Translate

Seguidores

terça-feira, 30 de outubro de 2012

FIDELIDADE CONQUISTENSE. FALCÕES E LOBOS É O ARQUIVO

* Por Marcísio Bahia


Falcões e lobos ficam com o mesmo parceiro durante toda a vida. É uma fidelidade do mundo animal não preservada no ser humano que, convencido de ser dotado de "inteligência superior", vê na promiscuidade das relações uma forma normal de lidar com a vida. As relações humanas são múltiplas, desde um simples contato com poucas palavras até as mais complexas, onde nascem cumplicidades responsáveis pela sustentação do próprio meio social em que vivemos. Exemplos como família, sociedade, pátria e companheirismo permeiam a teia de relações, onde os valores morais e éticos funcionam como alicerces perenes. Estamos em ano de eleições municipais e exemplos como o dos falcões e dos lobos bem que serviriam para tocar a consciência da maioria dos membros da classe política partidária, principalmente daqueles que assumem cargos diretivos nas esferas executiva e legislativa. 


O mau costume de virar as costas para quem mais o ajudou no passado está virando regra, principalmente quando o sujeito chega ao topo do poder e não enxerga mal algum, em nome de uma prática fisiologista, distribuir cargos pela conveniência e não pela trajetória histórica dentro do grupo político que o sustentou durante anos, alijando do processo grandes nomes que lapidaram sua trajetória na pedra fundamental da luta por ideais, dedicando tempo e esforço pelas mais nobres causas da sociedade, principalmente por aqueles à margem do processo.

Estimulado pelo amigo e valoroso defensor da decência nas relações humanas de uma forma em geral, Herberson Sonkha, resolvi escrever este texto, retrocedendo exatamente quatro décadas no tempo, quando uma das mais emblemáticas lideranças desta cidade, Jadiel Vieira Matos, conseguiu agregar um grupo de idealistas em torno de sua candidatura, varrendo da Prefeitura Municipal a ultra direita, representante nesta cidade dos governos militares, nos anos negros da Ditadura. Seguia os moldes das esferas estadual e federal no trato com os cidadãos conquistenses, oprimindo todos aqueles que não rezassem na cartilha de ACM, Juracy, dos militares, e da pequena massa que os acompanhava - vale aqui ressaltar que muitos desses seguidores do "carlismo" hoje pousam de esquerdistas, por pura conveniência. 
Ainda garoto, fui um observador privilegiado do movimento político que colocou Conquista na condição de "trincheira oposicionista". Éramos caçados pela PM, quando ousávamos colar cartazes de Jadiel e dos vereadores de oposição nos muros da cidade, sob a fria neblina. As reuniões para se discutir o destino da cidade tinham que ser em locais secretos. Era o tempo do "sabe com quem você está falando"; diretores de escolas repressores, abafando com mãos de ferro qualquer levante do movimento estudantil ou de docentes, usando o expediente da "mordaça", da intimidação escancarada ou velada. Quem sentiu na pele as consequências dos abusos praticados pelo famigerado "rolo compressor", sabe do que estou falando, de um tempo que ficou marcado pela luta por liberdades democráticas e seus algozes. 

Nos Anos de 1970, Vitória da Conquista viveu um período em que a cidade tinha dois pólos distintos. Uma coisa era o ambiente democrático das escolas e repartições públicas municipais, onde a livre expressão saiu da teoria para se tornar uma prática enriquecedora. Na outra ponta, os vassalos do coronelismo político das esferas estadual e federal batiam continência para o poder constituído em Salvador e Brasília, como fantoches manipulados pela garra nefasta do autoritarismo. Com apenas duas opções de convivência, o conquistense viu-se obrigado a escolher o lado da moeda. Era fácil separar o joio do trigo, pois não dava para beijar a mão de Deus e do diabo ao mesmo tempo. Ou se misturava ao "coloio" à direita ou se experimentava o gosto pela liberdade, andando de mãos dadas à esquerda. Tínhamos sonhos e acreditávamos em lideranças que transcendiam a esfera do discurso. Tínhamos lideranças das quais nos orgulhávamos, sem perder de vista o caráter critico de seguidores com vontades próprias. Tão diferente desta "nova" conjuntura política, que mais parece um balaio de gatos pardos, no breu da noite.

Na reta final de mais uma disputa pela Prefeitura ou uma cadeira na Câmara de Vereadores, trago à tona uma questão de uma ordem que já foi tirada da pauta de discussões. Pois bem, ao citar Jadiel Matos chegou à memória todos os elogios que ouvi ao longo da vida àquela equipe de governo abnegada, ética, verdadeiramente comprometida com Vitória da Conquista.O discurso era claro, onde a perseguição dos "homens de estrelas nos ombros" não abafava o grito de liberdade. Muito pelo contrário, tínhamos coragem para enfrentar as situações mais adversas, onde os hipócritas não tinham vez entre nós, sendo colocados nos seus devidos lugares, simples bajuladores do poder, sem odor e nem espaço entre os idealistas. Pois foi esse o grande valor mostrado pelo prefeito caatingueiro, distribuindo funções e montando sua equipe de acordo com a potencialidade e a disposição para o trabalho de cada um e, por isso, ficou marcada na história conquistense como uma "senhora equipe".

A ascensão da esquerda ao poder conquistense teve uma baixa. A ruptura do grupo político no Movimento Democrático Brasileiro local, passando da condição de uníssona força para o cenário de dois grupos políticos rivais, lançando candidaturas distintas para ocupar o Executivo Municipal, na sucessão de Jadiel. Sob minha singela ótica, esse foi o maior erro político partidário desta cidade, que ficou dividida em dois blocos. Era uma forte trincheira de resistência aos desmandos da Ditadura, porém enfraquecida. Com a vitória nas urnas do grupo de José Pedral Sampaio, liderança inquestionável naquela época, o outro grupo foi banido da Prefeitura Municipal, e foi implantada a prática fisiologista que hoje tem raízes profundas dentro do Executivo. 
O exemplo ético de Jadiel Vieira Matos, ao proibir o uso da máquina municipal na campanha do seu candidato e ao se preocupar em fazer esgotamento sanitário no centro da cidade, ao invés de sair borrando as ruas com capas de asfalto, ficou como sinônimo de fracasso político, pois ele não conseguiu emplacar o seu sucessor e ainda teve que engolir a campanha difamatória, em nível pessoal, articulada pelo outro grupo político vitorioso nas eleições de 1976. A massa votante deu uma espécie de autorização para que as práticas nas proximidades dos pleitos fossem baseadas em meios que justificavam os fins, fins que justificavam os meios. E como numa ilha, com sua população alheia aos processos eleitorais, viu-se toda espécie de desmando, de "maracutais" para se manter no poder, acima de qualquer preço, mesmo que isso representasse a morte de ideais nobres. O sujeito que conseguia ficar à frente de uma das pastas de importância estratégica no governo municipal, a exemplo de Administração, Finanças, Saúde ou da Empresa Municipal de Urbanização, tratava de construir a sua carreira política com favores direcionados, utilizando verbas públicas. Basta dar uma olhada em nossa história recente e ver quantos deles se tornaram vereadores e até prefeitos desta confusa capital do sudoeste baiano. Ficamos duas décadas assim, com borras de asfalto e pequenos e grandes favores se tornando sinônimo de enxurrada de votos nas urnas.

O grupo que estava no poder cometeu um erro estratégico ao se aliar ao "carlismo", dando oportunidade para o surgimento de uma nova força política representada por Guilherme Menezes. Seria a chance de Vitória da Conquista reviver a era Jadiel Matos, inclusive muitos dos que apoiavam o então candidato do Partido dos Trabalhadores, advindo do Partido Verde, fizeram parte do governo de 1973. O próprio Jadiel engrossou a fileira como candidato e futuro vereador eleito pelo Partido Socialista Brasileiro. Em torno desta candidatura a vereador, muitos abnegados contribuíram para levar à Câmara aquele mito, adorado principalmente pelo homem do campo. Se bem que ali estava apenas a sombra daquele grande homem que revolucionou a história política nesta cidade, porém foi o vereador mais votado da Coligação que conduziu Guilherme Menezes ao seu primeiro mandato, a partir de janeiro de 1997. Enfim, o resultado daquela eleição acendeu a esperança de que a cidade retomasse o sentido exato de sua importância como pólo de grandes ideias, surgimento de novas lideranças, espaço para os intelectuais e mentes brilhantes no ambiente público.

Seria um tolo se afirmasse que não foram muitas conquistas articuladas por esse grupo político que governa a cidade por 16 anos, porém, por sentir na pele e por ver de perto os desmandos gerados pelo fisiologismo político, posso afirmar que o maior erro cometido pelo líder Guilherme Menezes foi, por força de composições que o mantivessem no poder, montar equipes de governo principalmente sob a ótica do toma lá da cá partidário, esquecendo de muitos companheiros que deram "sangue" pela causa, enfrentando as forças reacionárias deste Estado e deste País. Líderes sociais, estudantis, culturais e verdadeiros "heróis da resistência" colocados para "escanteio", sendo obrigados a assistir a ascensão de bajuladores que visaram e visam apenas o poder pelo poder, o famoso "Venha a Nós". É obvio que não estou falando da totalidade, pois muitas competências foram colocadas à prova e se saíram muito bem em suas funções, enaltecendo a "labuta" com a coisa pública, contudo fica o alerta para quem está no topo do poder municipal, como esteve Pedral Sampaio no passado não muito distante: - Ninguém, mas ninguém mesmo, por si só e tão somente, é capaz de se sustentar no topo infinitamente. Dar as costas para os que realmente são os seus aliados é um pecado capital, pois aqueles que o bajulam hoje, pelo simples fato de visar as "benécias" do poder, serão os primeiros a lhe dar as costas, assim como fizeram com lideranças passadas. São folhas secas ao sabor do vento, que não fincam raízes no solo e se perdem em meio à tempestade.

0 comments :

Postar um comentário

Buscar neste blog

por autor(a)

Arquivo

Inscreva seu e-mail e receba nossas atualizações: