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Edwaldo Alves e a análise do PED do PT em Vitória da Conquista
Edwaldo Alves e a análise do PED do PT
em Vitória da Conquista
*por Herberson Sonkha
O texto lúcido de Edwaldo Alves Silva oferece, no limite, uma reflexão político-organizativa coerente sobre o recente Processo de Eleições Diretas (PED) do Partido dos Trabalhadores (PT) em Vitória da Conquista. O autor interpreta acertadamente esse processo como um marco na renovação partidária no contexto pós-derrota eleitoral de 2024. Tudo estaria absolutamente perfeito — não fosse Lenin e Marx. Aplicando uma lente marxista-leninista — especialmente ancorada em Duas Táticas da Social‑Democracia na Revolução Democrática (1905), de Lenin¹ —, podemos realizar uma leitura crítica e dialética dos elementos centrais da análise de Edwaldo.
Democracia interna e luta de tendências: o campo da tática política
Edwaldo enaltece o PED como instrumento de aprofundamento da democracia interna, valorizando a pluralidade de chapas, candidaturas e posições políticas. Essa abordagem dialoga corretamente com a concepção leninista de tática, que exige subordinação a "princípios firmes e à análise concreta da situação concreta"¹. O reconhecimento de que a composição do diretório será proporcional — superando a lógica burguesa do "ganhar ou perder" para priorizar a construção hegemônica em torno de um programa coletivo — aproxima-se do centralismo democrático leninista, em que diferenças táticas coexistem subordinadas à estratégia revolucionária.
Embora o texto rejeite ou não se proponha a discutir hegemonias impostas, Lenin alerta que a pluralidade sem direção estratégica pode degenerar em disputas paralisantes. A defesa abstrata da pluralidade, sem vinculação a um projeto classista, pode inadvertidamente servir ao reformismo e ao apaziguamento das contradições de classe no interior do partido¹.
Renovação, unidade e enfrentamento à direita: o conteúdo programático
Edwaldo aponta como consensos do PED:
Retomar a inserção nos movimentos populares;
Unificar a esquerda com independência;
Combater o fascismo e a extrema-direita;
Elaborar um programa político-administrativo para 2026/2028
Lenin, em Duas Táticas, enfatiza que o partido revolucionário deve transformar as crises da ordem burguesa em degraus para a revolução socialista: “Devemos saber transformar cada passo da revolução democrático-burguesa em um degrau para a revolução socialista”².
Apesar dos avanços democráticos celebrados por Edwaldo, o texto não avança numa análise concreta da conjuntura de classe nem propõe um programa de transição socialista. Essa lacuna enfraquece a capacidade do PT de operar taticamente rumo à ruptura com o capitalismo, mantendo-o na condição de partido de mediação reformista — sem tensionar a superação da ordem burguesa.
Mandonismo, hegemonia e centralismo democrático: a direção revolucionária
Edwaldo problematiza a tendência ao “mando” nos partidos, alertando que maiorias democraticamente eleitas podem esmagar minorias e desvirtuar o centralismo democrático. Embora recorra implicitamente a Gramsci, falta articular esse debate com a premissa leninista de que “a social-democracia deve dirigir e não apenas acompanhar o movimento das massas”³.
O combate ao mandonismo é legítimo, mas a relativização da autoridade da maioria dirigente — sem contraponto com a necessidade de disciplina revolucionária — pode fragilizar a capacidade de ação unitária. Para Lenin, a hegemonia revolucionária exige autoridade prática e ideológica, fundamentada numa linha política correta e na confiança da classe trabalhadora⁴.
Tática eleitoral e preparação para 2026/2028
Edwaldo destaca o PED como preparação para as eleições, visando reconstruir a confiança popular e apresentar um programa alinhado aos interesses da classe trabalhadora. Lenin defendia o uso das eleições burguesas como tribuna de denúncia do regime e instrumento de fortalecimento da organização operária⁵.
A participação eleitoral só cumpre seu potencial revolucionário se subordinada a um projeto de ruptura. A ausência dessa articulação no texto de Edwaldo abre espaço para que setores conciliadores reproduzam a lógica da conciliação de classes — responsável pelo esvaziamento do projeto original do PT e pela histórica capitulação de tendências e coletivos ao capital.
O PT entre as “Duas Táticas” de Lenin
Duas Táticas surge para resolver o impasse entre mencheviques (que viam a revolução democrática como limite) e bolcheviques (que propunham a transição ininterrupta ao socialismo). O texto de Edwaldo expressa esse dilema histórico do PT:
Avanço na mediação democrática: O PED cumpriu exitosamente a tarefa de renovação interna, promovendo pluralidade e combatendo o mandonismo, conforme a qualificada avaliação de Edwaldo.
Limite estratégico: Falta explicitar um horizonte de ruptura com a ordem capitalista, mantendo o PT na condição de partido de mediação, não de direção revolucionária⁶.
Fundamentação para o salto qualitativo
Diante dos novos desafios impostos pela fase atual do metabolismo social do capital — financeirização, crise ecológica e avanço reacionário —, as correntes internas da esquerda orgânica do PT precisam se perguntar se desejam transitar de um partido de mediação para um partido de direção revolucionária. Caso a resposta seja afirmativa, como Lenin asseveraria, isso exige:
a) Clareza programática: elaborar um programa de transição que articule lutas imediatas à superação do capitalismo;
b) Hegemonia classista: conquistar autoridade ideológica junto à classe trabalhadora, denunciando os limites da democracia burguesa⁷;
c) Ousadia tática: utilizar as instituições burguesas — como as eleições — não como fim, mas como meio para acumular forças rumo à ruptura⁸.
A renovação democrática em Vitória da Conquista é um passo necessário, mas ainda insuficiente. O verdadeiro marco será quando o PT assumir, sem ambiguidades, a tarefa histórica de converter a crise orgânica do capital em processo revolucionário. Só então o partido poderá afirmar com convicção que está à altura do tempo histórico e das exigências do seu nome.
Referências
1. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. 3. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. (Obras Escolhidas, v. 1). Cap. 4-5, p. 44-48.
2. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Cap. 5, p. 45-46.
3. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Cap. 6, p. 49.
4. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Cap. 6, p. 50-51.
5. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Cap. 12-13, p. 92-104.
6. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Cap. 7 e Conclusão, p. 95-110.
7. LENIN, Vladimir Ilitch. Que fazer?. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 1988. Cap. II-III, p. 58-89.
8. LENIN, Vladimir Ilitch. Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. Conclusão, p. 104-110.
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