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À NOTA: Audiatur et altera pars
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Foto: Instagram - Rubens Sampaio |
À NOTA: Audiatur et altera pars
Quando a justiça restaura a verdade:
a absolvição de Rubens Sampaio e os
limites da moral pública midiática
*por Herberson Sonkha
VITÓRIA DA CONQUISTA (BA) – No último dia 7 de julho de 2025, a Quarta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região julgou, de forma unânime, os recursos interpostos nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho e pelo SINJORBA (Sindicato dos Jornalistas da Bahia), contra a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). O processo (nº 0000631-85.2023.5.05.0611), que tramitava sob segredo de justiça, tratava de acusações de assédio moral dirigidas ao professor e jornalista Rubens Jesus Sampaio, ex-diretor do SURTE/UESB – o Sistema UESB de Rádio e Televisão Educativa. A decisão judicial, que o inocenta integralmente, não apenas encerra um longo processo, mas também levanta questões fundamentais sobre os limites éticos e jurídicos da exposição pública de denúncias ainda em apuração.
Uma Nota Pública assinada pelo advogado Gutemberg Macedo Júnior veio a público no dia 21 de julho, dirigida à sociedade conquistense, à UESB e aos meios de comunicação. Nela, a defesa jurídica de Rubens Sampaio desloca o centro do debate para o campo dos princípios constitucionais, alertando para os riscos do julgamento moral precipitado e da instrumentalização política do discurso da integridade.
É sob essa chave que precisamos ler criticamente o documento: ele não é apenas uma manifestação técnica em defesa do cliente, mas um posicionamento público sobre as distorções que ameaçam a credibilidade das instituições democráticas.
O risco da condenação antecipada
Desde o início do caso, tornou-se evidente um movimento de exposição midiática indevida, alimentado por setores do próprio corpo institucional da UESB, por autoridades de entidades profissionais – como a subseção local da OAB – e por atores sindicais, como o SINJORBA. A Nota aponta que, mesmo com a determinação de sigilo judicial, as acusações chegaram às manchetes da imprensa local, regional e estadual. Neste ponto, a defesa sustenta uma tese grave: a violação do devido processo legal e o uso político das denúncias em detrimento das garantias constitucionais do acusado.
A referência ao princípio da presunção de inocência, assegurado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal, é central. Não se pode permitir que a pressão pública converta denúncias em sentenças morais antecipadas. A Nota revela que houve manifestações públicas de figuras como a professora Monalisa Barros (presidente da comissão sindicante), da ex-presidente da OAB local, Luciana Silva, e de lideranças sindicais que comentaram os fatos e as partes envolvidas sem conhecer o conteúdo dos autos e sem autorização judicial para divulgação de informações protegidas por sigilo.
A crítica transcende a ilegalidade formal e alcança o plano ético: a defesa acusa parte da elite institucional da cidade de utilizar o discurso do politicamente correto como arma simbólica de destruição de reputações. Essa acusação não pode ser banalizada. Em tempos de crescente judicialização da vida pública, o risco de “linchamentos morais” com roupagem ética e progressista torna-se um desafio à democracia.
Entre a sindicância e o PAD: o conflito de legitimidades
Um dos elementos centrais da Nota é a distinção entre os dois processos administrativos instaurados na universidade: a comissão de sindicância, que teria atuado com parcialidade e ilegalidade, e o Processo Administrativo Disciplinar (PAD), conduzido sob o rigor do contraditório e da ampla defesa. A decisão do TRT-5, segundo a Nota, reconheceu a lisura e a coerência do PAD, em contraste com os vícios jurídicos da sindicância. Essa crítica se ancora no princípio da impessoalidade (Art. 37 da CF/88), que deve nortear toda a administração pública.
A defesa sugere que a sindicância foi usada como instrumento de perseguição institucional, violando preceitos elementares do direito administrativo. O ordenamento jurídico brasileiro é claro: comissões processantes devem ser imparciais, compostas por membros isentos e abertas à produção ampla de provas, sob pena de nulidade do processo.
A leitura jurídica apresentada é robusta: apenas o PAD respeitou as exigências constitucionais de ampla defesa e contraditório (Art. 5º, inciso LV), e por isso suas conclusões — que recomendavam o arquivamento do caso — foram confirmadas pelo Poder Judiciário. Neste ponto, a decisão judicial restaura a autoridade do processo administrativo legalmente conduzido e desautoriza tentativas de condenação paralela.
A atuação da imprensa e o direito à imagem
Outro eixo do documento é a denúncia contra os meios de comunicação que descumpriram o sigilo processual, permitindo a circulação de informações parciais e distorcidas. Trata-se de um ponto sensível. A imprensa, em uma sociedade democrática, tem papel fundamental no escrutínio público e na promoção da transparência, mas esse papel não pode se sobrepor às garantias legais que protegem a dignidade da pessoa humana e a presunção de inocência.
O Código de Processo Civil (Art. 189) estabelece que processos sob segredo de justiça não podem ser objeto de divulgação sem autorização judicial. A Constituição Federal, por sua vez, protege o direito à honra e à imagem (Art. 5º, X). Portanto, há aqui um conflito clássico entre liberdade de expressão e direitos da personalidade, que precisa ser resolvido com base nos princípios da proporcionalidade e da responsabilidade da imprensa.
A Nota não reivindica censura, mas responsabilidade editorial e jurídica. Como já assentou o STF, a liberdade de expressão não é absoluta, especialmente quando colide com direitos fundamentais de terceiros.
Justiça feita — mas com quais cicatrizes?
A decisão judicial que absolve Rubens Sampaio e determina seu retorno imediato à Direção do SURTE é, nas palavras da própria Nota, “um restabelecimento da verdade” e da sua honra pessoal e profissional, após mais de 20 anos de serviço público. A leitura crítica, no entanto, não pode se restringir à figura do acusado. O caso revela algo mais profundo: a fragilidade das instituições em lidar com denúncias sérias sem ceder ao espetáculo da acusação pública.
Como construir um ambiente institucional seguro, democrático e justo, se os instrumentos internos são contaminados por interesses políticos, morais ou pessoais? Como proteger o legítimo direito de denúncia sem abrir espaço para abusos que condenam antes do tempo? E como restaurar a confiança em mecanismos como sindicâncias, PADs e na própria função social da imprensa, quando são usados — direta ou indiretamente — como braços de campanhas simbólicas de exclusão e deslegitimação?
Considerações finais
A Nota Pública emitida pela defesa de Rubens Sampaio não é um simples desagravo jurídico. É um documento político — no melhor sentido da palavra. Denuncia a falência dos ritos institucionais quando contaminados por moralismos seletivos, violações éticas e interesses obscuros. E, ao fazê-lo, reafirma que a justiça — quando feita com base em provas, e com respeito ao devido processo legal — ainda é o melhor antídoto contra o tribunal da opinião pública.
É preciso estar atento: os linchamentos morais não nascem apenas nos porões autoritários do Estado, mas, muitas vezes, ganham corpo no palco iluminado das boas intenções. Defender o devido processo não é proteger culpados, mas garantir que a verdade não seja vítima colateral do espetáculo da denúncia.
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