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segunda-feira, 9 de julho de 2018
A necessária formação política das populações negras no Brasil
julho 09, 2018
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por
Vinícius...
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“As múltiplas desigualdades calcificaram formas de vida atrozes e desumanamente humilhantes." |
Nenhum pais do continente africano banhando pelas costas marítimas[2]passou desapercebido da sanguinária colonização praticada pela fúria ultramarina portuguesa. A lista quilométrica de crimes é imprescritível: sequestros, estupros, correntes, fome, pestes, cativeiro e toda a sorte de violência. Apesar disso, a investida ultramarina foi abençoadíssima pela Santa Igreja Católica Apostólica Romana e indiferente para os revolucionários burgueses pensadores da época.
Essa cultura da destruição de reinos africanos começou lá em 1415 com a conquista de Ceuta e terminou em 1999 com a entrega de Macau. Embora alguns historiados estudiosos afirmem que o fim dessas atividades ultramarinas só tenha ultimado em 2002, com a concessão da soberania ao Timor-Leste.
Essa sanha esganiçada pelo recém-criado promissor mercado mundial, nunca teve nenhuma crise moral em assumir publicamente seu principal negócio, o comércio de humanos, excepcionalmente as populações negras insuladas da África. O mercado de carnes negras vivas foi mantido e justificado pelas ciências positivistas modernas, fundamental para consolidação do processo civilizatório burguês.
O império Colonial Português, o mais antigo dos impérios de colonização da Europa moderna, espalhou-se para mais de 50 nações no mundo. Essa potência imperialista, abriu e interligou inúmeros portos, para o florescimento de uma economia liberal moderna, exercida por mercadores eficientes, teoricamente justificados por uma ciência moderna eurocêntrica de berço liberal. A fé inconteste na promessa do progresso promovido pela ciência, que libertaria o mundo da decadência material e intelectual, a transformou numa nova religião: da eficiência.
Não menos implacável com a riquíssima cultura de um povo cuja ancestralidade remonta milênios de tradição dos griôs, anciões responsáveis pela difusão de seus saberes milenares por meio da oralidade. Essa memória coletiva de tradição africana atravessou os tempos durante milênios transmitindo o conhecimento de cálculos e geometria, essenciais para a moderna matemática.
Arrancados dos berços familiares e separados de suas terras para evitar o reagrupamento de núcleos familiares, essas populações foram varridas a ferro e fogo de seu continente natal. Diversas populações trazidas cativas nos porões fétidos, acorrentados/as nus/nuas pelos pés-mãos-pescoço, num ambiente escuro e insalubre, passando frio e calor ao extremo, consumindo viveres podres e pouca oxigenação dos navios para serem indigentes e força de trabalho escravo na América.
O título concedido pela nobreza feudal, que dá status socioeconômico ao portador do título, está visceralmente ligado a propriedade da terra. A terra é a principal fonte de riqueza para o sistema feudal, essa separação homem-terra significava a ruina pauperização e a indigência das pessoas. Esse período de expansão ultramarina está articulado a outro momento histórico fundamental para o capitalismo, a fase da acumulação primitiva do capital, que Marx chamada de “A lei geral da acumulação primitiva”[3].
Nessa obra, Karl Marx vai desvendar (desnaturalizar) a origem da formação da riqueza da nova classe social, a burguesia. Ele explica como se deu o processo de acumulação de riqueza no modo de produção capitalista, no qual houve a expropriação sanguinária de terras, ferramentas e matéria prima para forçar os pequenos aldeões a ceder a exploração dos capitalistas donos das fabricas recém-criadas nas cidades. A força de trabalho era a única coisa que lhes restaram para manter miseravelmente a sua sobrevivência.
“O quanto a questão da terra foi central para o desenvolvimento da acumulação primitiva, assim como, a expulsão dos camponeses das suas terras e expropriação destas. Isso forneceu ao capitalismo, segundo Marx “o campo para a agricultura capitalista, incorporaram as terras ao capital e proporcionaram à indústria das cidades a oferta necessária de proletários sem direito” (2013, p.855). O que significa também a pauperização da população.” (CRUZ, 2013)
Com a África a cosia foi tragicamente perversa. Pois, os seus filhos foram roubados de seus pais, os maridos de suas esposas, os velhos assassinados e suas casas queimadas. Foram vendidos como mercadoria para outro continente estranhamente diferente. Sem família, sem pátria, sem dinheiro, sem instrução técnica para viver na moderna sociedade do trabalho.
Sem o conhecimento da língua do novo país, restou apenas insurgir-se contra seus “donos” e construir um arquétipo de suas aldeias na África nos confins do Brasil, denominada de quilombo. Espaço que permitiu manter a prática da religião materna em sua língua nativa. Uma forma de cultivar a memória para não perder totalmente sua identidade e a ligação cm a ancestralidade oriunda de sua terra natal. Portanto, essas populações no Brasil passaram a viver a mais perversa situação de pobreza, miséria e sofrimento. Aliás, uma cortina ideológica invisibilizando essa situação criminosa até nossos dias atuais.
A pobreza é resultado desse modelo de sociedade capitalista, baseada na exploração e opressão da maioria pela minoria detentora do poder político e do capital. A colonização ultramarina eurocêntrica surge no renascimento cultural e cientifico da baixa idade média (séculos XV e XVI). Tornou-se um elemento de dominação, sem a qual nenhuma outra civilização teria valor. Portanto, sem a resistência a essa avalanche de aculturação não se obterá sucesso, caso não consigamos salvaguardar o vasto conhecimento sobre os primórdios do berço da primeira civilização: a Mãe África.
Pincipalmente os valores históricos de uma época, de uma região, de qualquer país ou mesmo do continente Africano. Resgatar, preservar e promover é único caminho capaz de se opor ao processo hegemônico civilizatório destrutível, instituído pela força do capital imperialista, liderado mundialmente pelas elites brancas burguesas.
Nenhuma população remanescente da África, será respeitada senão for preservado os aspectos fundantes presentes em suas especificidades intelectuais, culturais, religioso, artísticas, moral e material. Esses aspectos estão em permanente desconstrução desde a formação de um mercado mundial criado pelos colonizadores europeus, sob o pretexto da “natural” expansão ultramarina europeia dos séculos XV e XVI, na qual a escravidão moderna foi justificada como saída da crise econômica da Europa.
Essa forma de poder político tem no Estado um gestor de privilégios para minoria parasita que vive da exploração da força de trabalho das classes trabalhadoras (negra também) e da opressão sanguinária às populações negras desempregadas, imputando a essas populações às mais perversas situações de vida.
O racismo estrutural impôs ao Estado liberal burguês, por meio de governos conservadores (de viés fascista), as seletivas escolhas pelos opressores, em detrimento da urgente política de proteção e promoção de nossas populações negras pedinchadas em terras brasileiras. A situação de privação econômica, social e política das populações negras no Brasil criou uma massa de famintos desnutridos, subsistindo nos bairros periféricos, comunidades tradicionais de matriz africana, circunscritos em suas territorialidades e uma geoespacialidade pauperizada e violenta.
A eugenia social feita pelo braço armado do Estado, aponta a nova rota do extermínio tendo como alvo os jovens negros, mulheres, homo afetivo e os pobres periféricos. Essa é a versão contemporânea da limpeza social feita nas cidades de médio e grande porte. Compreender que esse processo de racialização é socioeconômico e político faz parte da necessidade de emancipação dessas populações.
Neste sentido, exige-se das populações (camponesa e urbana) afrodescendentes na contemporaneidade à urgente organização/mobilização política para enfrentar as degradantes condições socioeconômica e política em que vive nosso povo negro no Brasil. As múltiplas desigualdades calcificaram formas de vidas atrozes e desumanamente humilhantes. Longe de ser um processo natural como propõe o liberalismo econômico do século XVIII, antes consequências de um tipo de sociabilidade protegido por condomínios de poder pautado pelo racismo estrutural.
[1] Herberson Sonkha é professor de cursinhos em Vitória da Conquista. Estudante de Ciências Econômicas na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Foi gestor administrativo lotado no Hospital de Base de Vitória da Conquista. Foi do Comitê Gestor da Secretaria Municipal de Educação de Anagé. Presidiu o Conselho Municipal de Educação de Anagé. Coordenou o Programa Municipal Mais Educação e a Promoção da Igualdade Racial do município de Anagé. Foi Vice-Bahia da União Brasileira de Estudante (UBES) e Coordenador de Cultura da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de Vitória da Conquista (UMES). Militante e ex-dirigente nacional de Finanças e Relações Institucionais e Internacional dos Agentes de Pastorais Negros/Negras do Brasil. Membro dirigente do Coletivo Ética Socialista (COESO) organização radical de esquerda do Partido dos Trabalhadores.
[2] Norte: Mar Mediterrâneo; Nordeste: Mar Vermelho; Leste: Oceano Indico; Sul e Oeste: Oceano Atlântico
[3] MARX, KARL. A chamada acumulação primitiva. MARX, Karl. O Capital: para a crítica da economia política. Livro I, volume II, RJ: Civilização Brasileira, 2013. p. 833-885.
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