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domingo, 29 de novembro de 2015

Professor Marcelo Neves é um dos pré-candidatos à prefeito de Vitória da Conquista.

"A pré-candidatura do COESO às prévias obedece ao ritual previsto pelo estatuto do partido e tem como objetivo principal pautar o debate interno do partido sobre a necessidade de rediscutir o programa de governo."

Nesta manhã de sábado (28), na sede do Partido dos Trabalhadores de Vitória da Conquista, o Diretório Municipal se reuniu para uma análise aprofundada sobre a conjuntura brasileira e definir um calendário de atividades internas voltadas para discussão sobre a sucessão municipal que culminará na definição de uma candidatura a prefeito, que disputará as eleições de 2016. A pauta do diretório municipal propôs analisar a conjuntura política; estabelecer o calendário para o processo coletivo de escolha de candidatura majoritária e; atualizar o Programa de Governo iniciado em 1997 pelo atual prefeito Guilherme Menezes.


Marcelo Neves Costa,
Administrador, Professor Universitário
 militante petista do COESO
Após a análise de conjuntura política nacional, estadual e municipal com o Professor Dr. Geraldo Reis, Secretário de Estado, o diretório estabeleceu por meio de consenso prazo para reuniões e a formação de uma Comissão Política constituída por todas as forças e Coletivos internos que tratarão da sucessão municipal. O calendário aprovado definiu que no dia 12 de dezembro todas as forças internas apresentarão suas teses de governo e nomes para as pré-candidaturas internas às prévias, com limite fixado até abril de 2016, data que encerra registro de candidaturas.  
O Coletivo Ética Socialista (COESO) apresentou a pré-candidatura do Administrador e Professor da UNEB Marcelo Neves, para participar das previas do partido. Um dos dirigentes do coletivo, o militante do movimento negro, professor e graduando em Ciências Econômicas/UESB, Herberson Sonkha, após intervenção no pleno oficializou o nome do Professor para o pleito.

A trajetória política do militante petista iniciou na UESB dos anos 90 quando ainda cursava Administração. Uesbiano da boa safra de lideranças estudantis dos anos 90, do século XX, Marcelo Neves fez sua inserção política no Movimento Estudantil universitário por meio do Coletivo, que hoje passou a ser denominado de Coletivo Ética Socialista-COESO. Sua atuação combativa no Coletivo universitário, formado pela maioria de petistas ligados aos movimentos sociais com militância à esquerda, contribuiu para criação do DCE/UESB e fortalecimento do movimento estudantil da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

A forte e bem articulada militância no Movimento Estudantil universitário deu ao Coletivo uma expressão imbatível, tornando-se a principal força estudantil nos três campi universitários da UESB (Vitória da Conquista, Jequié e Itapetinga) naquele período, compondo ou dirigindo os principais CA’s e DA’s que culminou na eleição de Marcelo Neves ao DCE.

Egresso das bases da igreja católica, ligado a teologia da libertação, Marcelo Neves foi membro fundador do Grupo Fé e Cultura, depois Caritas e atualmente mantem-se ligado às ações do Conselho de Leigos. Após conclusão do curso passou a fazer parte do quadro de administradores que assessorava gestão e planejamento estratégicos de empresas parceiras do Sebrae. Bacharel em Administração lecionou como professor substituto da UESB, FTC e atualmente é professor concursado da UNEB de Guanambi. O professor Marcelo Neves também é concursado da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista e trabalhou na Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, gestor das contas bancarias dos programas da secretaria. 


A pré-candidatura do COESO às prévias obedece ao ritual previsto pelo estatuto do partido e tem como objetivo principal pautar o debate interno do partido sobre a necessidade de rediscutir o programa de governo; analisar melhor a caráter dos desgastes “naturais” do governo petista nestes quase vinte anos de governo; fortalecer mecanismos de gestão democrático que efetive a participação popular, espacialmente daquelas populações em situação de vulnerabilidade socioeconômica e política; discutir questões referentes à gestão pública democrática e participativa; fortalecer o controle social de programas, projetos e ações governamentais; Desburocratizar o governo por meio da descentralização das decisões políticas, administrativas e financeiras e; combater sistematicamente quaisquer comportamento que transforme o governo em condomínio de poder.
segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A IGUALDADE RACIAL DE ANAGÉ PARTICIPA DA MARCHA DAS MULHERES NEGRAS EM BRASÍLIA

Sepromi Bahia: Lúcia Brabosa
Compir Anagé Aurenice Cardoso

* Por Herberson Sonkha

A Prefeitura Municipal de Anagé apoiou e indicou representantes quilombolas para a Marcha das Mulheres Negras em Brasília, no dia 18 de novembro. A atividade foi organizada pela Coordenação Municipal de Promoção da Igualdade Racial (COMPIR) e contou com a presença de quilombolas de Mandacaru a Água Doce. O Governo da Renovação adotou as políticas públicas da igualdade racial, as Políticas para as Mulheres (SPM) e a agenda dos movimentos sociais étnicos raciais. 

Marcha das Mulheres Negras 2015
Brasília, 18 de novembro 2015. Mais 30 mil mulheres negras de todo o país tomam as avenidas bem instaladas da cidade satélite. Elas são muitas, intensas, vigorosas, pisam forte sobre a capital do Brasil e impõem palavras de ordem que indiciam a sua situação degradante e opressiva das mulheres negras, gritam intrépidas contra o racismo, denunciam a violência sexual e pauta a sociedade brasileira pela necessidade do bem viver. Milhares delas de todos os cantos do Brasil, da América Latina, da Europa e da África numa só jornada de luta: a “Marcha das Mulheres Negras, contra o racismo, a violência e pelo bem viver.” Um marco político respeitável, içou um contraponto sociopolítico e incomodou a ordem idílica dos conservadores machistas, despertando os olhares mais distraídos da sociedade para a questão urgente das mulheres negras brasileiras. 

O mundo já não suporta mais tanta violência sexual e o Brasil não pode ser mais o mesmo. Anagé é uma dessas expressões que vem acompanhando as lutas e participou ativamente deste momento histórico para as mulheres negras brasileiras. As estatísticas mostram números assustadores, que superam índices de outras violências no país. A cada 10 minutos uma mulher é estuprada no Brasil, afirma o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2013), dos casos registrados de estupros no Brasil são totalizados 50.320, na média, são seis mulheres a cada hora, uma a cada 10 minutos.

A secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) da Presidência da República, Aparecida Gonçalves, afirma que “A violência sexual é a mais cruel forma de violência depois do homicídio, porque é a apropriação do corpo da mulher – isto é, alguém está se apropriando e violentando o que de mais íntimo lhe pertence. Muitas vezes, a mulher que sofre esta violência tem vergonha, medo, tem profunda dificuldade de falar, denunciar, pedir ajuda.”

O país convive com o descumprimento cotidiano do código penal brasileiro que considera que o “estupro é constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Infelizmente ainda é flagrante a negligencia com a Lei nº 12.015, em 2009 que é unificação dos tipos penais de "atentado violento ao pudor" e "estupro". A Lei Maria da Penha é um importante caminho para confirmar as diversas formas de violência sexual que transpõe o estupro. 

Esta conquista das mulheres considera no artigo 7, alínea III que “a violência sexual cometida em contexto de violência doméstica e familiar como sendo: qualquer conduta que constranja a vítima a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade; que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.”

A violência sexual não é, e nuca foi um ato desumano para a maioria das pessoas e que alegam serem situações isoladas, ignorando os números apresentados nas estatísticas desenvolvidas por centros de referencia e atendimentos às mulheres vitimas destas barbaridades. Este fato hediondo continua sendo um comportamento “normal” que não impacienta a sociedade dos humanos, dita evoluída. Para a sociedade brasileira, os indicadores de violência sexual, nunca passou de eufemismo das feministas justificado pelo pífio argumento machista de guerra dos sexos, um desafeto particular de lésbicas ou mulheres independentes que querem tomar a supremacia machista e substituir o lugar de domínio dos homens.  

Alheia a esta apavorante escalada crescente de violência sexual contras as mulheres, a sociedade não desenvolveu um senso de humanidade capaz de censurar tais comportamentos criminosos, embora exista uma legislação punitiva e instituições policiais que tratam destes distúrbios compulsivos no comportamento dos homens. Assim, persiste em crescer o mapa da violência sexual batendo recorde e em contrapartida a impunidade campeia o que leva a crê que o crime de estupro compensa. Deste modo, a violência sexual vai grassando todos os espaços ocupados pelos humanos, em todos os quadrantes do país. 

Mesmo com os avanços de uma legislação específica, instituições policiais, políticas públicas de promoção e proteção e uma rede de combate à violência sexual contra as mulheres, estes números ainda não apresentam tendência de queda no curto prazo. Portanto, não diminuem, aliás, continuam cometendo crimes desta natureza e a sociedade dos humanos é motivada pelo ambiente de impunidade, fazendo uma vítima a cada 10 minutos. E, de maneira geral, os humanos a exceção das mulheres, seguem seu curso plácido sem maiores alterações e de forma emudecida como se fosse mais um “fuxico” de gente despeitada, uma patranha sem qualquer valor que mereça da “sociedade” a sua atenção. 

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

20 de Novembro! Enfim...



"É chegada a hora de aumentar o passo e firmar a pisada porque algo deu “errado” no paraíso que abespinhou a fúria bizarra dos cruéis feitores, donos de tudo e de todos na terra brasilis."

* Por Herberson Sonkha


O ano é o do Nosso Senhor. No comando homens cândidos cuja tessitura das ideias ronda o desejo e o fascínio de matar. Na cabeça, ideias repleta de avaros pensamentos jimbongos, reputação doentia, apetecido por poder e honras. No porta-bagagem uma “mercadoria” com apenas valor de troca. No tombadilho homens salpicados pelo sol escaldante, vestes estranhas e hábitos extravagantes. Nos porões, antes lugar para conter comestíveis e outros objetos, revolve tulha de animais "desalmados", cujas algemas atadas a correntes presas às estruturas, encurtados, moviam-se arrastadamente para observar uns aos outros. De lá se ouvia apenas o tinir dos ferros ou estampidos das chibatas. Sem mais, longos e dolorosos prantos. “Quem são estes desgraçados?” Olvidar do grito preso na garganta?!

Singra a cortina silenciosa do além-mar, algumas vezes revolto, mas sua travessia fora gloriosa aos estúpidos e delituosos mercadores de humanos, não menos pior para as “mercadorias”. Os gemidos e sobressaltos que emergiam dos porões fétidos e tenebrosos das naus, dizia muito que (des)mundo seria esse que recepcionaria estes “desgraçados” ao aportar em terra firme. E que recepção! 

Brasilis! Doce e inspirador lar! Pelo menos para os brancos! Um lugar lindo e exuberante! Uma terra fértil. Repleta de lindos e paradisíacos cenários. Terra de muita fartura! Frutos, animais de todos os portes, muitos minerais preciosos e uma fauna e flora de valor inestimável. Aqui se firmou a peregrinação destes “desgraçados”. Uma via-crúcis que rasgou céu aberto os quatro cantos deste “novo” mundo. Cruzou rios, florestas e matas. Dor e sofrimento ferrados a ferro e fogo na alma dos ditos desalmados, que perpassou todas as constituições e nada acontecia que pudesse mudar, ou apenas repara uma parte ínfima deste sofrer interminável. 

Aqui se chegou, plantou, colheu, cortou, costurou, limpou, construiu, ergueu, fabricou e enriqueceu aos Senhores, mas sequer usufruiu da riqueza da nação, ou pior ainda, alimentou-se do que produziu. Silenciado pela força coercitiva do Estado e mantido cativo pelo desejo de sucessivos governos, estes “desgraçados” que aqui tudo fez, nada recebeu em troca porque o contrato social unilateral estabelecido pelos donos da riqueza não reconhecia animais como humano portador de direitos. Afinal os “desgraçados” são desalmados e como tais são como passer domesticus capturados além-mar e trazidos nas gaiolas, mesmo “solto” ainda vivem como nômade em terras alheias. Não tem casa, família, cultura, religião, história muito menos nome e sobre nome. Séculos se passaram e esta saga sentenciou o “destino” destes “desgraçados”. 

É chegada a hora de aumentar o passo e firmar a pisada porque algo deu “errado” no paraíso que abespinhou a fúria bizarra dos cruéis feitores, donos de tudo e de todos na terra brasilis. Ah meu povo lutador... Intimidação nunca nos intimidou! Os brancos nunca nos quebrantou! Nossa luta começou ao atravessar o portal da Mãe África. Somos guerreiros e guerreiras desde a aurora dos tempos sombrios dos porões. Resistir, pular, gritar, enfrentar, dançar e cantar ao bem viver faz de nossos povos de África, roubados de nossos ancestrais, uma civilização milenar. Lutamos! De “desgraçados” passamos a negros e negras! De ninguém passamos a alguém. De animais passamos a humanos. De humano a pessoa. E de pessoa a sujeitos de nossa própria história. Alude a possibilidade de conceder por gentileza a certificação de cidadania... Só começamos desconstruir a voz passiva, porquanto ainda ecoa viva a voz ativa de Castro: “Quem são estes desgraçados. Que não encontram em vós. Mais que o rir calmo da turba. Que excita a fúria do algoz?
terça-feira, 17 de novembro de 2015

Gênero, feminismos e a reação nazifascista na sociedade moderna.

Fonte: apoiamutua.milharal.org
* Por Herberson Sonkha

A principal razão deste breve ensaio foi à reação retrógrada habitual das elites conservadoras brasileiras contra o Ministério da Educação. O conservadorismo questiona a citação da escritora francesa Simone de Beauvoir no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2015. A cantilena é contra a autonomia do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), órgão responsável por elaborar as provas do ENEM. A ladainha está no introito da prova de redação porque usa o fragmento do livro “O Segundo Sexo”, (1949) em que Beauvoir afirma que “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”.
"Nós homens e o nosso modus vivendi ainda não experienciou mudanças paradigmáticas profundas, capazes de possibilitar outras formas de vivencias igualitárias. Não cabe mais pensar outra sociedade, ou sociabilidades alternativas ao capitalismo, sem pensar efetivamente na emancipação das mulheres, argumento sobre o qual se impõe as questões de gênero e orientação sexual." 

Professor
Militante do Movimento Negro APNS
membro do Coletivo Ética Socialista
O INEP vem modificando sistematicamente o método de elaboração das questões, que são testadas veladamente pelos estudantes do ensino médio. O processo assegura que os estudantes não tomem conhecimento de que estão respondendo questões referentes ao ENEM. Assim, são classificadas conforme o nível de erro dos estudantes, aliás, a glosa tem como referencia de corte o elevado nível de acertos ou erros. Mesmo com vazamento de provas e algumas sabotagem feitas por quadrilhas que vendem resultados, o método vem sendo aprimorado, assegurando a inclusão no ensino superior.

A adoção de qualquer literatura não se dá pela benevolência de executivos “iluminados”. O INEP aplica questões de sondagem e as utiliza como feedback para medir o impacto na escolarização por meio das ações, programas e projetos político pedagógicos nas relações de ensino-aprendizagem, a exemplo das diretrizes para transversalidade nas políticas educacionais[1], inclusive de Direitos Humanos. A “comunização” do MEC pela suposta adoção do(s) marxismo(s) é um equivoco já que qualquer que seja o marxismo ele é contrário à política de direitos humanos, de berço liberal clássico.

O discurso ideológico de caráter conservador, usado no vídeo aparentemente educativo, começou a circular nas redes sociais logo após a realização das provas do ENEM. Transpondo seu exterior, descobre-se um conteúdo de cunho nazifascista bastante ameaçador. O curta-metragem[2] lembra muito o método ideologizante nazista utilizado pela cineasta favorita de Adolf Hitler, Leni Riefenstahl, no filme "O Triunfo da Vontade" que objetivava, em seus filmes, “a glorificação do partido nazista e a deificação de Adolf Hitler”.

O vídeo, um jogral “inocente”, faz um jogo pretensioso de palavras ressignificadas. Pretende-se demonizar determinadas categorias que são expressões teóricas ou práticas do campo de esquerda. Assim, expressões como ‘marxismo’, ‘comunismo’, ‘revolução’ ‘socialismo’, ‘ditadura do proletariado’ ‘tomada de poder’, ‘insurreição popular’, ‘governo popular’, ‘vermelho’, ‘luta de classes’, ‘ditadura do proletariado’, ‘petista ou PT’, ‘partidos de esquerda’ e tantas outras expressões que não são necessariamente deste campo de esquerda marxista como ‘gênero’, ‘LGBT’, ‘macumba’, ‘candomblé’, ‘Pai e Mãe de Santo’, ‘negro’, ‘racismo’ e etc. são hostilizadas e relegadas à condição de proscritas.  
Os veículos midiáticos da burguesia se especializaram em introjetar subliminarmente no inconsciente do imaginário coletivo do povo, simbologias binárias (positivo ou negativo) repulsivas, baseado no modelo cartesiano que racionalizam os conceitos (bom ou ruim; bem ou mal) em quadrantes opostos. Assim, o lado do quadrante negativo é decodificado como ideias “apavorantes”, desencadeadoras de hostilidades que estimulam o comportamento coletivo odioso que funcionam como código ético-moral.

Assim, esse código que regula as relações sociais (subordina os indivíduos) é orientado pelo determinismo mecanicista. Eles são programas diariamente introjetados na mente humana vulnerável e geralmente atua como ”ombudsman” e serve para controlar, condenar e banir simultaneamente do campo do “bem” pessoas que se vincularem a estes símbolos, como se elas tivessem cometidos atos abomináveis. Os mecanismos controladores “blindam” a mente humana, repulsa a força contra-ideológica estranha, capazes de confrontar e fragilizar a ordem social estabelecida. 

As cenas do vídeo tem a função neurolinguística de ativar o mecanismo de controle introjetado no inconsciente coletivo da população, desencadeando comportamentos “inexplicáveis” de rejeição aos símbolos supracitados, induzindo a população à validação de qualquer ataque aos proscritos. Aplicou-se este mecanismo ao MEC, acusando-o de ser comunista e ao ENEM de ensino marxista. Antes “cêsse” marxista!

Em minha opinião (de quem não domina profundamente o tema), este fato reprovável contra a impecável literatura de Simone de Beauvoir é mais que um insano barbarismo intelectual, aliás, são incongruências incorrigíveis com a literatura marxiana e suas indefectíveis expressões marxistas. Quanto maior for à ausência de conhecimento e exercício crítico intelectual, maior será a eficiência do sensor.

“Quanta ironia há nesse título do livro! quanta provocação há nessa frase! Para se dar tratamento ao tema e analisar algumas questões acerca da mencionada obra, que reflete o vigor de suas ideias, deve-se também vasculhar um pouco acerca dessa mulher que mudou as formas de ser e de dever ser da cultura do século XX. Vida e obra aqui se mesclam, interagindo entre si.” (Dos Santos 2010)[3]

O sensor é implacável com qualquer desavisado a mercê da mídia burguesa, veiculo por meio do qual os conservadores fazem um esforço hercúleo (imoral) para apagar do imaginário coletivo ideias, posições, valores e conquistas realizadas no campo centro-esquerda. No que pese as duras, todavia, corretas críticas imputadas ao PT, (partidos da base governista e principalmente ao PCdoB) seria incoerente negar as contribuições efetivadas por eles, notadamente pelo PT. O esforço desmedido para destruir não se limita ao PT, contudo as ideias subversivas dos partidos com orientações marxistas, visando interromper o crescimento das forças à esquerda no Brasil e na América Latina.

É uma impetuosa e desmedida afronta aos intelectuais brasileiros (de centro-esquerda) e uma intimidação invasiva ao governo atual, com afeições propagandista e do jornalismo marrom de véspera do golpe civil-militar de 1964: “Somos um povo honrado, governado por ladrões” do editorial da Tribuna da Imprensa RJ; ou "Os bons maridos sofrem muito..." Diário da noite, 1964; a chamada do Jornal do Brasil em 1º de abril de 1964: “Mais de um milhão de pessoas na marcha: Fabulosa demonstração de repulsa ao comunismo". No que pese saber que existem características históricas diferenciadas, percebe-se nuances de hostilidades parecidas com ambiente que antecede a derrubada do governo de Jango, João Goulart:
“Na verdade como dizia Darcy Ribeiro, Jango não caiu pelos seus erros, mas pelas suas virtudes. Hoje abrimos os jornais e vemos um mar de lama, de corrupções, são os exemplos. Eu coloco a disposição uma vasta documentação que nós temos.” (Página 7 de 216[4])
A questão essencial no vídeo é o combate ideológico sistemático e irredutível do que os conservadores chamam de “lepra do comunismo”. Por trás deste discurso, esconde-se uma preocupação com o que ele representa enquanto força social transformadora, capaz de interromper os logos ciclos de conservadorismo na terra. Todos eles originados com o surgimento da propriedade privada dos meios de produção, com todas as relações de dominações; surgimento do Estado e seu aparato legal que legitima o poder coercitivo de manutenção da propriedade e todas as contradições que decorrem desta matriz baseada no patriarcado:
"Com o advento da nova família, veio junto, a hegemonia do Estado, para redimir as possíveis questões de posse, propriedade, comércio, economia e dos laços de parentesco, e ainda da distribuição de áreas para que se realize o comércio dos produtos excedentes. O Estado é um organismo que veio proteger o homem de posse dos homens que não tem posse de nada[5].”
No caso de Simone, o vídeo mal-aventurado cometeu vários estelionatos intelectuais, o mais grave foi o de associá-la perversamente ao comunismo (stalinista) e ao nazifascismo (Hitler / Mussolini). Não há qualquer relação de validação, por parte de Beauvoir, com o que se convencionou chamar de “socialismo real”, após ruir o “centralismo democrático” de Stalin, mesmo porque Simone de Beauvoir e Sartre acompanharam as denúncias de Leon Trotsky, através de seu livro: “A Revolução Traída”, acusando Stalin de tornar burocraticamente degenerado Estado operário e defendendo a derrubada da ditadura stalinista pelo desvio ideológico e pelo retrocesso ao capitalismo, declarando: “um rio de sangue separa o stalinismo do bolchevismo”.

Em relação ao governo de Dilma Rousseff, o sensor não alisa e comete o equivoco de afirmar levianamente que é um governo comunista com o Ministério da Educação Marxista. Desonestamente o curta-metragem desconhece a tradição teórica marxiana, pois este pressuposto e a práxis política desconsidera qualquer processo de ruptura com o Estado liberal burguês por via eleitoral.

Sem o confronto estabelecido pela luta de classes, por meio da radicalização contra a burguesia, o capitalismo e suas instituições políticas (Estado), jamais levaria a ruptura estrutural. Assim, a afirmação temerária do vídeo mistifica os processos sociais revolucionários, único capaz de suprimir o atual Estado e sua concepção socioeconômica e política. Assim, poder-se-ia pensar na superação deste Estado, podendo até ser substituído por outro, não necessariamente comunista, porque nada diz a este respeito à obra essencialmente marxiana.  

O crime cometido contra a filósofa existencialista é uma anomalia psicopata. Ela possui raízes profundas no pensamento moderno e sua produção intelectual e suas práxis políticas influenciaram o ocidente e, principalmente, o movimento feminista francês com reflexões que impulsionava a luta pela emancipação da mulher, questionava o papel de “subordinação” da mulher na sociedade capitalista e, sobretudo, a participação das mulheres nos movimentos sociais de esquerda de sua época.

Além de conviver intelectualmente com o filósofo Jean-Paul Sartre, Simone teve com ele, relacionamento amoroso aberto e duradouro, o que lhe rendeu boas polêmicas e algumas controversas, segundo os conservadores. Adorada por uns e odiada por outros, escreveu intensamente para as mulheres do mundo, num viés marxiano, porque acreditava de forma factível na ruptura das relações de opressão machista, sexista e misógina.

A escritora possuía uma impetuosa produção intelectual, radicada em berço marxiano com uma literatura extensa. Os Mandarins” (1945), “Memórias de uma Moça Bem Comportada” (1958), “A Força da Idade” (1960), “Todos os Homens São Mortais” (1946), “A Força das Coisas”, (1964) e “A Velhice" (1970).

O ‘Portal Conservador’, publicou um texto chamando-a de “nazista, pedófila, misândrica e misógina” e, “estranhamente”, veicula ao mesmo texto uma foto lapidar (tirada por Alberto Korda) de Simone de Beauvoir e Jean Paul Sartre sentados na sala com Ernesto Che Guevara, quando o mesmo era dirigente do Banco Nacional de Cuba.

Oportuno lembrar que Beauvoir e Sartre, ambos os filósofos influenciados pela teoria marxiana, já haviam rompido com o “comunismo” stalinista. Sartre acidamente cuidou disso, ao chamar o regime de “O fantasma de Stalin” em um de seus escritos panfletário antistalinista. Mas, a base marxiana jamais fora abandona pelos dois e Beauvoir tratou de deixar isso claro no livro “A força das coisas”, quando escreveu “Éramos muito difíceis de classificar. De esquerda, mas não comunistas”. 

Assim como aborrece o ‘sensor’ dos conservadores de direita (nazifascistas ou não), os sinais evidentes de avanços das lutas populares pela igualdade racial no campo da promoção étnico-racial; no campo das lutas LGBT; contra a selvageria que destrói o meio ambiente pelo capitalismo predador; no campo da agricultura familiar agroecológica e, da retomada do debate marxiano sobre os rumos do socialismo/comunismo na atualidade, a questão da mulher não está imune a esta sanha machista que dissemina o ódio e a demonização à liberdade sexual, socioeconômica e política das mulheres.

Na verdade, o sensor da burguesia é contra quaisquer propostas de ruptura das mulheres que eles arrostam, mesmo não sendo marxista. A questão é bem mais complexa do que supõe a vã moral dos conservadores rancorosos. Esta luta pela emancipação das mulheres perpassa várias correntes de pensamento moderno e uma delas é a marxiana. Neste caso, basta assumir qualquer bandeira de luta por igualdade para ser apedrejada e, ser for marxismo/comunismo, fica mais excitante ao achaque falso moralista.

Como a ideia deste diminuto texto não é historicizar sobre as varias correntes feministas ou tema em discussão e sim fazer algumas provocações, abrindo ao debate, até porque não tenho fôlego intelectual para tanto, aqui vão alguns dos principais expoentes do movimento feminista na contemporaneidade e suas respectivas matizes teóricas que fazem o debate sobre gênero/feminismo nestas últimas quatro décadas.

Na década de 70, do século XX, os textos da antropóloga norte-americana Gayle Rubin tornou-se leitura obrigatória para autoras feministas, principalmente por sua elaboração descritiva do sistema sexo/gênero que ainda exerce influências atualmente, contudo, não poderia deixar de esclarecer que suas principais influências teóricas foram Lévi-Strauss e Freud, não obstante, fazer críticas ao marxismo.  

A historiadora norte-americana Joan Scott, 1980, pós-estruturalista, influenciada pelo pensamento de Foucault e Derrida, além de se opor ao sistema de sexo/gênero de Gayle Rubin alegando ser “incapazes de historicizar a categoria sexo e o corpo”, fez criticas a outras concepções. Joan Scott propôs a superação de instrumentos descritivos e adoção de método analítico capaz de pensar “linguagem, nos símbolos, nas instituições e sair do pensamento dual que recai no binômio homem/mulher, masculino/feminino”.

Nos anos 80/90, a filósofa norte-americana Judith Butler, influenciadora da vertente ‘Queer’, produz texto contendo críticas ao feminismo, colocando em cheque um conjunto de categorias e princípios tidos como sólidos, a exemplo, de mulher e identidade. “Butler expõe a ordem que prevê total coerência entre o sexo, gênero e o desejo/prática sexual, no bojo da sociedade heteronormativa”. Butler reconceitua gênero, dialogando com influências Scott, inserindo definitivamente o “corpo e o sexo” no debate acadêmico e social contrapondo a compreensão de materialidade.    

A socióloga australiana Raewyn Connell tornou-se referência em estudos das masculinidades. Também buscou conceituar gênero, mesmo não sendo seu lócus de estudo. Ressaltou o papel das construções sociais e históricas, buscando caminhos alternativos ao apresentado até aquele momento, para atingir conceitos de gênero. Destacou os processo reprodutivo e diferenças entre corpos e como o corpo (privado) é visto e apropriado nas práticas sociais.

A socióloga marxista brasileira Heleieth Saffioti, importante referência intelectual feminista para o Brasil, propõe reflexões relevantes no campo marxiano, advertindo: “feministas, usem menos gênero!”, alegando haver problemas políticos no conceito de gênero. Saffiote, orientanda de Florestan Fernandes, escreveu sobre a mulher no Brasil, na década de 1960. Ela analisa o encontro do marxismo e o feminismo e denuncia o que considera o inimigo comum ao movimento feminista mundial, colocando-a próxima às principais feministas da época: Simone de Beauvoir e Betty Friedan.

O cientista social francês, Pierre Bourdieu, trata do tema da dominação, mesmo não desenvolvendo necessariamente a questão gênero por não ser central em seus estudos e elaboração teórica, sobretudo ao desenvolver o conceito de construcionismosocial. Trata-se de um trabalho respeitável que oferece contribuições e críticas importantes ao debate dobre o conceito de gênero. Desenvolveu conceitos de “dominação masculina” e “violência simbólica”, para falar sobre manutenção de um poder dissimulado nas relações que permeiam o nosso pensamento e na concepção de mundo, Bourdieu atribui o “privilégio” masculino a necessidade constante dos homens de afirmar sua virilidade:     
“a virilidade é uma noção eminentemente relacional, construída diante dos outros homens e contra a feminilidade, por uma espécie de medo do feminino, e construída, primeiramente, dentro de si mesmo. (BOURDIEU, 2010, p. 67).
A luta de gênero, notadamente o crescimento de correntes feministas que questionam (com razão) a situação da mulher na sociedade atual, é, de maneira geral, exatamente igual a outros períodos da humanidade, no entanto, do ponto de vista das relações de produção capitalista, há um recrudescimento nestas relações que decorre da sociedade capitalista.

Ao retomar a questão centrada no texto usado na avaliação de autoria de Simone de Beauvoir (1908-1986), far-se-á necessário resgatar a sujeita histórica que subjetiva a escritora, filósofa existencialista e feminista francesa. Sua obra mais conhecida é o livro “O Segundo Sexo”. É considerada uma das maiores representantes do pensamento feminista existencialista francês:
"Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam o feminino".
O livro “O Segundo Sexo” traz questões pertinentes sobre a situação da mulher no mundo, em suas várias dimensões da vivência humana. Mas, qual é mesmo a situação da mulher no mundo moderno? Ao tentar responder a esta questão, as feministas compreendem a mulher no contexto histórico, as formas de dominação na vivência em sociedade e as especificidades deste período. As mulheres na economia, na sociedade, no mundo profissional, na religião, na arte e nas diversas dimensões do viver em sociedade.
“No cenário histórico-geográfico de sua vida depara-se com a imagem de mulher que ela vai construindo para si. O final dos anos 20, como também grande parte do século XX, trazem à cena política os dilemas cruciais dos totalitarismos, do antissemitismo e do imperialismo. A radicalidade desses acontecimentos, como bem lembra Hannah Arendt, demonstrara que a “dignidade humana precisa de nova garantia” a ser firmada por meio de “novos princípios políticos” (DOS SANTOS, apud. ARENDT, 1989, p. 13)
Por fim, dizer que, os avanços ainda incipientes conquistados pelas feministas, ainda não são suficientes para desconstruir o machismo arraigado em nossas consciências, entranhados em nossos comportamentos que nos incita a comportamentos condenáveis de opressões, de violência, de invizibilização e aos homicídios mais hediondos cometidos contras as mulheres por coisas banais. Nós homens e o nosso modus vivendi ainda não experienciou mudanças paradigmáticas profundas, capazes de possibilitar outras formas de vivencias igualitárias. Não cabe mais pensar outra sociedade, ou sociabilidades alternativas ao capitalismo, sem pensar efetivamente na emancipação das mulheres, argumento sobre o qual se impõe as questões de gênero e orientação sexual.

Neste sentido, o desafio que as mulheres enfrentam não é menor que os desafios de propor uma nova sociabilidade, porque há implicações profundamente arraigadas. Para a professora Magda Guadalupe dos Santos, Beauvoir aprofunda-se em sua analise e descreve dupla opressão sobre as mulheres. Uma é a opressão sobre seus ombros e a outras são limitações para romper com os laços de dominação que as mantém na servidão. E afirma que


“(...) entende que a mulher assumiu, ao longo dos tempos, o lugar do outro, da pura alteridade com valoração negativa, cuja identidade é determinada pelo homem. Também entende que a dimensão humana é sempre paradoxal, já que “o homem que constitui a mulher como um outro encontrara nela profundas cumplicidades” (DOS SANTOS, apud. BEAUVOIR, DS I, 1980, p. 15).




[1] Resolução Nº1, de 30 de Maio de 2012. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos.
[2] O Triunfo da Vontade (Triumph des Willens), de Leni Riefenstahl (Alemanha, 1936). Sedução pela imagem. A relação que o documentário estabelece com aquilo que filma passa sempre pela indução e pela condução de determinados sentidos, e pela construção de variadas significações. Neste sentido, O Triunfo da Vontade é o filme de propaganda por excelência. Riefenstahl impõe às imagens dois objetivos: a glorificação do partido nazista e a deificação de Adolf Hitler. Fonte: http://www.revistacinetica.com.br/triunfo.htm
[3]Artigo: Simone de Beauvoir. “Não se nasce mulher, torna-se mulher”.  Professora Dra. Magda Guadalupe dos Santos. Doutora em Direito. Professora do Departamento de Filosofia do Instituto Dom João Resende Costa, da PUC Minas.
[4] Relatório sobre a morte do Ex-Presidente João Goulart. Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Fonte: https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/ditadura/pdf/ditadura_05.pdf
[5]  ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Tradução de Ruth M. Klaus: 3ª. Centauro Editora, São Paulo, 2006.
segunda-feira, 16 de novembro de 2015

A Prefeitura Municipal de Anagé realiza Roda de Conversa nos Quilombos



* Herberson Sonkha

A Prefeitura Municipal de Anagé, por meio da Secretária Municipal de Educação, disposto pela Coordenação Municipal de Promoção da Igualdade Racial (COMPIR) em parceria com o Governo do Estado da Bahia, através da Secretaria Estadual de Educação (SEC) realiza o Projeto “Roda de Conversa: Uma História de lutas para a liberdade e igualdade na epopeia dos afro-brasileiros"nos Quilombos de Mandacaru e Água Doce e Lagoa Torta dos Pretos. Este projeto faz parte das atividades comemorativas do Novembro Negro que ocorre desde 2013 nas escolas da rede pública municipal.


No dia 10 de novembro aconteceu a “Roda de Conversa” em Lindo Horizonte com a participação dos Quilombos de Mandacaru e Água Doce e no dia 13 no quilombo de Lagoa Torta dos Pretos. A atividade educativa contou com o resgate da memória, história e das lutas emancipatória das populações quilombola no mundo, no Brasil, na Bahia e município de Anagé, destacando além dos aspectos históricos, os elementos artísticos culturais afrodescendentes, capoeira e muito samba de roda.

O município de Anagé, por meio da Coordenação Municipal de Promoção da Igualdade Racial, sob a responsabilidade da Professora Aurenice Cardoso (Lícia), coordenadora da pasta, promoveram o Projeto “Roda de Conversa: Uma História de lutas para a liberdade e igualdade na epopeia dos afro-brasileiros" que possibilitou a realização de duas importantes atividades educativas e culturais nos quilombos de Anagé, para tratar de questões relacionadas à lei 10.639/2003.


A programação contou com palestras do professor, historiador e pesquisador Uelber Barbosa Silva, doutorando em Capoeira pela UFA, abordou o resgate histórico do surgimento, consolidação e atualidade política do quilombo, na perspectiva sócio-historica; a Professora Elizabeth Ferreira Lopes, coordenadora do COMPIR de Vitória da Conquista que falou sobre a importância do órgão municipal de promoção da Igualdade Racial e suas ações voltadas para o fortalecimento das populações negras e quilombolas, salientando o interesse destas populações no fortalecimento destas políticas públicas e; o presidente do Conselho Municipal de Educação e Vice-Presidente do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, o gestor da educação e Professor Herberson Sonkha que abordou aspectos pedagógicos centrais nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Ambos são membros do Fórum Estadual de Gestores Municipal da Promoção da Igualdade Racial. 
quinta-feira, 12 de novembro de 2015

O tema criminalidade referenciado na obra de Marx (continuação)


  
Continuando o tratamento da criminalidade referenciada na obra de Marx o segundo texto apresentado tem por autor Gabriel Abelin, estudante da Faculdade de Direito de Santa Maria.




O pensamento marxista sobre crime e criminalidade


Por Gabriel Abelin [2], Via Justificando


“Um filósofo produz ideias, um poeta versos, um pastor sermões, um professor manuais etc. Um criminoso produz crimes. Se considerarmos um pouco mais de perto a relação que existe entre este ramo da produção e o conjunto da sociedade, revelaremos muitos preconceitos. O criminoso não produz apenas crimes, mas ainda o Direito Penal, o professor que dá cursos sobre Direito Penal e até o inevitável manual onde esse professor condensa o seu ensinamento sobre a verdade. Há, pois, aumento da riqueza nacional, sem levarmos em conta o prazer do autor. O criminoso produz ainda a organização da polícia e da Justiça penal, os agentes, juizes, carrascos, jurados, diversas profissões que constituem outras categorias da divisão social do trabalho, desenvolvendo as faculdades de espírito, criando novas necessidades e novas maneiras de satisfazê-las. Somente a tortura possibilitou as mais engenhosas invenções mecânicas e ocupa uma multidão de honestos trabalhadores na produção desses instrumentos. O criminoso produz uma impressão, que pode ser moral ou trágica; desta forma ele auxilia o movimento dos sentimentos morais e estéticos do público. Além dos manuais de Direito Penal, do Código Penal e dos legisladores, ele produz arte, literatura, romances e mesmo tragédias. O criminoso traz uma diversão à monotonia da vida burguesa; defende-a do marasmo e faz nascer essa tensão inquieta, essa mobilidade do espírito sem a qual o estímulo da concorrência acabaria por embotar. O criminoso dá, pois, novo impulso às forças produtivas…” — Karl Marx (“apud” Henri Lefebvre. Sociologia de Marx. Rio de Janeiro: Forense, 1968, pp. 79 e 80).

No “Dicionário do Pensamento Marxista”[1], cuja leitura recomendo fortemente aos que desejam ser iniciados no assunto, o sociólogo britânico Tom Bottomore nos oferece um escorço sobre a visão de Marx e Engels a respeito da questão criminal. Bottomore nos ensina que nos diferentes textos marxistas em que se discutem crime e criminalidade, destacam-se temas bem definidos.

Primeiro, o crime é analisado como o produto da sociedade de classes. Em “A condição da classe trabalhadora na Inglaterra”, Engels argumenta que a degradação dos trabalhadores ingleses, acarretada pela expansão da produção fabril, despojava-os de vontade própria, conduzindo-os inevitavelmente para o crime. A pobreza fornecia a motivação, e a deterioração da vida familiar interferia na educação moral adequada das crianças. Engels observou, porém, que o crime é uma reação individual à opressão, ineficaz e facilmente esmagada. Por esse motivo, os trabalhadores cedo voltaram-se para formas coletivas de luta de classes. Mas o ódio de classe, alimentado por essas reações coletivas, continuava a dar lugar a algumas formas individualistas de crime.

Em outros textos, como “Esboço de uma crítica da economia política”, “Discurso de Elberfeld” e “Anti-Duhring”, Engels atribuiu o crime à competitividade da sociedade burguesa, que favorece não só os crimes cometidos por trabalhadores empobrecidos, como também a fraude e outras práticas comerciais enganosas. Citando estatísticas criminais da França e da Filadélfia, Marx afirmou em “Capital punishment”, artigo escrito para o New York Daily Tribune (18 de fevereiro de 1953), que o crime era menos um produto de instituições políticas peculiares de um dado país do que “das condições fundamentais da sociedade burguesa em geral”.

Dessa concepção sobre as causas do crime resulta que as medidas policiais repressivas não o eliminam, apenas o contêm. A erradicação do crime não prescinde de condições sociais radicalmente transformadas. O progresso da civilização já havia reduzido o nível de crimes violentos (mas aumentava o crime contra a propriedade); uma sociedade comunista, ao suprir as necessidades individuais, eliminando a desigualdade e dando um fim à contradição entre o indivíduo e a sociedade, “cortaria o crime pela raiz”, assegurou Engels em seu “Discurso de Elbelferd”. Mais tarde, Marx observou que a ascensão da classe trabalhadora na Comuna de Paris tinha virtualmente acabado com o crime (A guerra civil na França).

Willem A. Bonger, social-democrata holandês (um dos muitos criminalistas de fins do século XIX e início do século XX influenciados, simultaneamente, pelo pensamento marxista e pelo positivismo não marxista), procurou refletir sobre a relação entre capitalismo e crime propondo que a competitividade do capitalismo dava lugar ao egoísmo – busca dos interesses pessoais em detrimento de outrem. Embora socialmente prejudicial, o comportamento egoísta é encontrado em todas as classes, mas a força política da classe dominante confere à suas modalidades particulares de comportamento explorador uma imunidade pelo menos parcial em relação à responsabilidade criminal.

O crime, pensava Bonger, só desapareceria quando o socialismo abolisse as fontes sociais do egoísmo. Análises marxistas mais recentes do crime tentaram entender a criminalidade entre as classes subalternas como uma adaptação ou resistência à dominação de classe e a criminalidade da classe dominante como um instrumento de dominação de classe. Quando se transformaram as relações de classe numa determinada formação social, mudaram também os padrões do crime, assim Taylor, Walton, Young, Edward Palmer Thompson etc.

Um segundo aspecto tematizado pelos pensadores marxistas é a crítica da justiça criminal. Uma das dimensões dessa crítica refere-se ao fracasso da imposição da lei nas sociedades capitalistas, no que diz respeito à concretização dos próprios ideais manifestos de respeito justo e imparcial da lei. Em artigos publicados em Vorwarts, em 1844, Engels observou que o processo criminal inglês, com a sua exigência de que o cidadão tivesse propriedade para servir no júri, funcionava a favor das classes abastadas. Discriminações odiosas no cumprimento da lei têm merecido atenção contínua da criminologia radical norte-americana.

Outra dimensão concerne aos aspectos ideológicos da justiça criminal. Marx e Engels iniciaram essa crítica em “A Sagrada Família”, e Marx retomou-a em um dos artigos que escreveu para o New York Daily Tribune (16 de setembro de 1859), intitulado “Population, Crime and Pauperism”, onde criticou as justificações filosóficas da pena criminal por sua abstração, sua incapacidade de situar os criminosos nas circunstâncias sociais concretas que deram lugar a seus crimes. Textos contemporâneos buscaram fazer avançar a crítica da ideologia, através de análises críticas de explicações criminológicas das causas do crime, e da representação do crime nos meios de comunicação de massas. Podemos citar novamente Taylor, Walton e Young e, muito especificamente num contexto latino-americano, apesar de não ser marxista, o professor Zaffaroni.

Em um outro nível, a crítica da justiça criminal assumiu a forma de uma economia política de controle do crime. Rusche e Kirchheimer (1939) explicaram as mudanças históricas das práticas punitivas desde a Idade Média até o século XX em termos de controle do trabalho. Durante épocas de escassez de força de trabalho, as instituições penais (a prisão, a casa de correção, as galés) poderiam ser usadas para prover os empregadores ou o Estado de um suprimento regular de trabalhadores forçados a baixos custos, enquanto em períodos de excedente de força de trabalho, a punição podia ser usada para controlar uma população excedente potencialmente explosiva. Embora tenha sido criticada como economicista, esta linha de análise foi aprofundada e refinada na produção teórica contemporânea sobre as origens e subsequente transformação do tribunal de delinquentes juvenis, da prisão e da polícia e sobre a maneira pela qual transformações de curto prazo na política punitiva estão relacionadas com o ciclo econômico.

Numa perspectiva um tanto diversa, Quinney (1977) sugeriu que o crime contribui para a crise fiscal do Estado. Para manter sua legitimidade, o Estado deve aumentar seus gastos com o controle do crime em resposta ao aumento da criminalidade provocada pelo capitalismo. Ao fazer isso, sua capacidade de garantir a acumulação continuada de capital fica ameaçada. Assim, o crime está implicado nas contradições do capitalismo.

Existe ainda uma terceira vertente da produção teórica marxista que envolve temas relativos à análise e à crítica do direito criminal (começa em Pachukanis e desemboca no pensamento baratteano). Essa vertente, porém, não será examinada neste artigo.

Alguns dos comentários de Marx sobre o crime dizem respeito a assuntos não relacionados diretamente com os temas acima abordados. Numa irônica passagem das Teorias da Mais-Valia (“Da utilidade de todas as ocupações”), Marx trata das consequências sociais do crime. Comentando a proposição de que todas as ocupações remuneradas são úteis, ele observou que, segundo tal critério, o crime também é útil, dado que dá lugar à polícia, ao tribunal, ao carrasco, e até mesmo ao professor que leciona direito criminal. O crime, prosseguiu Marx, suaviza a monotonia da existência burguesa e fornece enredos para a grande literatura. Ele afasta os trabalhadores desempregados e emprega outros na execução da lei, impedindo, por conseguinte, que a concorrência reduza excessivamente os salários. Ao estimular esforços preventivos, o crime faz progredir a tecnologia. Sob esse aspecto, Marx antecipa as análises funcionalistas das complexas interconexões entre o normal e o desviante na vida social.

Embora Marx e Engels geralmente considerem os dados oficiais sobre detenções e julgamentos como indicadores válidos da criminalidade, em “Population, Crime and Pauperism”, Marx assinalou que essas estatísticas refletem, pelo menos em parte, a maneira mais ou menos arbitrária como as transgressões são rotuladas. Uma excessiva prontidão para recorrer à lei criminal, sugeriu ele, tanto pode criar crimes, quanto puní-los. Com essa passagem, Marx aparece como precursor das análises sociológicas contemporâneas sobre a rotulação do comportamento desviante.

Lembrando que Marx foi alvo da seletividade do sistema penal de seu tempo e sofreu a criminalização da pobreza na própria pele. Em certa ocasião, o próprio Marx, em estado de grande necessidade, saiu para penhorar algumas pratas domésticas. Ele não estava particularmente bem vestido e seu domínio do inglês não era tão bom (como se tornou mais tarde). As pratas, infelizmente, como se descobriu depois, portavam o timbre da família do Duque de Argyll, os Campbells, com cuja casa a senhora Marx estava diretamente conectada. Marx chegou ao Banco dos Três Globos e apresentou suas colheres e garfos. Noite de sábado, judeu estrangeiro, roupa desordenada, cabelo e barba grosseiramente penteados, bela prata, timbre nobre – evidentemente, uma transação, de fato, bastante suspeita. Assim pensou o dono da loja de penhores a quem Marx se dirigiu. Ele, portanto, deteve Marx, com base em algum pretexto, enquanto chamava a polícia. O policial teve a mesma opinião que o dono da loja de penhores e levou o pobre Marx para a delegacia de polícia. Ali, outra vez, as aparências jogavam fortemente contra ele… Assim Marx recebeu a desagradável hospitalidade de uma cela policial enquanto sua ansiosa família lamentava seu desaparecimento.



REFERÊNCIAS
[1]http://educadoresnoface.blogspot.com.br/2015/04/download-gratuito-dicionario-do.html

__________________
[1]Juarez Cirino dos Santos é Professor de Direito Penal da UFPR, Presidente do ICPC – Instituto de Criminologia e Política Criminal, Advogado Criminal e autor de vários livros nas áreas de Direito Penal e de Criminologia.
[2] Gabriel Abelin é acadêmico quintanista do curso de Direito da Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA)


O tema criminalidade referenciado na obra de Marx





  
O tema da criminalidade aparece pela primeira vez na obra de Marx em seu texto de juventude sobre a criminalização da coleta da lenha na Alemanha. As entrelinhas de sua crítica da concepção idealista do crime são o ponto de partida dos dois textos que serão apresentados. Segue o primeiro, de autoria do professor Juarez Cirino dos Santos.




A necessidade de retomar Marx na criminologia

* Por Juarez Cirino dos Santos[1] Via Justificando.

1. A Criminologia Radical (ou Crítica) nasce da mudança da abordagem do autor para uma abordagem das condições objetivas, estruturais e institucionais da sociedade capitalista, com o deslocamento do interesse cognoscitivo das causas (biológicas, psicológicas, sociológicas) do comportamento criminoso para os mecanismos de controle social do crime e da criminalidade: as definições legais de crime e o processo de criminalização. A mudança representa um salto qualitativo de um paradigma etiológico para um paradigma político da criminalidade, que toma o Direito Penal como sistema dinâmico de funções vinculado à estrutura das relações de produção e de distribuição de mercadorias, assim definido:

a) definição legal de crimes e penas (criminalização primária), com seleção de tipos legais que protegem valores estruturais e institucionais das classes e categorias sociais hegemônicas da formação social, concentrando a criminalização em condutas lesivas das relações de produção e de circulação de mercadorias;

b) aplicação judicial da lei penal (criminalização secundária), com seleção dos sujeitos criminalizados pela posição de classe subalterna, com maior probabilidade para os segmentos sociais marginalizados ou em posição precária no mercado de trabalho;

c) execução penal (regime carcerário), momento culminante dos processos seletivos de estigmatização e de exclusão social, como mecanismo de garantia das desigualdades da relação capital/trabalho assalariado (fundada na separação trabalhador/meios de produção), e de produção de um setor de marginalizados, recrutado do excedente de mão de obra ociosa, inútil para a reprodução ampliada do capital – mas útil para mostrar o que pode acontecer aos que se recusam à socialização nas condições de trabalho assalariado.[1]

Hoje, mais do que nunca, precisamos do marxismo para identificar o caráter ideológico das formas jurídicas e políticas do Estado, para iluminar a relação entre o jurídico e o econômico (nada ocorre na economia sem regulação jurídica) e entre o jurídico e o político (o Direito como política em forma de lei), dirigindo o foco para a unidade na diversidade das dimensões econômicas, políticas e jurídicas do modo de produção capitalista, como unidade contraditória da estrutura das relações de produção e das instituições jurídicas e políticas de controle social do Estado capitalista.[2] Na verdade, o Direito é o meio de organização da economia política, do Estado Moderno e das relações entre ambos[3].

2. A inserção da questão criminal na estrutura do modo de produção capitalista corresponde à noção de que Direito e Estado não podem ser explicados por si mesmos, mas pelas relações da vida material da sociedade civil, cuja anatomia é dada pela economia política, na célebre formulação de MARX:
“na produção social da existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, cujo conjunto constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se constroem sistemas jurídicos e políticos (de controle) e se desenvolvem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona os processos da vida social, política e intelectual em geral, segundo o princípio materialista de que não é a consciência dos homens que determina o ser, mas o ser social que determina a consciência humana”.[4]

E se, em cada época histórica, as classes que dominam o poder material dominam a produção das formas ideológicas, jurídicas e políticas de controle social[5] – ou seja, se a disposição dos meios de produção material assegura a disposição dos meios de produção intelectual –, então o Direito e o Estado estão comprometidos com a instituição e garantia das condições materiais do poder econômico e do poder político das classes dominantes.

3. É importante compreender a dialética entre (a) as relações econômicas de produção e circulação da riqueza material sob a forma de mercadoria, um valor de uso (satisfação de necessidades humanas) dotado de um valor de troca (medido pela quantidade de trabalho social necessário), (b) as relações políticas de poder entre os proprietários do capital (sob as formas de capital produtivo, comercial e financeiro) e a força de trabalho assalariada nos processos de produção e de circulação de mercadorias e (c) as relações jurídicas como relações de poder econômico (empresas, sociedade civil) e de poder político (estado, sociedade política) instituídas na forma legal do Direito.

Em geral, os juristas não estão familiarizados com a lógica interna que vincula as relações econômicas (estrutura) às relações políticas e às relações jurídicas (superestrutura) da formação social, porque trabalham com a teoria do consenso, que define o Direito como a linguagem universal da razão, que protege a liberdade, a igualdade e o bem comum e, assim, não só oculta as contradições de classe da sociedade, mas revela a forma jurídica como ideologia mistificadora, mediante a união abstrata de contradições sociais concretas. Ao contrário, a teoria do conflito (de classes) explica as contradições entre as classes sociais (a) na estrutura econômica de produção e circulação de mercadorias, com objetivo de lucro mediante apropriação de mais-valia como trabalho não remunerado, (b) na forma legal do Direito, que institui a desigualdade social entre a classe capitalista (proprietária dos meios de produção e circulação) e a classe trabalhadora (possuidora de força de trabalho, vendida ao capitalista pelo preço do salário), e (c) nas formas políticas do Estado, que garantem as desigualdades sociais nas relações econômicas e nas formas jurídicas respectivas através do poder coercitivo do Sistema de Justiça Criminal (Polícia, Justiça e Prisão).

O conceito de mais valia – a diferença entre trabalho necessário (produção de valor equivalente ao salário) e trabalho excedente (produção de mais-valor expropriado sem contraprestação salarial, responsável pela reprodução ampliada do capital) – fundamenta uma sociologia do conflito que define o capitalismo como modo de produção de classes antagônicas e lança luz sobre as relações de poder econômico (o capital produz mercadorias), as relações de dominação política (a submissão do trabalhador ao capitalista) e as relações de apropriação jurídicas (a expropriação legal de mais-valia) da formação social capitalista.

4. Retomar MARX é necessário, também, para mostrar que o sistema de justiça criminal se origina no processo de acumulação primitiva do capital, na transição do modo de produção feudal para o modo de produção capitalista. A ruptura violenta das condições de vida dos camponeses – expropriados dos meios de produção e expulsos das terras feudais, mas desprovidos da disciplina necessária para o trabalho assalariado na manufatura ou na indústria incipiente – determina a formação de bandos de famintos, mendigos, vagabundos e ladrões, explicável pelas transformações históricas objetivas do modo de produção. Não obstante, para proteger a propriedade e controlar as chamadas “classes perigosas”, definidas como “criminosos voluntários”, cujas condutas seriam produtos de decisões pessoais, a burguesia nascente editou uma legislação criminal sangrenta, criou uma polícia para controle/repressão do povo excluído do mercado de trabalho e transformou castelos em prisões (Gand, Gloucester, Rasphuis etc.) para reclusão e disciplina (para o trabalho assalariado) das massas marginalizadas.[6] É o primeiro esboço da concepção de natureza humana como (psicossomático) conjunto das relações sociais, que distingue entre determinações estruturais objetivas e determinações pessoais subjetivas do comportamento humano.

Pouco depois (1926), PASUKANIS utiliza o conceito de mercadoria (valor de uso dotado de valor de troca) para definir a pena criminal como proporção na troca de equivalentes – o conceito de retribuição equivalente, como troca jurídica do crime medida pelo tempo de privação de liberdade – e, de forma original, distinguiu os objetivos reais e os objetivos ideológicos da pena criminal: a) objetivos reais de proteção dos privilégios da propriedade privada (dos meios de produção), de luta contra as classes oprimidas e de garantia da dominação de classe; b) objetivos ideológicos de proteção da sociedade – rotulada como alegoria jurídica que encobre a proteção das condições fundamentais da sociedade de produtores de mercadorias.[7]

Em 1939, RUSCHE E KIRCHHEIMER, assumindo a relação de correspondência das superestruturas jurídicas e políticas com a base material das relações de produção econômica da sociedade, mostram a origem estrutural concreta do sistema punitivo, erigido sobre o princípio de que “todo sistema de produção descobre o sistema de punição que corresponde às suas relações produtivas”, estabelecendo a relação umbilical entre mercado de trabalho e punição, que fundamenta a Criminologia Crítica contemporânea.[8]

FOUCAULT (1975), afirmando que o sistema punitivo não deve ser compreendido por suas funções sociais negativas (repressão), mas pelas funções sociais positivas ligadas aos processos de produção, relaciona as práticas penais ao domínio/controle das forças corporais para produzir docilidade e utilidade, e concebe as relações de produção como política do corpo, em que relações de dominação permitem utilizar o corpo como força produtiva (poder), mas controlada –, ou seja, a constituição de um poder (político) sobre o poder (produtivo) do corpo. A novidade é o conceito de disciplina, também denominada microfísica do poder, como estratégia das classes dominantes para criar uma ideologia de submissão, definindo o sistema de justiça criminal como gestão diferencial da ilegalidade, cujos elementos seriam a polícia, a prisão e a delinquência. [9]

MELOSSI/PAVARINI (1975), definem a relação cárcere/fábrica como a matriz histórica da sociedade capitalista: a fábrica (empresa) como a principal instituição da estrutura das relações de produção e circulação de mercadorias; o cárcere (execução penal) como a principal instituição de controle social. [10]

SANDRO BARATTA (1984) mostra o Direito Penal como sistema desigual que garante a unidade contraditória da igualdade formal do sujeito de direitos (contrato de trabalho, na circulação) e da desigualdade real do indivíduo concreto (força de trabalho, no processo de produção de mais-valia), cumprindo a função de conservação e reprodução das relações sociais desiguais da sociedade capitalista. [11] E o maior mérito desse intelectual revolucionário: o projeto de uma Criminologia Crítica capaz de integrar uma teoria subjetiva (psicologia) de construção social da realidade, desenvolvida pelo labeling approach, à teoria objetiva (sociologia) dos processos estruturais e institucionais das relações sociais de produção, desenvolvida pelo marxismo. [12]




REFERÊNCIAS:
[1] BARATTA, Criminologia crítica e política criminal alternativa, in Revista de Direito Penal, n. 23, 1978, p. 7-21.
[2] BOURJOL, Pour une critique du Droit. Maspero 1978.
[3] HABERMAS, Theorie des kommunikativen Handelns. Suhrkamp, 1995, v. II, p. 157.
[4] MARX, Prefácio de 1859, Zur Kritik der politischen Ökonomie.
[5] MARX/ENGELS, Die Deutsche Ideologie. In MEW, Institut für Marxismus-Leniniemus, Berlim, v. 20, p. 19.
[6] MARX, Das Kapital, v. I, p. 761-2.
[7] PASUKANIS, A teoria geral do direito e o marxismo, Lisboa, Perspectiva Jurídica, 1972, p. 183 s.
[8] RUSCHE/KIRCHHEIMER, Punishment and social structure, New York, 1969, p. 5.
[9] FOUCAULT, Surveiller et Punir, 1975, p. 26-27.
[10] MELOSSI/PAVARINI, Carcere e Fabbrica, 1975.
[11] BARATTA, Criminologia crítica e crítica do direito penal (tradução brasileira de Juarez Cirino dos Santos). Freitas Bastos, 2a edição, p. 173 s.

[12] BARATTA, Che cosa è la criminologia critica? In Dei Delitti e dele Pene, n. 1, 1991.

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