Translate

Seguidores

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Qual é o real perigo do generalato dissidente romper a ordem constitucional?

Foto: Ricardo Moraes/Reuters
*por Herberson Sonkha

Corre-se todo perigo sim de embernarmos num longo, sanguinário e truculento período autocrático de governo instituído por uma ditadura civil-militar no Brasil de extrema-direita com verve fascista. Como isso se dará está aos poucos se configurando a partir do silêncio ensurdecedor das instituições legislativas e judiciárias, de setores de esquerda, progressistas e liberais sociais na sociedade.


Se lograrem êxito nessa empreitada de fechar parlamento e o judiciário, mostrará mais uma vez a imaturidade intelectual e política (de parte da esquerda e a omissão do centro) para analisar a conjuntura e se posicionar do lado certo da história.

Talvez forneça aqui a bifurcação da encruzilhada da história para fazer a correção de rumo, concedendo aos equivocados e/ou desorientados intelectualmente a oportunidade de fazerem a autocrítica pra dentro e se reposicionar do lado certo no tabuleiro de xadrez, cujas jogadas são motivadas estrategicamente pela luta de classe.

Portanto, isso tudo vai depender de nossa capacidade cognitiva de ler os cenários conjunturais e estabelecer a política de mobilização, enfrentamento e impor derrotas a essas forças ultraconservadoras.

Não existe espaço vazio na política, pois só os pusilânimes defendem isso para enganar pessoas ingênuas ou estúpidas que acham que a lei pétrea que gera a constitucionalidade e a protege por meio dos mecanismos sistêmicos legais da República Federativa Brasileira não pode ser modificada ou suprimida a qualquer hora por um presidente de extrema-direita. Ou, na pior das hipóteses, por generais de linha dura das Forças Armadas, viúvas do nazifascismo, inconformados com as políticas sociais e os direitos e garantias fundamentais estabelecidas pelos Direitos Humanos. 

Aliás, só não é possível apenas ao tolo que crê puerilmente que não existe mais nenhuma verdade para além do mundo virtual criado estrategicamente para mantê-lo dentro de sua bolha fascista. Nessa conjuntura da nanopolítica criada para alimentar os bestializados virtuais da bolha fascista, acessível às pessoas imbecilmente despolitizadas, a tese que mais prospera é a de que o combate à corrupção não logrará êxito total senão estender a todas três engrenagens da República, porquanto se vende a ideia de que está controlado no Executivo, alegando que neste lugar o presidente pode resolver porque tem mandato para isso. Noutros casos, nada podem fazer além de observar como essas casas agem “chantageando” desavergonhadamente.

Todavia, não dará conta de ampliar a limpeza para os dois poderes (legislativo e Judiciário) com o nível de radicalidade necessária porque esbarram na autonomia e independência desses poderes, embora sejam harmônicos. 

Se no Executivo isso é tratado superficialmente para mostrar aos bestializados que isso foi resolvido, nos demais poderes a corrupção é tratado como um câncer irreversível que se alastra por todas as instituições constitutivas da República (Legislativo e Judiciário) que precisa ser extirpado para não comprometer ainda mais a sanidade e saúde política do Executivo que está “limpo” dessas doenças disseminadas pelo PT. Essa é a tese do liga para o 190, insinuando a aquela velha conduta orientada para chamar a polícia para prender os verdadeiros inimigos do Brasil, os “ladrões perigosos” protegidos pelo Estatuto da Cidadania ditado pelos Direitos Humanos e suas instituições democráticas leprosas.

Esse é o perigo real que o Brasil sofre, pois essa tese tem eco nos quatro cantos do país e justifica perfeitamente o fechamento e suspensão das atividades das instituições guardiãs da Ordem Constitucional brasileira de 1988 que cria a República Federativa do Brasil, sustentada pelo Estado Democrático de Direito: soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre inciativa e pluralismo político.

Em 2014 numa conversa com dois companheiros ligados ao movimento social e sindical, membros do Movimento Coletivo Ética Socialista (MCOESO), o professor Joilson Bergher (rede estadual e municipal de Brumado) e o professor Luis Rogério (UFBA) eu analisava a possibilidade de um golpe no Brasil via forças Armadas.

Não se trata de considerar apenas o aspecto ético-moral, pois a possibilidade ou não da intervenção das Forças Armadas não está baseada em valores patrióticos ou morais dessas figuras guardiãs do movimento real de reprodução do capital - quer seja nas várias versões capitalistas ou mesmo pós-capitalista.

Naquela conjuntura não estava dado com tanta nitidez como isso se daria, embora houvesse um cenário de crescimento em que o PSDB com a candidatura do Aécio Neves ouviu por uma fresta e vocalizou o reclame daquelas pessoas encurraladas pelo politicamente correto. Essa agenda ultraconservadora perdeu espaço com a pressão dos movimentos sociais para que a institucionalidade do Estado Democrático de Direito pensado pela Constituição de 1988 incorporasse as suas bandeiras históricas de lutas.

E isto foi estimulado pelas narrativas misoginias, xenofóbicas, racistas e de incitação de ódio à classe trabalhadora e aos movimentos sociais pelo candidato Aécio Neves para conseguir polarizar com a candidatura vencedora. Precisava atacar a mulher economista, ex-militante de uma Organização Revolucionária Marxista (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares-VAR-Palmares) durante a ditadura civil-militar (1964-1985) e para isso vocalizou uma narrativa capaz de capitanear esse público e ir ao segundo turno.

A percepção naquele momento mostrava que o movimento para despertar esse segmento politicamente engessado pelas políticas públicas levaria a outro nível de disputa eleitoral. O despertar do “monstro” no inconsciente da população brasileira, pois todos os regimes de opressão contra as populações vulnerabilizadas contaram com o silêncio (por medo ou por ignorância) das mesmas.

E isso acontece porque essas populações são vítimas de um modelo de educação institucional conservadora (bancaria), de baixa qualidade cientifica e técnica, sem perspectiva crítica e/ou sem nenhuma formação política de classe social orgânica a que pertencem. Isso é uma presa fácil para qualquer discurso extremista de direita baseado numa narrativa política pragmática, ufanista e sensacionalista de caráter ultraconservador.

Nesse processo de busca pela hegemonia política de um grupo social que pretendia afirmar a perspectiva macroeconômica conservadora de caráter neoliberal, era necessário um discurso reacionário para organizar e insurgir o movimento de setores conservadores da sociedade. Portanto, Aécio Neves se coloca sem quaisquer receios de repreensão feita pelo filtro social liberal crítico por parte das populações em situação de crescente buscar de formação política capaz de possibilitar a ruptura com subalternização dessas populações e do movimento sindical.

Essa foi à pauta para reorganizar a ala neoconservadora da sociedade “escondida” até as eleições presidenciais em que a Dilma Rousseff se reelegeu.  Precisamos compreender que os governos do PT assimilou parte dessas agendas inaugurais, pautadas pelos movimentos sociais desde os anos 1970 no Brasil se fortaleceram na perspectiva social liberal, obtendo um relativo avanço dessas pautas na política desenvolvimentista (hibrida) desenvolvida pelo PT desde 2002, voltada para ser modulada apenas no Estado de bem Estar Social.

Contudo, devemos observar outro aspecto desse processo que permeia a Política, compreendendo que ele não é formulado na perspectiva das relações sociopolíticas institucionais herdadas e mantidas por esse regime político institucional dos governos do PT. É preciso ir, além disso, para identificar a tendência estruturante do movimento real das forças do Capital operando no sistema capitalista para compreender a totalidade das relações sociopolíticas e direcionar o combate das forças do trabalho e populações subalternizadas na sociedade de classes sociais antagônicas.

Alguns intelectuais orgânicos da classe trabalhadora e dos movimentos sociais emancipacionistas levantaram essa questão e foram totalmente ignorados ou hostilizados pelos governistas e seus teóricos do establishment político. Por mais estúpidos ou ingênuos que sejam a conjuntura atual nos arrastou para a necessidade e retomar os dois conceitos básicos desenvolvidos pela teoria social marxiana (infraestrutura e superestrutura) a partir do materialismo histórico. A atualização no campo da teoria social clássica marxiana pelo filosofo István Mészáros nos remete ao real movimento na sociedade do capital e suas estruturas sociais, através do sociometabolismo do capital.

Mészáros procura analisar a verdadeira natureza do sistema sociometabólico do capital, evidenciando seus elementos constitutivos ao longo de sua existência, permitindo apreender sua própria dinâmica interna. Nesse sentido, o filosofo marxiano nos mostra que as partes que dar início (fundante) ao sistema, na qual institui um aparelho totalizante de organização e controle social, nas versões capitalistas e pós-capitalista estão dadas pelo tripé: Capital, Trabalho e Estado.

Se tal premissa se verifica no campo empírico e se reproduz como representação mental, podemos ampliar o campo de observação do movimento realizado pela superestrutura na reprodução do capital e como ele organiza e controla a sociedade. Isso ocorre de acordo e para atender as necessidades de adequação do Trabalho e do Estado para a reprodução do capital, entendendo aqui tal movimento realizado a infraestrutura na acepção marxiana da abordagem. 

Infelizmente alguns intelectuais de esquerda ao fazer uma análise conjuntural ignorou a perspectiva histórica do movimento geral da sociedade iniciado lá no final dos anos 1960/1970 e sua extensão e desdobramentos. Portanto, perderam a perspectiva analítica marxiana de compreensão da pauta estrutural imposta pelas forças do capital na primeira década do século XXI.

0 comments :

Postar um comentário

Buscar neste blog

Inscreva seu e-mail e receba nossas atualizações:

Arquivo