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sábado, 9 de junho de 2012

O Mundo todo Qualificado


*por Eliane Assunção 


Capacitação e qualificação profissional estão para formar e moldar o indivíduo, respectivamente, respondendo à necessidade de desenvolvimento de competências. O sentido técnico do termo competência abrange dimensões imaginadas pelo senso comum, talvez, apenas quando somos vítimas de um serviço ruim, de um processo mau elaborado ou de um produto inacabado.Vivenciamos situações dessa natureza, diariamente, da feira livre ao centro comercial mais sofisticado.
 
A edição 989 da Revista Exame revela que o mercado procura por 8 milhões de profissionais, bem estampado na capa, afirmando que este será o número de pessoas qualificadas que o Brasil precisará nos próximos cinco anos para continuar a crescer. Entre as empresas, a disputa por gente qualificada nunca foi tão grande. Porém, hoje mesmo, a Rádio UESB divulgou o resultado de uma pesquisa apontando o alto índice de desemprego. Ora, se temos tantas vagas disponíveis, porque o nível de desemprego continua alto? É obvio que não necessitamos pedir ajuda aos especialistas para entendermos que o hiato está na qualificação.

 


Em dois anos e meio atuando como gerente de projetos na Secretaria Municipal de Desenvolvimento Trabalho e Renda, aos poucos e, aceleradamente, foram surgindo as idéias, propostas e projetos de capacitação que ao todo, somam-se oito: Capacitar, Qualifica Conquista, Promeg, Capacitação para os servidores da saúde, Qualificação dos operários da indústria, Qualificação dos agentes promotores do turismo de eventos e negócios, Capacitação dos beneficiários do INSS (em parceria com o INSS visando capacitação para retorno às atividades profissionais), Capacitação profissional dos servidores municipais, por secretaria, integrando as atividades de Gestão e desenvolvimento de pessoas.
 
Refletindo sobre os projetos - os estacionados, os implementados, os projetados e os que estão em fase de elaboração, a sensação é de prazer, ”Sangue, suor e lágrimas”. Porém, reflexão maior partiu da ilustre professora Maristela Miranda, com quem tive o privilégio de desenvolver uma das propostas acima. ”Eliane quer qualificar o mundo inteiro”!
 
Afinal, como seria qualificar o mundo inteiro? Segundo o professor João Paulo Pereira, a capacitação profissional serve a lógica do capital, logo, formamos os indivíduos tecnicamente e os colocamos à disposição do mercado - que jamais proporcionará condições de pleno emprego - e assim, garantimos um bom exército de reserva, justamente para que o sistema seja alimentado de modo a garantir ao empregador, em circunstância de ruptura na relação de trabalho, a permanência de mão de obra abundante, de força de trabalho qualificada à disposição.
 
Numa perspectiva mais filosófica, o professor Wilton Ferraz sempre ressalta em nossas longas viagens à Salvador, quando embarcamos para as aulas do mestrado, o porquê da busca pela capacitação: -”Liu, nos capacitamos para sermos melhores explorados”.
 
Sendo assim, Capacitar o mundo inteiro será que seria uma boa ideia? Um balanço da escola pública brasileira, em todos os níveis, no início do século XXI, nos revela o retrato constrangedor de uma dívida para com a população: a negação da cidadania. No Brasil, apenas cerca de 45% dos jovens concluem o ensino médio e, destes, aproximadamente 60% o fazem em situação precária (noturno ou supletivo). Essa é uma das marcas profundas da necessidade de qualificação.
 
A trajetória educacional brasileira, que sempre foi marcada pela visível demarcação dos que iriam desempenhar as funções intelectuais e dos que iriam desempenhar funções instrumentais, concretamente, seria o desdobramento das escolas tradicionais e profissionais, seguindo a lógica da divisão social e técnica do trabalho: educação profissional para os trabalhadores que vão desempenhar as funções instrumentais na hierarquia do trabalhador coletivo e educação tradicional, voltada para a formação dos dirigentes e intelectuais.
 

Segundo Gaudêncio Frigotto em “A relação entre o estrutural e o conjuntural e as políticas de educação tecnológica e profissional”, trata-se de um processo histórico comandado por revolução passiva, transformismo ou modernização conservadora. Para ele, esse processo tem mantido intactas as estruturas sociais e de poder que geram a desigualdade, o aumento da concentração de renda e da degradação da qualidade de vida da classe trabalhadora.

No entanto, e sem pretensão de afrontar Gaudêncio Frigotto, João Paulo e Wilton, percebo que, diante do cenário de desenvolvimento econômico brasileiro, a articulação entre educação e trabalho afeta diretamente esta transição e nos leva a analisar as suas dualidades e possibilidades de inclusão e cidadania.
 
Através do mapeamento das políticas públicas para a juventude no que tange a sua inserção no mundo do trabalho, e avaliando, em particular, os programas do governo federal e os desenvolvidos no âmbito Municipal, como iniciativa público-privada e suas possibilidades conceitual e prática de funcionar, dentro da perspectiva dualística, não apenas como mera instrumentalização para o trabalho, mas como parte de um esforço, dentro dos programas municipais de capacitação profissional em Vitória da Conquista, percebo a busca da identificação e da capacidade de abarcar dimensões econômicas, sociais, antropológicas, éticas e políticas para um vasto segmento da nossa população (juventude), exatamente o mais vulnerável e necessitado de políticas públicas.
 

A questão da capacitação para o trabalho não é o único mecanismo de inclusão social, porém é o que o motiva a buscar qualificação, ainda que seja técnica, por necessidades de ordem econômica e que amplie a sua concepção de mundo e envolvimento nas questões sociais, se percebendo como agente de transformação.
 
O aumento relativo da população jovem brasileira traz consigo uma perspectiva positiva do ponto de vista socioeconômico, pois traz o jovem como ator estratégico do desenvolvimento e representante da classe economicamente ativa. Este protagonismo jovem, entretanto, depara-se com a configuração de alguns paradoxos como as restrições das oportunidades de emprego e inserção no mundo do trabalho e a extensão e possibilidade de extensão da formação educacional, garantindo maior empregabilidade e menos vulnerabilidade e submissão ao sub emprego.
 
A adoção do jovem como foco dessas iniciativas, configura-se como estratégia de orientação e formação com fins de minimizar o envolvimento com situações de risco, além do aspecto da representação, da proteção social contra as vulnerabilidades, da promoção de oportunidades e desenvolvimento, favorecendo a experimentação e inserção cidadã.
 
O direcionamento das políticas de qualificação e capacitação para o trabalho, desde antes até os últimos tempos, me motiva a pensar que teremos um cenário diferente do até aqui exposto. Pessoas preparadas, competentes, nas empresas públicas e privadas, que darão significado, excelência no atendimento e qualidade aos serviços e produtos, tornando a atuação profissional, respeitosa, consistente, entregando à população satisfação e não transtorno gerado por incompetência e imperícia.
 
Esse cenário vai ao encontro das concepções que visualizo e desejo para um projeto de desenvolvimento para a de Vitória da Conquista e para o qual, acredito, estamos trabalhando para construir, iniciando por nossa cidade, até conseguirmos qualificar o mundo inteiro.
 

*ELIANE ASSUNÇÃO é administradora, professora da Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC), da Faculdade Juvêncio Terra e gerente de projetos da Agência de Desenvolvimento Trabalho e Renda da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista

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