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quinta-feira, 13 de março de 2025

EDITORIAL | Primeira mulher a presidir o STM em mais de 200 anos

Foto: Carta Capital

EDITORIAL | Maria Elizabeth Rocha, primeira mulher a PRESIDIR
o Superior Tribunal Militar depois de mais de dois séculos.



“A entrevista da Ministra Maria Elizabeth Rocha à jornalista Miriam Leitão, da GloboNews, evidencia que a interpretação constitucional do Superior Tribunal Militar (STM) está alinhada à do Supremo Tribunal Federal (STF). Como única instância com competência para punir crimes como tentativa de demolição violenta do Estado e atos de terrorismo nazifascista, tanto civis quanto militares, o STF desempenha um papel fundamental na conclusão do processo de transição democrática e no fortalecimento das instituições no Brasil.”




*por Herberson Sonkha




A futura presidenta do Superior Tribunal Militar (STM), ministra Maria Elizabeth Rocha, concedeu uma entrevista à jornalista Miriam Leitão, da Globonews, em março de 2025, abordando temas cruciais para o cenário político e jurídico brasileiro. Entre os pontos centrais, destacam-se o julgamento dos envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para conduzir o caso e a necessidade de revogação definitiva da Lei da Anistia de 1979. Suas declarações reacenderam debates sobre justiça de transição, impunidade e o papel das Forças Armadas na democracia.

A escolha de Maria Elizabeth Rocha para a presidência do STM marca um momento histórico. Em 216 anos de existência da Corte, ela será a primeira mulher a ocupar o cargo, assumindo a função em março de 2025 para o biênio 2025-2027. Sua trajetória na Justiça Militar começou em 2007, quando foi indicada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde então, ocupou a vice-presidência entre 2013 e 2015 e chegou a assumir interinamente a presidência.

Natural de Belo Horizonte, Rocha é formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e doutora em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ao longo de sua atuação no STM, destacou-se pela defesa dos direitos das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ nas Forças Armadas. Foi sob sua influência que o tribunal viabilizou a inclusão de parceiros do mesmo sexo nos planos de saúde dos militares, um marco na luta por igualdade dentro da instituição.

O STM é a instância máxima da Justiça Militar da União, responsável por julgar crimes militares cometidos por integrantes das Forças Armadas ou por civis que atentem contra a administração militar federal. Composto por 15 ministros — cinco civis e dez militares —, o tribunal terá, sob a gestão de Rocha, o desafio de lidar com processos relacionados à tentativa de golpe de 2023.


O que está em jogo?

Na entrevista, Maria Elizabeth Rocha foi enfática ao afirmar que o país enfrentou, de fato, uma tentativa de golpe de Estado. Suas palavras contrastam com declarações de políticos como Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, que buscam relativizar os eventos. A ministra destacou que as investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal apresentam indícios sólidos da gravidade dos atos praticados.

Outro ponto central foi a defesa da competência do ministro Alexandre de Moraes, do STF, como juiz natural do caso. Rocha argumentou que a atuação de Moraes desde o início das investigações legitima sua condução do julgamento. Para a ministra, o STM não tem jurisdição para julgar os 23 militares denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), pois os crimes em questão não são exclusivamente militares, mas sim ataques diretos às instituições democráticas.

Além disso, Rocha sustentou que a Lei da Anistia de 1979 já não deveria ter validade, uma vez que a Constituição de 1988 estabelece a imprescritibilidade de crimes de tortura. Seu posicionamento segue uma linha semelhante à do ministro Flávio Dino no STF, que defende uma interpretação mais rígida da lei para permitir a responsabilização de agentes da ditadura militar.


Contexto e repercussão

A entrevista ocorre em um momento de intensa polarização política no Brasil. O episódio de 8 de janeiro de 2023 — quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram as sedes dos Três Poderes, buscando anular o resultado das eleições — se insere em um cenário mais amplo de instabilidade democrática. A disputa entre instituições republicanas e setores radicalizados do bolsonarismo expõe fissuras no sistema político e reacende discussões sobre a herança autoritária do país.

As declarações de Maria Elizabeth Rocha reforçam a necessidade de consolidar o Estado Democrático de Direito e responsabilizar aqueles que atentaram contra as instituições. Nesse sentido, sua fala toca em dois pontos fundamentais:

1. A punição dos envolvidos na tentativa de golpe, evitando que ações golpistas sejam minimizadas ou relativizadas.

2. A revisão da Lei da Anistia, que historicamente tem impedido a responsabilização de militares e agentes estatais por crimes cometidos durante a ditadura.

Desde a redemocratização, o Brasil tem sido pressionado por organismos internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos, a rever sua política de impunidade. Enquanto Argentina, Chile e Uruguai julgaram e condenaram ex-ditadores e militares envolvidos em crimes contra a humanidade, o Brasil permaneceu imobilizado pela Lei da Anistia, protegendo torturadores e dificultando o acesso das vítimas à justiça.


Os atores dessa disputa

A crise institucional envolve diferentes personagens e interesses. Entre os principais atores estão:

Maria Elizabeth Rocha, futura presidenta do STM, que defende a responsabilização dos golpistas e a revisão da anistia.

Alexandre de Moraes, ministro do STF, responsável pelo julgamento dos envolvidos no 8 de janeiro.

Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, que busca relativizar a tentativa de golpe.

Jair Bolsonaro e aliados, que tentam deslegitimar as investigações e evitar condenações.

Setores progressistas e organizações de direitos humanos, que exigem punição para militares da ditadura e para os golpistas de 2023.


Os efeitos da Anistia

A Lei da Anistia de 1979 foi um pacto político para facilitar a transição da ditadura para a democracia. No entanto, seus efeitos foram devastadores:

1. Impunidade para torturadores e assassinos da ditadura, enquanto outros países da América Latina puniram seus agentes repressores.

2. Fragilidade das instituições democráticas, permitindo que setores militares continuassem influentes na política.

3. Continuidade da violência de Estado, com policiais e militares se sentindo imunes à responsabilização por abusos.

4. Risco de novos golpes, já que a falta de punição pelo passado incentivou a tentativa de ruptura de 2023.


O caminho para a Democracia

Para consolidar uma democracia forte e evitar novos retrocessos, o Brasil precisa romper com a impunidade. Algumas medidas urgentes incluem:

1. Revogar definitivamente a Lei da Anistia e responsabilizar torturadores da ditadura.

2. Fortalecer o controle civil sobre as Forças Armadas e polícias, garantindo que não interfiram na política.

3. Criar uma política de memória e justiça, para que crimes da ditadura sejam amplamente conhecidos e ensinados.

4. Punir severamente os golpistas de 2023, assegurando que atentados contra a democracia não fiquem impunes.


A entrevista de Maria Elizabeth Rocha representa um avanço nesse debate. O Brasil tem uma nova oportunidade de romper com a impunidade e consolidar uma democracia baseada na justiça e nos direitos humanos. O desafio, agora, é transformar esse discurso em ação concreta.



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