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segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

RACISMO: um tema recorrente na USP!

Herberson Sonkha militante do Movimento Negros,
militante do Agentes de Pastorais Negros/ Negras do Brasil
 
 
"Portanto, a opção ideológica liberal das universidades contribui para definir a própria natureza socioeconômica e política de determinados cursos que os tornam tradicionais e exclusivamente voltados para atender as tendências de mercado, vendendo a ideia de ‘ascensão socioeconômica’ aos seus educandos e educandas."
 
Por Herberson Sonkha
 

O perfil de estudantes aprovados em cursos de ciências sociais aplicadas (administração, economia, contábeis e direito e etc.) não é selecionado por meritocracia, como pretende os defensores da tese “estude e passe”. Aliás, como se isso fosse naturalmente sequencial ao término do ensino médio. Para milhões de jovens brasileiros, existem gargalos seletivos criados pelas condições objetivas e subjetivas, que determinam seu lugar e suas formas de vida em sociedade baseado nas mais desiguais condições socioeconômicas e políticas no Brasil.


As universidades públicas atendem, em parte, o preceito da LDB (lei nº 9.394/96), segundo a qual diz no seu Art. 2º, “A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” (o grifo é meu). Aqui se estabelece politicamente o que lhe é conveniente atender...

Sublinhei exatamente aquilo que representa o gargalo para milhões de brasileiro (trabalhadores formais/informais, desempregados e autônomos), pois tais expressões como “princípios de liberdade”, “exercício de cidadania” e “qualificação para o trabalho” são expressões forjadas ideologicamente pela matriz liberal. Sua aplicação na sociedade burguesa pressupõe valores questionáveis por estabelecer igualdade na forma, mas mistifica suas condições de desigualdades socioeconômica e política em sua essência.

Neste sentido, retomo aqui o debate sobre as contradições entre ‘forma e conteúdo’ operado pelo direito positivista, presente nesta lei neoliberal (atualização do liberalismo) que permeou todas as discussões realizadas pelos diversos atores acadêmicos nas universidades públicas brasileiras nos anos 90, que posicionam criticamente contra este golpe de Darci Ribeiro (LDB 9.396/96), em substituição ao substitutivo do senador Sid Saboia. Assim, a crítica ao liberalismo enquanto valor formal supremo que esconde (o que não explica mistifica) as condições objetivas que estabelecem as desigualdades como elemento constitutivo de sua essência. 

O terceiro artigo define as bases que orienta a práxis pedagógica fundamentada em princípios predeterminados no artigo anterior (Art. 2º) que dá sentido ao papel da universidade no Brasil. Em tese são 12 princípios que deveria se articular para garantir que problemas com este na USP fossem evitados.

Como o direito liberal burguês em suas atualizações (neoliberal e ultraliberal) mantém os princípios fundantes da sociedade burguesa, observamos que após quase 20 anos de sua promulgação, percebemos que só o item XI – (“vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais”) de forma parcial porque “as práticas sociais” nunca foram bem definidas, foi priorizada quase que absolutamente a inserção destes educandos no mercado de trabalho, objetivando somente a “formação” para o mercado de trabalho (tecnocratas e não cientistas), em detrimento de itens importantes como I (igualdade de condições para o acesso e permanência na escola) e principalmente o item XII (consideração com a diversidade étnico-racial).

Portanto, a opção ideológica liberal das universidades contribui para definir a própria natureza socioeconômica e política de determinados cursos que os tornam tradicionais e exclusivamente voltados para atender as tendências de mercado, vendendo a ideia de ‘ascensão socioeconômica’ aos seus educandos e educandas. Por outro lado, pouquíssimos colegiados e departamentos fogem a esta regra, permanecendo na mesma linha ideológica de reitorados liberais.

No que pese saber que a LDB também acene para outras possibilidades para além da exclusiva inserção no mercado de trabalho ou pesquisas voltadas ao aprimoramento (extração de mais valia) da produção e circulação de mercadorias (bens e serviços), não há uma tradição pedagógica nos cursos de bacharelado da produção (ensino, pesquisa e extensão) que leve em consideração as tais práticas sociais pautadas por temas (que não são transversais) estruturantes como as questões étnico raciais, gênero e orientação sexual. No máximo, uma ou outra monografia que apresenta discricionariamente um determinado “fato social” de formal brilhante, mas que não aprofundar o mérito do tema, portanto, de em passant.

Por último, observo neste debate ocorrido na USP, particularmente na FEA, nesta perspectiva aqui apresentada, que a logica liberal adotada pela reitoria da tradicional a aristocrática Universidade de São Paulo é a principal responsável por este quadro de flagrante racismo, na contramão do movimento de reitores ocorrido nacionalmente que demonstra que das 59 universidades federais em território brasileiro, 25 tem, à sua maneira, cotas raciais. As universidades estaduais, com algumas exceções, a exemplo àquelas que lideram grandes movimentos sociais de ruptura deste modelo (docência, discentes, técnicos e cientistas), dentro da academia, os resultados alcançados após adoção mecanismos reparatórios destas desigualdades criadas pelo modelo de sociedade capitalista, baseada no homem branco, patriarcal, machista e heterocentrista.

A política de cotas é um dos mecanismos de reparação destas desigualdades históricas no Brasil. O racismo, o machismo/misoginia, a lesbo-homofobia e xenofobia (e outras formas correlatas de fobia) são mecanismos (muito deles legais) de dominação política que as elites (liberais burguesas) desenvolveram contras estas populações, que foram forçadas à situação de vulnerabilidade socioeconômica e política e mantidas invisibilizadas. A naturalização destas desigualdades foram construídas nestes mais de cinco séculos de dominação. O Estado, por meio de governos liberais (neoliberais), teve papel fundamental na manutenção e ampliação destas desigualdades, por isso consideramos institucional.  

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