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quarta-feira, 29 de março de 2023

KIRIMURÊ: O Lago dos Tupinambás

 

"Capitalismo este que para se sustentar contou na sua maior parte com o trabalho escravo dos negros que foram retirados do continente africano, em um dos maiores processos de diáspora já visto no mundo, negros e negras, adultos e crianças, simples e detentores de títulos de nobreza, que arrancados de sua terra eram trazidos nos Tumbeiros (navios negreiros)."

          

*por Professor M.Sc. Ademar Cirne 

 

No começo de tudo era apenas, KIRIMURÊ, uma grande Bacia que media cerca de 12 léguas de extensão e 6 em Sua maior largura, com um grande ancoradouro que podia receber todas as embarcações do mundo, sua profundidade variava de 200 até mil braças.

No primeiro dia do mês de novembro do ano de 1501, o primeiro grande navio cruzou a Baía para rebatizá-la de Baía de Todos os Santos, tudo leva crer que eram três navios que compunham a esquadra do português Gonçalo Coelho e do florentino Américo Vespúcio.

A viagem tinha como objetivo o reconhecimento das terras ocidentais do Atlântico Sul que se tinha notícias através de relatos de Cabral, para a surpresa de todos a terra se mostrou muito agradável, um Porto, boa área para reabastecimento de víveres e água uma população de fácil convivência. Por aqui ficaram 27 dias e quando saíram levaram dois indígenas, para serem usados na Europa, ensinando aos Tupinambás o sentido da escravidão.

Em seguida a Grande Baía é entregue como Capitania Hereditária ao Senhor Francisco Pereira Coutinho (Rusticao), que tinha esta alcunha pela forma rústica e violenta que tratava os índios tupinambás da grande baía, este ocupa as terras da região em 1534, e faz a fundação da Vila do Pereira, as margens da praia do Porto da Barra.

Mas os maus tratos infligidos pelos colonos aos índios, com a permissão do donatário, além de alguns desentendimentos com um antigo morador da Baía de Todos os Santos, o náufrago, Diogo Alvares Correia (Caramuru), (lá ele), provocou levantes frequentes. No mais violento deles, em 1545, a vila foi arruinada e Coutinho, obrigado a fugir para a capitania de São Jorge dos Ilhéus.

Um ano depois, ao voltar, naufragou próximo à ilha de Itaparica, onde foi preso e devorado pelos tupinambás. Com a morte do donatário Rusticao, a capitania da Bahia reverteu à coroa portuguesa e quatorze anos depois, 1548, a Bahia de Todos os Santos seria escolhida pelo Rei de Portugal para ser a capital do Império português na América.

Coube ao então primeiro Governador Geral do Brasil o Senhor Tomé de Souza, encontrar juntamente com Caramuru o local mais seguro e mais alto da Baía para erguer a fortaleza que se tornaria a mais importante cidade abaixo da Linha do Equador por mais de três séculos.

Aos 46 anos, o militar português, filho ilegítimo de um padre, vinha com imensa responsabilidade: construir uma fortaleza em um povoado destruído por índios e saqueado por franceses e transformar o território coberto por todas as capitanias, então caótico, numa estrutura organizada e lucrativa, a serviço de Portugal. Quando a frota atracou, começava a nascer a primeira cidade do Brasil A história de Tomé de Souza se mistura com a da própria Salvador. Por isso, a data oficial de fundação da capital baiana ficou sendo a mesma da chegada do governador-geral, ou 29 de março de 1549. Ele veio com triplo mandato: capitão da povoação e terras da baía de Todos os Santos, governador-geral da capitania da Bahia e primeiro governador-geral de todas as capitanias e terras do Brasil. (Fonte: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/historia-brasil-biografia-tome-de-souza.phtml)

Para realizar sua importante tarefa, o senhor Tomé de Souza veio para o Brasil bem preparado.  Sua armada reunia três naus (Salvador, Conceição e Ajuda), duas caravelas (Leoa e Rainha), um bergantim (São Roque) e duas outras naus de comércio, para voltarem cheia de Pau Brasil para Portugal.

Acredita-se que o futuro governador geral do Brasil tenha trazido com ele cerca de 500 a mil pessoas, 130 soldados, 90 marinheiros, 70 profissionais (carpinteiros, ferreiros, serradores etc.), funcionários públicos, jesuítas comandados por Manuel da Nóbrega, 500 degredados (Homens que tinham cometido algum tipo de delito em Portugal), e outros peões para o trabalho pesado, além do arquiteto Luís Dias, que trazia em suas mãos a planta da futura capital do império português no Brasil

Tome de Souza trazia também três auxiliares de governo, Provedor Mor que seria responsável pelas finanças o Ouvidor Mor para cuidar da justiça e o Capitão responsável pela defesa e segurança da fortaleza.

O rei dom João III, redigiu em 17 de dezembro de 1548. Com 48 artigos, o regimento de governo, documento que nortearia as ações do primeiro governador do Brasil, deixando claro que a ideia fundamental do novo sistema era acabar com o modelo descentralizador das capitanias hereditárias, centralizando todo poder nas mãos do governador geral, este regimento   determina a fundação da cidade-fortaleza e trata da defesa militar da costa, das relações com os índios, de doações de sesmarias, cobrança dos proventos devidos à corte. "Foi o que alguns chamam de a primeira Constituição do Brasil", segundo o historiador Cid Teixeira.

A partir deste momento tornou-se a Baía um grande Porto de troca de mercadorias, compra e venda de produtos que atravessavam o Atlântico, introduzindo a Baía de Todos os Santos no contexto do capitalismo nascente.

Capitalismo este que para se sustentar contou na sua maior parte com o trabalho escravo dos negros que foram retirados do continente africano, em um dos maiores processos de diáspora já visto no mundo, negros e negras, adultos e crianças, simples e detentores de títulos de nobreza, que arrancados de sua terra eram trazidos nos Tumbeiros (navios negreiros).

 Negros e negras que tiveram exatamente esta cidade, que hoje comemora seus 474 anos de fundada como um dos maiores portos de desembarque de nossos ancestrais, que eram vendidos como peças e levados para os pesados trabalhos nos Engenhos de Cana de Açúcar, nas Minas de Ouro e nas Atividades domésticas, nas cidades do Brasil.

Portanto cabe neste dia fazer uma breve reflexão sobre os fatos e perceber que apesar de todo sofrimento do nossos povo nunca desistimos e foi ao longo desta cidade  , que iniciamos a nossa resistência e garantimos através da luta e da organização nas Senzalas, nos quilombos, nas revoltas urbanas, no Jogo da Capoeira, na Adoração dos nosso Orixás que chegamos até aqui, fortes e com muita disposição para continuar lutando por mais conquista e rompimento das barreiras do Racismo e da intolerância.

 

 

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*Ademar Cirne é Graduado em História pela Universidade Federal da Bahia – UFBA; Especialista em História do Brasil pela UFBA - PUC/MG; Mestre em Ensino das Relações Étnico-Raciais pela Universidade Federal do Sul da Bahia - UFSB; Coordenador do CEN - Coletivo de Entidade Negras e Ogã dd Iemanjá da Casa de Oxumarê.

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