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O corrosivo voto bolsonarista do PT de Conquista em Ivan Cordeiro
Ave, Gregório de Matos, “A nota saiu pior do que o soneto”!
*por Herberson Sonkha
A nota muito bem escrita (não apresenta nenhum problema de ortografia, gramática e, se preferir, de morfossintaxe) publicada pelos vereadores do PT em Vitória da Conquista em defesa do apoio ao bolsonarista Ivan Cordeiro para a presidência da Câmara Municipal expõe fragilidades argumentativas que beiram o escárnio. A nota não explica (pelo menos deveria) por que a vereadora Márcia Viviane se absteve (ou não), apenas a iguala aos dois que votaram em Ivan Cordeiro. Contudo, analisemos a nota.
A tentativa de justificar a aliança com um representante da extrema-direita – ideologicamente oposto a tudo que o PT historicamente defendeu – é recheada de manobras retóricas que procuram naturalizar o inaceitável. No entanto, ao examinar cada linha do texto, as contradições escancaradas revelam muito mais do que pragmatismo político: mostram uma rendição ao modus operandi da velha política, aquela que o PT sempre jurou combater.
A justificativa: estratégia ou traição?
A nota argumenta que alianças com adversários ideológicos em eleições de mesas diretoras são comuns, citando exemplos de outras cidades e do Congresso Nacional. Essa justificativa, no entanto, desconsidera o contexto histórico e político específico de Vitória da Conquista. Ivan Cordeiro não é apenas “um adversário político”: é um representante da base bolsonarista, defensor do impeachment de Dilma Rousseff, das políticas de destruição do Estado democrático de direito e do antipetismo radical – se essa justificativa estiver correta (eu acredito que não), tudo que eles disseram (ainda dizem) de mais sórdido, nojento, humilhante, imoral e depreciativo sobre o PT está absolutamente certo.
O texto ignora o impacto simbólico e prático de legitimar esse tipo de figura política, especialmente após anos de luta do PT contra o bolsonarismo, que culminaram em um golpe contra a presidenta Dilma e na prisão injusta de Lula. Se alianças dessa natureza são possíveis agora, qual foi o sentido de toda a retórica contra os "golpistas" e "destruidores da democracia"?
O argumento da isolação política
Os vereadores apontam que o PT estava "isolado" e que a única alternativa seria se aliar a Ivan Cordeiro para obter espaço nas decisões internas da Câmara. Essa narrativa esconde uma contradição gritante: ao se renderem à lógica da governabilidade a qualquer custo, Alexandre Xandó e Fernando Vasconcelos não apenas enfraquecem o próprio partido, mas também sacrificam a coerência ideológica que sempre foi a bandeira do PT – Se essa argumentação do “isolamento político” estiver correta, provavelmente o ex-prefeito Guilherme Menezes do PT deveria ter feito aliança com “Deus e o Diabo” para governar o município em seus dois primeiros governos?
O texto chega ao absurdo de sugerir que o voto em Ivan foi “uma necessidade” para garantir maior influência na Câmara. Mas isso levanta uma questão crucial: se o PT foi capaz de resistir ao isolamento em períodos muito mais difíceis, como no final da ditadura militar, nos primeiros 8 anos de governo municipal de Guilherme Menezes do PT ou durante o golpe de 2016, por que agora dois vereadores brancos e homens optam por uma rendição estratégica que contradiz os princípios do partido? Seriam interesses individuais disfarçados de estratégia partidária?
O preço da contradição
A nota tenta minimizar (ou naturalizar?) o impacto da decisão, afirmando que “nada muda” em relação à oposição ao governo Sheila Lemos e à extrema-direita. Mas como podem sustentar essa oposição se, na prática, acabaram de conceder a presidência da Câmara a um representante desses mesmos grupos? Esse tipo de dissonância cognitiva sugere que o discurso é uma coisa e a prática, outra completamente distinta.
Além disso, o argumento de que a escolha foi para evitar mais anos de perseguição política e administrativa soa como uma confissão de fraqueza. Se o PT não é capaz de sustentar sua luta em oposição mesmo sob dificuldades, como pode continuar a se apresentar como defensor das classes populares? Se as "portas fechadas" justificam alianças com os algozes do partido, o que impede que essa lógica seja levada ao extremo em outros contextos?
A quem interessa?
Um ponto notável é que o texto sequer menciona o impacto dessa decisão para as bases do PT, que historicamente rejeitam alianças com a extrema-direita. O silêncio sobre as periferias, os trabalhadores e os movimentos sociais é ensurdecedor. Em vez disso, as justificativas giram em torno de “espaços de decisão” e “comissões permanentes” – argumentos que soam como a velha política em sua essência, preocupada mais com cargos e status do que com mudanças estruturais – então, não são mandatos populares participativos, são condomínios de poder?
Golpismo naturalizado: De quem é essa nova estratégia Petista?
A maior fragilidade da nota é sua incapacidade de responder à pergunta que ecoa entre os eleitores e militantes do PT: se alianças com golpistas e defensores do bolsonarismo são justificáveis em nome da governabilidade, qual foi o sentido de combater tanto essas forças nos últimos anos? Era tudo retórica para garantir votos?
Esse movimento parece confirmar o que muitos críticos do PT já apontaram: a governabilidade a qualquer custo é uma armadilha que transforma a ética política em moeda de troca. E isso, historicamente, levou ao golpe de 2016, à ascensão do bolsonarismo e à perseguição contra o próprio partido.
Quem está levando o PT à crise de identidade?
Ao fim e ao cabo, o apoio a Ivan Cordeiro representa muito mais do que uma manobra estratégica: é um sintoma de uma crise de direção profunda no PT de Vitória da Conquista. A decisão não só enfraquece a confiança da militância, como também reforça a narrativa de que o partido está disposto a qualquer coisa para retomar espaços de poder – mesmo que isso signifique trair os princípios que sustentam sua história.
Se o PT de Conquista não fizer um mea culpa real e não reavaliar sua estratégia, corre o risco de perder aquilo que ainda lhe resta: a credibilidade perante a população (isso inclui jogar na vala comum a credibilidade de Guilherme Menezes, José Raimundo, Waldenor Pereira, Jorge Solla, Valmir Assunção e etc.) que acreditou na luta contra o bolsonarismo e na defesa de um projeto político comprometido com a classe trabalhadora.
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