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sexta-feira, 22 de novembro de 2013
Estudante militante: é possível harmonizar estudo e militância estudantil?
novembro 22, 2013
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por
Vinícius...
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Antônio Ozaí da Silva |
* Por Antonio Ozaí da Silva
O estudante militante é um aluno diferenciado. Ao contrário dos muitos que se dedicam com esmero e se concentram em passar de ano, ser aprovados e conquistar o prêmio merecido, o aluno-militante, em geral, desenvolve uma atitude crítica em relação à sociedade, à instituição universitária, ao curso e disciplina. Isto não significa que o acadêmico não militante seja incapaz da reflexão crítica e de posicionar-se criticamente. Contudo, ao contrário daquele que abraça causas coletivas, ele age por motivações essencialmente individuais e se mantém atrelado ao paradigma do aluno ideal que cumpre as tarefas acadêmicas, é plenamente adaptado ao habitus academicus, com capacidade de leitura e facilidade de assimilação e escrita; está entre os que alcançam as melhores notas e sucesso na carreira acadêmica.
De fato, o aluno padrão corresponde às expectativas dos docentes, são os que têm maiores possibilidades de serem escolhidos como monitores e potenciais candidatos a serem orientados em PIC, PIBIC e futuros mestrados e doutorados. Claro, o estudante militante também pode apresentar estas qualidades, mas ele tende a se diferenciar pela atuação política extraclasse, o que, aliás, pela afinidade política-ideológica com este ou aquele docente, abre outras possibilidades de acesso aos espaços institucionalizados – as afinidades eletivas também acontecem para o aluno modelo, mas isto é mascarado com razões pretensamente acadêmicas, aparentemente formais e isentas de valores.
Nesta tipologia, também devemos considerar o aluno rebelde, aquele que não se encaixa no modelo ideal, nem necessariamente está comprometido com a militância. Neste caso, a rebeldia é vista negativamente. A não ser que a atitude rebelde evolua para o comprometimento militante ou para a adaptação às exigências do sistema político-pedagógico, ele terá muitas dificuldades para seguir adiante e concluir satisfatoriamente o curso. Suas chances serão melhores se houver compreensão e apoio docente.
Há, ainda, que levarmos em conta o típico aluno que, por sua história de vida, habitus, pouco capital social e cultural, tem imensos obstáculos para se adequar ao habitus acadêmico – pois faltam-lhe as habilidades e condições básicas para atender às exigências do ensino formal universitário. Estes são os que mais precisam da compreensão e ajuda dos docentes, mas destinam-se, salvo exceções de auto-superação, a serem preteridos pelos alunos mais adaptados ao sistema pedagógico institucionalizado. O aluno modelo permanece sendo o ideal do professor e o sucesso acadêmico é, em grande parte, determinado pela maior ou menor aproximação efetiva a este aluno idealizado. É possível ainda que, diante das dificuldades encontradas no desempenho como estudante, este aluno encontre na militância uma forma compensatória de auto-realização – o que, inclusive, também lhe abre portas no campo acadêmico.
Em qualquer das situações, o estudante militante diferencia-se – ainda que incorpore outras características tipológicas. A depender da postura política-pedagógica, esta diferenciação pode ser encarada de maneira positiva ou negativa. Pessoalmente, concebo positivamente – e isto está vinculado à minha experiência docente e história de vida. Quando fiz a graduação, já incorporava a militância na Teologia da Libertação, no movimento operário e no partido. O apelo a participar do movimento estudantil foi contrabalanceado por este acúmulo prático-teórico. Desde aquela época, pareceu-me claro que o estudante precisa, sobretudo e especialmente, estudar – perdoem o pleonasmo. É isto que se espera dele! A militância não libera o aluno da responsabilidade de cumprir seus deveres acadêmicos, não o desobriga das leituras necessárias à sua formação intelectual, de elaborar as atividades solicitadas, respeitar prazos e ser assíduo, etc.
A qualidade de militante não implica em privilégios – tratamento diferenciado gera injustiças. O estudante militante, por seu compromisso político e social para além da sala de aula, tem a obrigação moral de superar-se academicamente. Em suma – e, novamente, perdoem a redundância – ele não pode descuidar-se de… estudar! E, tratando-se de uma universidade pública, isto adquire o status de um imperativo categórico. Afinal, é a sociedade que financia os estudos e a universidade, embora pública, é seletiva. Muitos dos que gostariam de estudar não passaram pelo funil do vestibular. Diante dessa realidade social, os que tiveram o mérito de ocupar as vagas disponíveis não tem o direito de negligenciar os estudos. O militante que relega seus deveres de estudante corre o risco de perder o respeito daqueles que se propõe a representar. Talvez este seja um dos fatores que induzem ao isolamento cada vez mais intenso do movimento estudantil, restrito aos convertidos e sem vínculos reais com a realidade da maioria dos estudantes.
Conheci estudantes que, admiravelmente, conseguiram harmonizar militância estudantil e estudo. Alguns deles, inclusive, estão na pós-graduação. Também conheci outros que priorizam a militância em detrimento dos estudos e parecem estudantes profissionais, candidatos a jubilar. Conheço muitos que tentam harmonizar a militância com as exigências do habitus academicus e, na prática, não se dedicam a estudar como deveriam. O resultado é o abandono de disciplinas, reprovações ou aprovações não convincentes do ponto de vista do desempenho acadêmico. Nem sempre estudar e militância são compatíveis e, seja como for, sempre apresenta um grau de dificuldade e dilemas às vezes insuperáveis. Quando se é jovem isto pode parecer que não é um problema. Mas o tempo passa para todos. Será que vale a pena envelhecer numa instituição universitária em nome da militância? Como ser militante estudante sem perder o foco no estudante? A reflexão é necessária!
* Antonio Ozaí da Silva: Graduado em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André (1994), Mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1997), Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (2004) e Pós-graduado em História das Religiões, Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá (2007). Docente no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá. Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Teoria Política Contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: política, partidos políticos, educação, pedagogia libertária, anarquismo, marxismo e literatura política. É editor da Revista Espaço Acadêmico [http://www.espacoacademico.com.br], da Acta Scientiarum. Human and Social Sciences (UEM) e coordenador da Revista Urutágua (DCS/UEM), disponibilizada em http://www.urutagua.uem.br. Blog: http://antoniozai.wordpress.com Desenvolve projeto de pesquisa sobre Sociologia da prática científica.
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