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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Diálogo com Ruy Medeiros

Florisvaldo Bitencourt, Ruy Hermann Medeiros,
Mitã Chalfun (UNE), Alexandre Garcia Araújo (Xandó do LPJ)


Dirigentes de várias entidades do Movimento Estudantil realizaram nesta terça (20) na UFBA de Vitória da Conquista uma discussão sobre a Comissão da Verdade de Vitória da Conquista, com objetivo de dialogar sobre a Memória e a Verdade, na Comissão Especial que trata do resgate da memória dos mortos e desaparecidos políticos conquistenses. O DCE-UFBA, CA’s, Levante Popular da Juventude, Enegrecer, Kizomba, UEB e UNE e o Mandato do Vereador Florisvaldo Bittencourt participaram da atividade e fizeram intervenções sobre a Comissão Nacional da Verdade e o Direito à Memória, Verdade e Justiça.
Este diálogo contou com a presença do autor da Lei que institui a Comissão da Verdade, o Vereador Florisvaldo Bittencourt, militante filiado ao PT desde os anos 80, egresso dos grupos de base da igreja católica; o Dirigente do Movimento Levante Popular da Juventude, graduado em Direito pela UESB, Alexandre Garcia Araújo (Xandó), autor de uma belíssima peça de conclusão de curso com o tema “Luz, Câmara, Escracho! O Protagonismo e a ousadia da juventude na luta pelo Direito à Memória, Verdade e Justiça”, cujo orientador foi o Professor Ruy Medeiros; o estudante de Educação Física da UFRJ Mitã Chalfun, petista (DS e Movimento Kizomba) e atualmente Vice-Presidente da UNE; A Diretora de Combate ao Racismo da UNE, a estudante Marcela Santos e Rui Medeiros, escritor, professor e militante político de esquerda estudioso da obra marxiana, Mestre em Memória: Linguagem e Sociedade pela UESB, graduado em Direito pela Universidade Católica do Salvador (1971), especialização em “Novos Direitos e Direitos Emergentes” (UESB), Professor da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e membro do Museu Pedagógico da UESB e uma das vitimas da ditadura militar, torturado, tendo seus direitos suspensos, expulso na universidade.  

Apesar da força das palavras de ordem, “a UNE somos nó! Nossa força e nossa voz!” que ecoaram pelos quatros cantos do país no decorrer das lutas da UNE, hoje parece opaca e cheia de controvérsia, pois a entidade atravessa momentos de desgastes, no entanto, quem pensa que a institucionalidade transformou todas as entidades do Movimento Estudantil, inclusive a UNE, em correia de transmissão de governos, parece que há polêmicas nesta afirmativa. As falas de seus dirigentes demonstraram que ainda há muita disposição e pauta com ressonância das ruas no transcurso da luta política presente e futura, deste líquido século XXI.

Mesmo tendo passado todos esses anos gloriosos, há quem diga que a moderna União Nacional dos Estudantes ufana-se deste passado longínquo para escamotear sua tão questionada práxis política no presente. O olhar de quem a conheceu no calor da luta contra a ditadura, inexoravelmente faz um inflexão sobre a mesma com um olhar crítico e o debate colocado por dirigentes da UNE reflete isso se comparado com a historicidade e a práxis política do Professor Ruy Hermenn Medeiros, que destoa coerentemente da toada dos atuais dirigentes da UNE, sem, no entanto negar as lutas atuais desenvolvidas pela UNE.

A análise do Professor Ruy Medeiros nos fez zanzar pela história da UNE trazendo a luz a necessidade de que é preciso dar conta de uma nova entidade com tarefas estranhas e incoerentes com a trajetória política da mesma e, pasmem alertar quanto à fluidez na compreensão política do campo majoritário e com o silencio de quem se opõe na UNE. O debate está atual porque permanece consistente e insolúvel porquanto exista o sistema de exploração do pelo home, os problemas persistem e decorrem do capitalismo. Em relação a UNE por conta da opção conveniente dos descaminhos do Estado burguês mantido pela institucionalidade (governabilidade).

As contradições extrínsecas a democracia liberal burguesa, ao Estado Burguês, a correlação de forças entre o capital e trabalho, as suas imbricadas relações de classes sociais antagônicas, movimento do capital ainda estão presentes e devem ser além de compreendidas, combatidas programaticamente. Embora isso não seja percebido nem sentido por grande parte dos estudantes universitários brasileiros que não se sentem representados pela UNE e isso não é uma questão de ame-o ou deixe-o...

Neste sentido, a mesa e a plenária era ocupada por jovens, dentre todos os presentes, principalmente aqueles que tiveram acento à mesa, o mais árduo jovem era aquele eterno estudante de cabelos brancos cujas palavras pululavam vigorosas em função da contemporaneidade do tema, muitas vezes, subsumidos pela falta de apetrechamento teórico capaz de orientar a luta. Lá estava ele, o jovem intelectual conquistense Ruy Hermann Medeiros, cuja intervenção ainda traz consigo o contentamento na expressão da primavera nos dentes, de quem recebeu a honrosa tarefa de cortar com os dentes aguçados os arquétipos neoliberais dos guardiões da riqueza e entregar aos seus sucessores no transcurso das lutas sociais o “segredo” que traduz os tempos e apetrecha os explorados e alienados deslindando o caminho para a desalienação e o fim último da exploração do homem pelo homem.

Assim, uma primorosa aula de economia política do Professor Ruy Hermann Medeiros deu ao debate a riqueza necessária ao entendimento da realidade cruel dos militares e mais que isso, dos capitalistas para quem os milicos servem. Isso possibilitou se apropriou do materialismo histórico, da dialética e da economia política marxiana que propõe romper com a alienação que enseja o estranhamento ocasionado pelo mercado capitalista e sua tese reducionista da teoria clássica liberal ressignificada como neoliberalismo burguês, que transforma o ser em Homo Economicus, e arrasta a tudo e todos ao lixo do submundo do consumismo.

O falacioso Estado de Direito como garantia de igualdade de direitos limita-se apenas ao mundo jurídico formal e, portanto a igualdade das pessoas torna-se uma mera abstração retórica da formalidade, em detrimento de depauperamento material e intelectual dos trabalhadores no âmbito econômico, social e político. Aliás, constitui-se a prisão, alienação, da classe trabalhadora.

Portanto, esta comissão especial se propõe reabrir arquivos e reescrever a historia da memória e da verdade acerca dos homicídios e desaparecimento dos militantes políticos apontando seus algozes e é justamente por isso que não se encerra na luta pela garantia do Estado de Direitos. Não obstante, saber que a polícia e seu aparato militar estão a serviço das elites na defesa dos bens e do capital e neste jogo torna-se indispensáveis para abater a classe trabalhadora, estudantes e movimentos sociais diversos que fazem o enfrentamento ao capital.

O aparelho de Estado, as Forças Armadas e a Polícia Civil e Militar são ferramentas de coerção instituídas pela própria legislação liberal burguesa para manter a ordem capitalista e não seria diferente sua postura frente a qualquer ameaçada dos trabalhadores, estudantes, organizações de classe e Movimentos Sociais, inexoravelmente a ditadura é brutalmente estabelecida. Não há uma agenda dos militares porque no mento não há esta demanda. A conjuntura dada não pede ainda um Estado de Sítio que abone a intervenção golpista, mas não devemos descartar esta possibilidade a médio e longo prazo, pois há milicos de plantão esperando a ordem para matar, torturar e interromper a frágil republica democrática liberal.
De que UNE estamos falando? Aqui a União Nacional dos Estudantes não pode ser vista como uma entidade sem história, por isso deve-se analisar o desenrolar da historia da UNE. No momento do golpe o presidente era o odioso José Serra que combateu a ditadura e viu os militares atear fogo na sede da UNE no Aterro do Flamengo, lutou contra a Lei Suplicy de Lacerda que coloca a UNE na ilegalidade, realizou na ilegalidade o Congresso XXVIII (1966) no porão da Igreja São Francisco de Assis contra o Acordo MEC-Usaid.

A UNE manifestou contra o fechamento do Restaurante Calabouço e se rebela contra o brutal homicídio do estudante Edson Luiz de Lima Couto, realiza também na clandestinidade o XXX Congresso da UNE em Ibiúna (1968), cominando com a prisão, morte e desaparecimento de varias lideranças nacionais da UNE, inclusive, o homicídio de Alexandre Vannucchi Leme que possibilita o grande movimento de massa com a missa na Catedral da Sé (SP, 1968) em que a policia dispersa a multidão com violência, prisão e tortura.

A UNE criou nos anos 1970 o Comitê de Defesa dos Presos Políticos na USP; após um período inoperante inicia-se um movimento pela reconstrução da entidade e até a “reabertura lenta e gradual” iniciada por Ernesto Geisel (1974-1979) e concluído por João Baptista Figueiredo (1979-1985); a Bahia (Salvador) vai sediar a reorganização da entidade a partir do XXXI Congresso intitulado de “Congresso da Reconstrução” dentro da legalidade e sem a presença dos militares prejudicada pela falta de divulgação e por isso não tão representativa.

A realização do XXXII Congresso da UNE (1980) aconteceu em Piracicaba (SP) com apoio do prefeito João Herrmann Neto, do reitor Professor Elias Boaventura da Universidade Metodista de Piracicaba coma presença de aproximadamente 4 mil estudantes ainda sob a égide dos militares e isso vai reforçar as imensas passeatas pelas Diretas Já para presidente; nos anos 90 organiza o enfrentamento ao neoliberalismo e a UNE assumi importante papel de mobilizador no Fora Collor e sob a presidência de Lindbergh Farias levanta a bandeira do impeachment contra o presidente Fernando Collor de Mello.

A UNE chega sem maiores acontecimento ao XXXVI Congresso que conta com a participação do presidente cubano Fidel Castro; lidera nos anos 90 grandes manifestações contras a privatizações realizadas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso e após aprovação da LDB neoliberal do Ministro Paulo Renato lidera o “Fora FHC”.  Portanto, a UNE em finais da década de 90 e a primeira década do século XXI entra nos desgastes da famigerada carteirinha estudantil e aos poucos não se escuta mais os brados fortes da militância da UNE e gradualmente esvai em disputas internas pela hegemonia entre o PCdoB, tendências internas do PT, PCR e PSOL e na contramão segue o PSTU organizando um entidade alternativa a UNE que é a ANEL.

No que pese saber que a UNE não vive seus melhores dias de glória porque experimenta os desgastes “naturais” de quem opta por defender uma postura fluida e se ufana em dizer que o Estado, se bem gerido, garantirá o famigerado “Estado de Direito” a partir da radicalização da democracia como se está fosse o caminho perfeito à revolução, se é que ainda a persiga, tão propalada pela UNE nos anos que antecedem a crise do socialismo real do leste europeu.


A Comissão Especial possibilitará à população conquistense a reabertura de um diálogo franco com a história contemporânea deste país, no sentido de reconstruir minimamente uma lacuna no período criada pelos militares na historia recente do Brasil, visando reescrever esta página trágica trancafiada pelo regime militar na vida dos conquistenses, pesquisar e abordar os crimes contra militantes políticos, homicídios, nulidade dos direitos civis e políticos e holocausto realizado pelos militares em Vitória da Conquista desde que ocuparam o atual 9º Batalhão de Polícia, em 05 de maio de 1964.

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