica do que viria ser um Pop carnavalesco. O que marca a Bahia no cenário nacional e internacional foi o lançamento de um clip em 1988 com uma musica cantada por vários artistas baianos, We Are The World Of Carnaval. Escrita por Nizan Guanaes e gravada por músicos os artistas homenageavam o carnaval baiano ao mesmo tempo em que levantava dinheiro para as obras de Irmã Dulce. Mais 100 artistas e personalidades baianas como Lazzo, Gerônimo, Luiz Caldas, Daniela Mercury, Ricardo Chaves, Missinho, Jorge Zarath, Jussara Silveira, Margareth Menezes, Durval Lélis mostraram ao mundo a musicalidade na Bahia.

Mas, a Bahia também produziu (continua produzindo) grandes composições que não aparece na mídia porque sua proposta visa à dominação de massa como o que viria a ser o Axé. Certamente o que pensara Luiz Caldas quando usou pela primeira vez a expressão Axé Music na mídia nacional num programa do Faustão e nunca mais foi convidado a qualquer atividade da Globo pela critica feita no ar em horário nobre aos capitalistas que investem no mercado musical visando tão somente seu investimento e o lucro. O Axé surge para qualificar um novo momento nacional e internacional da musical na Bahia, mas não é exatamente isso que assistimos hoje e muito menos deu origem a musica baiana. 

O berço da musica na Bahia passa distante da idiotização cantada por grupos midiáticos, pois além de produzirem lixo para alienar, estimula a misoginia e o machismo. Não pretendo fazer quaisquer esclarecimentos conceitual sobre música, mas vou destacar outra vez que musica na acepção da palavra é algo bem diferente do se faz hoje em grande escala e divulgado pela mídia na Bahia. Com raras exceções, é claro, o que se propagandeia pelo país (truque de marqueteiro) é algo deplorável e se vende como se fosse algo palpável e de qualidade. Aliás, pelo contrário, é algo medíocre, prosaico e de pior qualidade. 

Apesar desta triste realidade, podemos classificar a produção da boa musica na Bahia como MPB sem nenhum prejuízo. Porque a MPB quando surgiu em 1966, enquanto gênero musical a partir da segunda geração da bossa-nova, ela recebeu influência de outros ritmos (forro, rock e o samba) num país rico e diversificado culturalmente. Este gênero possui uma manifestação estética com pertencimento, identidade cultural e traz consigo a memória coletiva preservada como espaço social diferenciado para as diversas leituras do Brasil. 

Além das letras, há sim um cuidado com arranjos, acordes, cenário e figurino na Bahia presente na boa musica na Bahia. Há uma produção bastante interessante que vai do rock, passando pelo reage, pelo samba ao afoxé e outras expressões culturais de matriz africana. A Bahia é um celeiro musical do mundo (Caetano, Naná Vasconcelos, Tom Zé, Adelmário Coelho, Luiz Caldas, Lazzo Matumbi, Gerônimo, Gilberto Gil, Elomar Figueira, Xangai, Maria Bethânia, Dorival e Família Caymme, Ylê Aiê, Olodum, Araketu e outros) e bastante diversificado, basta percorrer as várias regiões do interior baiano e da capital para descobrir a riqueza artística presente com sua simbologia e ritmos variados. 
sábado, 2 de novembro de 2013

O marxismo da adversidade: Hannah Arendt e Walter Benjamin

Foto: Cristina Portella

* Publicado por Carta Maior

O painel Transformações da teoria marxista, no II Congresso Marx, reuniu investigadores interessados em dois filósofos: Hannah Arendt e Walter Benjamin.

Lisboa - O sugestivo painel “Transformações da teoria marxista”, no II Congresso Karl Marx, reuniu investigadores interessados em dois grandes filósofos que, apesar de não poderem ser definidos como marxistas, a este pensamento não foram indiferentes. Trata-se de Hannah Arendt e Walter Benjamin. 


Sofia Roque, doutoranda em Filosofia pela Universidade de Lisboa, considera que “no legado de Hannah Arendt encontramos uma original tentativa de pensar o presente sem se estar condicionado pelas condições do presente”. Para a filósofa alemã, só seríamos contemporâneos daquilo que a nossa compreensão alcançar. 



“Afirmando a capacidade criadora da ação humana, ligada a uma faculdade capaz de formulação de juízos originais sobre o mundo, Hannah Arendt não anuncia nas suas obras a possibilidade da humanidade salvar-se de si mesma, antes defende que é o próprio mundo, enquanto artifício humano, que tem de ser transformado – essa é a resposta política, em todos os seus sentidos”, escreveu Sofia.



No trabalho apresentado, Sofia procurou refletir sobre a condição humana a partir do estudo de Arendt e “o seu estreito diálogo crítico com o pensamento de Karl Marx”. “Considerar a definição da política como a experiência performativa e positiva da liberdade, criticar a relação entre necessidade e liberdade, bem como uma visão determinista da História, e questionar a problemática distinção entre o social e o político, são alguns passos da investigação sobre a qual se baseia esta comunicação.” 



Um dos livros sobre os quais a estudiosa de Arendt se debruçou foi A Condição Humana. Nele, encontraríamos a “elaboração de um novo conceito de poder que recupera e implica novas noções, como a do espaço público como espaço de poder; a da legitimidade da organização comunitária assente num contracto social original; a do ser humano como animal político; a da esfera da ação humana como a esfera política e a relação desta com as outras atividades humanas, a saber, o labor e o trabalho”.



O marxismo pela lente de Benjamin



Fabio Mascaro Querido, doutorando em Sociologia pela Universidade de Campinas, dedicou-se à obra de Walter Benjamin, mas pelo olhar de dois conhecidos intelectuais e militantes trotskistas, Michael Löwy e Daniel Bensaïd. Além do interesse pelo filósofo alemão, tinham muitos outros pontos de contato em sua história de vida.



Herdeiros do marxismo de Lênin, Rosa Luxemburgo e Trotsky, acabam por encontrar nas reflexões de Benjamin uma espécie de “bússola”, por meio da qual se orientar em meio às mudanças históricas do capitalismo global e ao refluxo das lutas sociais no pós-1968 em França. Militantes da Liga Comunista Revolucionária (LCR), seção francesa da IV Internacional, e vivendo desde os anos 60 em Paris, ambos inscrevem-se, segundo Fabio, numa mesma “geração intelectual” cuja marca fundamental foi a “passagem” de um mundo no qual a revolução social parecia iminente para outro no qual os horizontes pareciam cada vez mais estreitos. 



Para enfrentar esta “passagem” de crise do pensamento marxista, o marxismo “herético” e “infiel” de Walter Benjamin parecia uma saída. Bensaïd afirmou: “A fim de nos aventurarmos neste labirinto, nós escolhemos Walter Benjamin, não como guia, mas como modesto passador. Quem, melhor que este outsider errante e rebelde, poderia religar as pistas da linguagem, da história e da política na encruzilhada das grandes tradições culturais europeias?” “Em Löwy, do mesmo modo, o 'marxismo da adversidade' de Benjamin atuava como meio de passagem, de abertura a novos horizontes, em uma palavra, como resposta ao enfraquecimento da esquerda política radical”, explicou Fabio.  



“Para Michael Löwy, a originalidade do pensamento de Walter Benjamin decorre de sua capacidade incomum de articular o marxismo (do qual ele se aproximou em meados da década de 1920), às raízes românticas e utópico-teológicos de suas reflexões de juventude. Segundo ele, marxismo libertário, romantismo e messianismo judaico combinam-se, no pensamento benjaminiano, no contexto de uma crítica radical às ideologias do progresso e ao paradigma civilizatório moderno.”

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