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quinta-feira, 3 de abril de 2025

EDITORIAL | Pastor Bolsonarista?

Imagem: DCM

"A urgência de uma conversão ao Evangelho de Cristo."



*por Herberson Sonkha



VITÓRIA DA CONQUISTA, BA — Recentemente, tomei conhecimento de um episódio perturbador envolvendo meu irmão, Herberg Sousa Silva (Herbinho), residente em Manoel Vitorino. Ele foi vítima de agressão verbal por um professor que se autointitula bolsonarista, ato que reflete um padrão de intolerância que se alastra no Brasil desde 2016.

Como integrante do Movimento Negro Brasileiro (MNB) há mais de duas décadas e praticante de uma religião de matriz africana, tenho profundo respeito pela liberdade religiosa. Conheço membros respeitáveis da congregação do agressor e, por isso, optei por não expô-lo publicamente. Contudo, à luz dos Evangelhos de Cristo, que pregam o acolhimento ao pecador e a rejeição ao pecado, sinto-me compelido, como educador e comunicador, a abordar este tema.

Como pesquisador vinculado ao Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre Trabalho, Política e Sociedade (NETPS/UESB), com atuação em História, Filosofia, Sociologia e Economia, analiso a questão sob uma perspectiva crítica e pedagógica. Meu objetivo é fomentar uma reflexão sobre os "sepulcros caiados" — símbolos da hipocrisia contemporânea —, destacando as contradições entre discurso religioso e prática política na sociedade brasileira. 


O dilema entre Fé e ideologia extremista

Nos últimos anos, líderes religiosos cristãos têm aderido ao bolsonarismo, movimento associado a Jair Bolsonaro, cujas práticas — autoritarismo, discurso de ódio, fake news e negação de direitos — contradizem frontalmente os princípios evangélicos. Como conciliar essa postura com os ensinamentos de Cristo, fundamentados no amor, na justiça e na inclusão? Este artigo investiga os antagonismos entre o projeto bolsonarista e os valores cristãos, ressaltando a urgência de uma revisão ética por parte de pastores e pastoras que abraçaram essa ideologia de extrema-direita.

Fascismo e bolsonarismo: paralelos históricos

O fascismo do século XX, marcado por culto à violência, nacionalismo extremado e perseguição a minorias, deixou um legado de genocídios e censura. No Brasil, o bolsonarismo apresenta traços análogos, adaptados ao contexto local. Durante o governo Bolsonaro (2019-2022), observaram-se:

1. Ataques às instituições democráticas, incluindo o Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso Nacional e o sistema eleitoral;  

2. Narrativas autoritárias, com apologia à ditadura militar (1964-1985) e a torturadores;  

3. Disseminação de desinformação, promovendo fake news e ataques à imprensa;  

4. Desmonte de políticas sociais e flexibilização de direitos trabalhistas e ambientais;  

5. Discurso de ódio contra movimentos sociais, LGBTQIAP+, povos indígenas e comunidades negras.

Outro elemento alarmante é a defesa de milícias. Esses grupos paramilitares, ligados historicamente a crimes como extorsão e assassinatos, foram romantizados por Bolsonaro como "justiceiros". Em 2020, o então presidente vetou projetos que criminalizavam milícias, enquanto aliados propunham regulamentá-las. A postura legitima estruturas de poder paralelas e corrói o Estado Democrático de Direito.


O Evangelho de Cristo: Princípios irrenunciáveis

Os Evangelhos apresentam uma mensagem radical de amor e justiça social. Seus pilares incluem:

Amor incondicional e compaixão  

Jesus enfatizou o amor ao próximo como mandamento central: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Mateus 22:39). Seu ministério incluiu marginalizados — como leprosos, samaritanos e mulheres —, em contraste com a exclusão pregada pelo bolsonarismo.

Opção preferencial pelos pobres 

As bem-aventuranças destacam os "pobres em espírito" e os "perseguidos por causa da justiça" (Mateus 5:3-12). Cristo denunciou a exploração econômica (Marcos 11:15-17) e defendeu a partilha (Lucas 12:33). O desmonte de programas como o Bolsa Família contradiz esse princípio.

Rejeição à violência

Ao repreender Pedro por usar a espada (Mateus 26:52), Jesus rejeitou a violência como método. O gesto de "arma apontada" em púlpitos — símbolo bolsonarista — afronta esse ensinamento.

Verdade e Integridade

"Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" (João 8:32). A defesa do negacionismo científico e a propagação de mentiras corroem a noção cristã de verdade.


Bolsonarismo vs. Evangelho: pontos de conflito


Autoritarismo vs. Democracia do Reino  

O Evangelho prega um Reino baseado na serviçalidade ("Quem quiser ser grande, seja vosso servo" — Marcos 10:45), enquanto o bolsonarismo exalta líderes autocráticos. A tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023, com invasões ao Congresso e ao STF, evidencia o desprezo pela democracia.


Militarização vs. Cultura de Paz

A exaltação de armas e a defesa de milícias contrariam Isaías 2:4: "Transformarão suas espadas em arados".


Negação da Ciência vs. Cuidado com a Vida

A gestão irresponsável da pandemia resultou em mais de 700 mil mortes. Para o cristianismo, a vida é sagrada ("Não matarás" — Êxodo 20:13).


Corrupção vs. Ética

Escândalos como o das joias da Arábia Saudita (2023) revelam uma cultura de ilegalidade. O Evangelho exige integridade: "Melhor é o pouco com justiça do que grandes rendimentos com injustiça" (Provérbios 16:8).


Destruição Ambiental vs. Mordomia da Terra

O avanço do desmatamento e os ataques a terras indígenas violam o mandato bíblico de preservação da criação (Gênesis 2:15).


Teologia da prosperidade e cooptação religiosa

Parte da adesão de líderes evangélicos ao bolsonarismo relaciona-se à Teologia da Prosperidade, que reduz a fé a uma transação comercial. Parafraseando Leonardo Boff, teólogo e crítico dessa vertente: "Não se pode instrumentalizar Deus para justificar picaretagens ideológicas" (em referência a sua obra "Igreja: Carisma e Poder", 1981).


Profetismo ou Conivência?

Pastores bolsonaristas enfrentam um dilema: servir ao Evangelho ou a um projeto de poder. Nas palavras do Papa Francisco, em discurso no Vaticano (2020): "Uma política que não leva em conta os fracos e os pobres não é cristã".


Conclusão: Conversão ou Hipocrisia?

Um pastor que defende o bolsonarismo coloca-se numa encruzilhada: seguir Cristo ou um ídolo político. Segundo biógrafos, Dom Hélder Câmara, arcebispo e defensor dos direitos humanos, costumava afirmar: "Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, me chamam de comunista" (Dom Hélder Câmara: Entre o Poder e a Profecia, Nelson Piletti, 2017).


A conversão ao Evangelho não é opcional: é urgente.


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