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Prefeitura gasta milhões e ignora o forró
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Imagem: Conquista VIP |
Prefeitura gasta milhões e ignora o forró:
a exclusão da cultura popular nos palcos de Conquista
“Um minuto de João Gomes custa R$ 4.167,00:
a face da pobreza e da desigualdade em Vitória da Conquista.”
*por Herberson Sonkha
VITÓRIA DA CONQUISTA/BA- A contratação do cantor João Gomes para um show de duas horas, ao custo de R$ 500 mil aos cofres públicos, escancara não apenas as desigualdades sociais de Vitória da Conquista, mas também a dura e negligenciada face da pobreza que marca o cotidiano de milhares de trabalhadores e trabalhadoras da cidade.
O valor, que equivale a R$ 4.167,00 por minuto de apresentação, contrasta de forma gritante com a realidade da maioria da população conquistense, onde 60,2% sobrevivem com menos de R$ 60,00 por dia. Enquanto o artista embolsa meio milhão em um único evento, o trabalhador médio da cidade recebe apenas R$ 6,32 por hora de trabalho — precisando de um mês inteiro de esforço para alcançar R$ 1.518,00, considerando uma jornada de 8 horas diárias durante 30 dias.
Não se trata aqui de atacar o esforço ou o talento de João Gomes, jovem nordestino que conquistou espaço na mídia nacional com seu carisma e sua música popular. A crítica que se impõe é estrutural: é sobre o abismo salarial que separa ricos e pobres; sobre a manipulação da imagem de artistas populares por gestores públicos oportunistas; e sobre a desvalorização sistemática da cultura popular local em detrimento de espetáculos midiáticos usados como ferramenta de distração política.
O evento, promovido sob a chancela de uma prefeita bolsonarista, não é apenas um show: é um instrumento de alienação. Serve para encobrir a realidade das periferias e da zona rural de um município com quase 400 mil habitantes, onde o mercado formal absorve menos de 25% da força produtiva, a renda per capita é de R$ 1.991,57, e a maioria da população pertence às classes D e E.
A desigualdade social em Vitória da Conquista é alarmante: 60,2% da população está nas faixas de menor renda, enquanto as camadas mais abastadas representam apenas 16,8% da força produtiva local. O abismo social do município supera em 15,1 pontos percentuais a média estadual, e mesmo as faixas de alta renda estão 8,1 pontos abaixo da média da Bahia. Ou seja, trata-se de uma cidade em que nem os ricos são realmente ricos, mas onde os pobres são esmagados por uma estrutura profundamente injusta.
O Produto Interno Bruto (PIB) local é de R$ 8,2 bilhões, mas os setores que mais empregam — como a administração pública (9.694 vagas), a fabricação de calçados de couro (4.911) e a confecção de roupas (3.158) — são marcados por baixos salários, precarização e pouca valorização da mão de obra. Ou seja, é uma economia baseada na exploração intensiva de trabalho barato, majoritariamente feminino e periférico.
Não se trata, portanto, de discutir se João Gomes "merece" o cachê. A pergunta correta é: pode uma cidade com tamanha pobreza, desigualdade e precariedade estrutural gastar R$ 500 mil em um único show, enquanto escolas estão sucateadas, postos de saúde enfrentam falta de insumos, e milhares de pessoas vivem sem acesso digno à moradia, ao transporte e à assistência social?
Mais do que um gasto elevado, a contratação é um ato simbólico. Representa uma escolha política: a cultura do espetáculo em vez da cultura do povo. É a aposta na alienação e no consumo momentâneo, em detrimento do investimento em políticas públicas estruturantes, na valorização da produção cultural local e na promoção da dignidade dos que constroem a cidade com seu suor.
Esse cenário revela a face imoral de um governo municipal de extrema-direita, que governa com discursos moralistas enquanto manipula o erário como um cofre privado, promovendo entretenimento para maquiar o abandono. Trata-se de um modelo de gestão que negligencia a cultura popular como instrumento de resistência, pertencimento e transformação social — especialmente no Nordeste, onde o forró é patrimônio afetivo, histórico e político das comunidades.
Um único minuto de show de João Gomes custa R$ 4.167,00 ao povo de Vitória da Conquista. Isso não é apenas caro. É ofensivo. É simbólico. É revelador. Revela um sistema de prioridades perversas, onde o entretenimento midiático é usado para ocultar a dor cotidiana, e onde a cultura popular é descartada como se fosse invisível. É o retrato de um projeto político que escolhe o espetáculo em vez da soberania popular, a maquiagem em vez da dignidade, e o lucro eleitoral em vez da justiça social.
Outro ponto que a população excluída não pode deixar de criticar fortemente: quem se beneficia na comercialização de camarotes em um evento pago com dinheiro público, recolhido por impostos cobrados de todos nós?
A alienação, ponto central de uma escolha política sobre quem “merece” (?) ser favorecido(a), torna inegável quem preocupa o bolsonarista governo municipal e cabe ao povo questionar as razões de seu abandono.
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