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sábado, 4 de agosto de 2018

30 anos de SIMMP: “Declare guerra aos que fingem te amar”



por Herberson Sonkha[1]

O Sindicato do Magistério Municipal Público de Vitória da Conquista (SIMMP) ao completar seus 30 anos de caminhada assume exemplarmente o comando de uma das mais importantes greves já realizadas, que já duram 15 dias. Mesmo com ameaças de punições explicitas aos grevistas, a greve segue firme contra o atual governo que insiste em promover o desmonte das políticas públicas de educação; contra a prática perseguições e intimidações aos grevistas; contra a precarização das relações de trabalho; contra o assalariamento dos profissionais da educação e; contra o retorno ao contrato para serviços análogos à atividade escrava.


O SIMMP tem consciência de que sindicato não é partido político, portanto seus objetivos e finalidades são outros diferentes do que tradicionalmente pensam aqueles que limitam erroneamente a entidade à tarefa de defender apenas os interesses salariais da categoria. Independente de qual seja o governo, impõe-se a tarefa de enfrentar sem vacilos quaisquer medidas socioeconômicas e política governamental que possa afetar os interesses da categoria no primeiro momento, posteriormente as demais classes trabalhadoras e populações em situação de múltiplas vulnerabilidades.

Mas, infelizmente em 2016 ignorou que existem muitos interesses difusos na sociedade burguesa garantida pelo Estado, cujas consequências danosas desses interesses nem sempre são compreendidos (e por isso só são sentidas depois) com antecedência pela população em geral e que não são restritivos a determinada categoria. Disse sim para as peças publicitárias mentirosas do radialista do MDB golpista e vive um dos mais dramáticos momentos para os servidores públicos municipais, não menos diferente para a cidade. Estamos há quase dois anos de gestão e o município amarga derrotas na manutenção de suas principais conquistas socioeconômicas e políticas.

Por exemplo, o financiamento com dinheiro público de um conjunto de interesses das classes trabalhadoras e populações subalternizadas, que deve ser mediado pelo governo em favor dos pauperizados, ao invés disso favorece aos interesses do capital: educação, saúde, desenvolvimento social, meio ambiente, transporte público, moradia, lazer e cultura.

Esse governo atual, que financia os interesses privados da burguesia com dinheiro público, não dar nenhum outro motivo ao sindicato que não seja ir à luta. Até porque o fim da contribuição sindical obrigatória não deixa margem para gastança festiva, pelo contrário, exige uma postura política classista e ideologicamente combativa. Ao invés de conciliação de classes, adotou como mantra a canção do barão Vermelho “Declare guerra aos que fingem te amar”, transformou o sindicato em caserna e as numerosas assembleias em infantaria que abriu fogo das trincheiras de lutas contra o inimigo comum da categoria: o carrasco guizot dos servidores e dos próprios eleitores conquistenses.

A fúria generalizada da categoria visa destruir o traidor fingido das classes trabalhadoras que vem desrespeitando os direitos civis e destruindo as políticas públicas de proteção e promoção da população conquistense. Assim, a categoria reassume a posição de vanguarda no combate sistemático das velhas práticas atrasadas de gestão pública, aliás, a maior parte delas já superada nesses 20 anos.

No geral, o histórico do SIMMP no movimento sindical conquistense, é respeitável e tem experiência suficiente para não vacilar na hora de colocar o dedo na ferida. Esse sindicato tem uma base numerosamente forte e disposta a fazer o enfrentamento político.

Ao longo de três décadas de existência, o SIMMP acumulou força motriz suficiente para conquistar avanços importantes para a categoria e contribuir para alavancar movimentos sociais de mudanças profundas no município. Essas conquistas seriam impensáveis caso o sindicato se mantivesse emudecido e não promovesse formação política crítica; várias greves e paralizações; o fortalecimento político da categoria; o combate sistemático ao assalariamento e a perseguição política aos sindicalizados e seus dirigentes.

O SIMMP que há décadas avançava nas pautas históricas de lutas das classes trabalhadoras, discutidas amplamente pela docência, acumulou conhecimento teórico e consolidou uma práxis pedagógica emancipacionista. Tudo isso foi interrompido pela mudança de direção. Isso fez com que o debate conceitual sobre a natureza da política pedagógica emancipada da categoria com a sociedade fosse reduzida apenas as campanhas salariais ou as tentativas partidárias de desmoralização da antiga administração para favorecer a agenda da direita conservadora fora do cenário político desde o final do século XX.

Esses equívocos trouxeram de volta todo o lixo da história, políticos tradicionais das forças reacionárias oriundas das elites oligárquicas conquistense duramente combatida pelas forças democráticas desde os anos de chumbo da ditadura civil-militar. Depois de 6 de maio de 1964, quando o então prefeito José Fernandes Pedral Sampaio eleito pelo Partido Democrata Cristão (PDC) foi preso pelas suas ligações com Waldir Pires então consultor-geral da República com João Goulart.

De maio de 1964 a janeiro de 1973, Vitória da Conquista foi governada pelos interventores da Aliança Renovadora nacional (ARENA), legítimos representantes da linhagem oligárquicas cafeeiras, membros das elites de sustentação ao golpe militar, sendo interrompido em 1973 com a eleição de Jadiel Matos a prefeito pelo MDB. Desde então a cidade passou a ser trincheira de oposição ao tradicionalismo político, ligado ao campo democrático. Contudo, a gestão do PSB do prefeito Murilo Mármore (1989-1983) e a última gestão do PMDB do prefeito José Pedral Sampaio (1993-1997) adotaram posturas de retrocesso administrativo com o realinhamento político às forças conservadoras, principalmente ao carlismo.

Essa conjuntura de retrocesso em governos do campo democrático abriu espaço para um período de 20 anos (janeiro de 1997 a janeiro de 2017) de governos democrático populares do PT. Surgido na gestão do prefeito Hélio Ribeiro (1987 a 1988) o SIMMP constrói uma intensa luta política de orientação ideológica à esquerda, enfrentando mazelas e perseguições no governo de Murilo Mármore e do próprio José Pedral derrotado pela “[...] insatisfação com a administração municipal, entre 1992 e 1996, também provocou grande mobilização da categoria, fato que foi determinante para a derrota do candidato da situação.” (SIMMP, 2018) [2].

Se a década de noventa é marcada pelo intenso enfrentamento por meio de greves e paralizações contra a situação de degradação moral e material dos professores, esse período mostra a força da categoria que lutava contra o “Atraso e rebaixamento de salário, estrutura precária das escolas, problemas com a merenda e o transporte escolar eram algumas das questões que evidenciavam o desinteresse do governo pela qualidade da educação” (SIMMP, 2018)[3].

A direção sindical da primeira década do século XXI manteve-se ligada politicamente a forças do PT, contudo a base estava dividida e travaram-se inúmeras disputas internas porque o sindicato se transformou no alvo das forças conservadoras para enfrentar o governo do Partido dos Trabalhadores. Ao mesmo tempo em que o governo também disputava espaço para evitar boicotes e desgastes públicos em função da força, representatividade política do SIMMP e o respeito da categoria.

Os movimentos de enfrentamento ao próprio governo vão ser marcados por essas divergências internas até uma coalização de forças que garantiu a professora Geanne Oliveira o cargo de presidente, mudando radicalmente a orientação sindical. Apesar do discurso ”convincente” de autonomia e independência para garantir assegura que o sindicato não fosse instrumentalizado pelo governo, percebe-se que a estratégia era de usar a força do sindicato para derrotar eleitoralmente o governo. Naquela conjuntura complexa de desgastes natural de 20 anos da gestão e um marketing agressivo da burguesia na mídia golpista contra o PT, até mesmo para o olhar mais cuidadoso pareceu sensato tal estratégia. Contudo, a prática do atual gestor confirma a tese de golpe na categoria e estelionato político eleitoral.

Neste sentido, décadas de intensas lutas que mostrava relativos avanços da categoria acabou retrocedendo a hostil década 90, em que se lutava primariamente para resolver questões relacionadas às “[...]vagas eram ocupadas por contratados; o curso de licenciatura para os docentes da rede; o cumprimento parcial da lei 11.738/2008, do Piso Nacional do Magistério, dentre outros.” (SIMMP, 2018)[4].

O cumprimento da lei do piso e manter o debate acerca dos avanços sobre o conjunto de leis que regram a educação básica; sobre financiamento público da educação do campo e da cidade; fim da jornada de trabalho extenuante; melhores condições de trabalho; saúde do trabalhador; remuneração compatível com as condições dignas de vida; fim da opressão e perseguição política aos profissionais da educação.

Essas conquistas se devem também a participação ativa da entidade nos principais movimentos da sociedade conquistense que promoveram saltos extraordinariamente progressistas na cidade e na qualidade vida das pessoas, particularmente na educação municipal. Como os movimentos históricos são feitos por forças políticas datadas no tempo-espaço e refletem as contradições que envolvem todas as dimensões de dada conjuntura, seria absolutamente anacrônico avaliar cada período histórico como único, desconsiderando os processos cíclicos e sua dinâmica dialeticamente constituída por avanços e retrocessos.

Por essa razão é que se deve examinar criticamente cada ciclo, compreendendo que os avanços e retrocessos são partes integrantes da mesma realidade. Os retrocessos que decorrem dos equívocos cometidos por determinada força com maior expressividade eleitoral que o conduz ao comando institucional da cidade, deve ser combatido sistematicamente, pois suas consequências afetam a categoria, a exemplo do que está acontecendo neste exato momento que vem afetando a vida material e intelectual dos/as profissionais da educação com graves consequências econômica, social e política para a categoria.

O histórico da entidade é pautado pela consciência de classe trabalhadora, assinalada inexoravelmente pela posição política crítica em todos os espaços de participação sindical e popular. Essa construção respeitável possibilitou grandes realizações com destacada participação da categoria na discussão coletiva que definiram no rumo político de Vitória da Conquista. Essa caminhada é marcada por inúmeras lutas sociais em defesa da docência. Um sindicato forte, desvinculado ideologicamente das forças conservadoras e solidário as lutas das classes trabalhadoras e contra a opressão das classes dominantes conquistenses.

Qual a história deve ser contada às próximas gerações? A das grandes manifestações feitas coletivamente em defesa de direitos da categoria; do sistemático combate político a todo e qualquer governo impopular que descumpra as leis trabalhistas; desrespeitem a qualidade de vida dos trabalhadores; negligenciem as condições de trabalho da categoria? Ou a da trágica defecção política cometida por uma fração da direção sindical golpista que aparelhou o sindicato contra a própria classe trabalhadora para servir apenas aos seus próprios interesses?

Para responder a essas perguntas cruciais é preciso dialogar com a história do sindicato, enquanto representação das classes trabalhadoras na sociedade burguesa. Existe uma história que justifica a grandeza desse sindicato, mas também revela os descaminhos dos últimos anos da direção sindical e das ações irrefletidas de grande parte da categoria que influenciou desastrosamente nos destinos da cidade.

O ambiente que forjou o SIMMP é o chão da história, mesmo com avanços e retrocessos mudou efetivamente a vida da população. Ignorar isso levou líderes sindicais a cometer anacronismo em suas analises ou puritanismo que no jargão da política significa inocente útil espreitado pelas forças conservadoras do atraso.

O registro do Sindicato do Magistério Municipal Público de Vitória da Conquista (SIMMP) diz que ele nasceu em 20 de outubro de 1989, a ascensão da sexta republica e a queda do estado de exceção sob a vigência dos sanguinários torturadores egressos do golpe que gerou a ditadura civil-militar. Lutou contra o pior gestor da história de Vitória da Conquista para os servidores públicos municipais, a do psdebista Carlos Murilo Pimentel Mármore (1983-1987).

Contudo, os arquivos históricos da entidade dão conta de sua criação no pagar das luzes da quinta república, em 4 de setembro de 1987, no governo do pmdebista Hélio Ribeiro Santos (1987-1988) período que se proibia as classes trabalhadoras (público ou privado) organizarem em sindicato, portanto surge ainda na clandestinidade, em 4 de setembro de 1987.

Vitória da Conquista sempre foi trincheira da discussão acerca da radicalização da liberdade democrática, espaço liderados por socialistas e comunistas de tradição ante-carlista. Exatamente por isso a cidade ainda sentia o mal-estar da ressaca causada pela derrota da emenda constitucional em 1984, defendida pelo movimento civil pelas Diretas Já.

Os filhotes da ditadura rejeitaram no Congresso Nacional as eleições presidenciais diretas (1983-1984), mas perderam as eleições do Colégio Eleitoral para Tancredo Neves em 1985, enterrando a ditadura civil-militar e abrindo o caminho para a nova Constituição Federal aprovada em 1989.

A orientação ideológica conservadora do governo federal para a educação municipal vem desde Orlando leite, Fernando Spínola e Nilton Gonçalves (ARENA), interrompida pelo prefeito Jadiel Matos, retomada pelas duas décadas de gestão do campo democrático que ruiu a cultura de participação política progressista.

Grande parte da população docente estava descontente nos anos 80, mesmo amordaçada pela polícia participava intensamente da militância no magistério público que absorvia o oxigênio produzido pelos grandes debates feitos pela militância de esquerda sobre a necessidade de liberdade de expressão e restituição dos direitos civis cerceados pelos militares. Nesse ambiente de intensa fervência política nasce o sindicato do magistério público no município com mais de 100 professores municipais filiados à Associação do Magistério Municipal de Vitória da Conquista (AMM/VC).

O cenário político de Vitória da Conquistense na criação do SIMMP não diferente muito dos tempos atuais, a exemplo da volta das condições de trabalho análoga à de escravidão (Art. 1º, inciso IV, alínea ‘a’, “a submissão do trabalhador a trabalho exigido sob ameaça de punição, com uso de coação, realizado de maneira involuntária.”) conforme a Portaria MTB Nº 1129 DE 13/10/2017.

Aliás, como descreve a década de noventa no histórico do SIMMP, “Atraso e rebaixamento de salário, estrutura precária das escolas, problemas com a merenda e o transporte escolar eram algumas das questões que evidenciavam o desinteresse do governo pela qualidade da educação”. Esse cenário atual se diferencia daquele período pela profunda crise ideológica ou cooptação à direita.

Tarefa política da categoria é dar sustentação política a direção sindical. Mobilizar a categoria para enfrentar o desmonte do serviço público. Impedir a entrega das conquistas socioeconômica políticas aos interesses privados. Barrar a sangria desatada de recursos financeiros, transferidos para as elites falida e sanguessuga do dinheiro público.  Fiscalizar a execução orçamentária para conter alocação de recursos destinados aos servidores e as populações vulnerabilizadas. Combater o subjugo dos contras as classes trabalhadoras que por falta de oferta de emprego, aceita contratos que os obrigam ao trabalho análogo a escravidão. Garantir a aprovação urgente do plano de carreira aos profissionais da educação. Essa é a tarefa política que a direção e a base juntas jamais devem descuidar.

____________________________
[1] Herberson Sonkha é professor de cursinhos em Vitória da Conquista. Estudante de Ciências Econômicas na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Foi gestor administrativo lotado no Hospital de Base de Vitória da Conquista. Foi do Comitê Gestor da Secretaria Municipal de Educação de Anagé. Presidiu o Conselho Municipal de Educação de Anagé. Coordenou o Programa Municipal Mais Educação e a Promoção da Igualdade Racial do município de Anagé. Foi Vice-Bahia da União Brasileira de Estudante (UBES) e Coordenador de Cultura da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de Vitória da Conquista (UMES). Militante e ex-dirigente nacional de Finanças e Relações Institucionais e Internacional dos Agentes de Pastorais Negros/Negras do Brasil. Membro dirigente do Coletivo Ética Socialista (COESO) organização radical de esquerda do Partido dos Trabalhadores.

[2] Acesso em 04/08/2018 ao site: http://simmp.com.br/historia/

[3] idem.

[4] idem.

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