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quinta-feira, 10 de setembro de 2015
IDEOLOGIA E CULTURA COMO FERRAMENTAS PARA A MANUTENÇÃO DA ORDEM DOMINANTE
setembro 10, 2015
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por
Vinícius...
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"À medida que o modelo de desenvolvimento capitalista foi ganhando corpo e se tornando hegemônico em todo o planeta, a classe dominante começa compreender que tudo poderia ser fonte de riquezas, tudo poderia ser transformado em mercadoria, ao mesmo tempo, desenvolvem também a capacidade de utilizar tudo que estivesse nas relações da classe que vive do trabalho contra o próprio trabalhador. "
*por Prof. João Paulo Pereira
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Professor João Paulo |
Mudanças climáticas, escassez de água, crise energética, crise de civilização, um mundo conflitante figura aos nossos olhos inertes, que não conseguem enxergar e compreender a realidade que nos envolve e que a cada dia, parece se fortalecer, com a ação da classe que domina o poder político e econômico no mundo, criando ao bel prazer, uma realidade que de forma alguma serve aos interesses da classe que vive do trabalho por todo o mundo, já sacrificada por séculos de exploração pelo capitalismo. O que tem determinado essa situação de inércia de grande parte da população mundial? Porque, nós os explorados e relegados no processo de acumulação de capital imposto pelo modo de produção capitalista não reagimos?
Correntes do pensamento de esquerda e popular no mundo, durante muitos anos tem debatido a respeito do modo de produção capitalista e sobre os seus efeitos na economia e na política mundial. Entretanto, há um debate que não é feito com tanta ênfase pelos meios acadêmicos e que também não chegam aos movimentos sociais organizados pelo planeta. Este mesmo debate não chega às escolas públicas e particulares no Brasil, não chegam às instituições religiosas e muito menos nas famílias, células de todas as sociedades e que hoje cumpre um papel capital, para a manutenção do “status quo” burguês.
Não que seja privilegio do capitalismo utilizar deste expediente como forma de dominação da sociedade. Durante toda a história da humanidade, parafraseando Marx, “foi à luta de classe que moveu a história”, e neste histórico conflito, os setores dominantes sempre se utilizaram do domínio cultural sobre os dominados, hora pela questão religiosa, hora pela força, hora pelo convencimento filosófico, mas sem o expediente cultural e ideológico, jamais a classe dominada aceitaria a condição de dominada. A diferença é que no modo de produção capitalista, o processo de dominação se tornou muito mais evidente, já que tudo que está ao alcance dos capitalistas se tornou ferramenta de dominação cultural e social.
Durante a Idade Antiga, a dominação passava pela divinização dos governantes, na Idade Média, foi à ideia de predestinação do homem que manteve os explorados passivos ante ao processo de exploração, com o surgimento da burguesia, comerciantes que fizeram riqueza com a chamada “revolução comercial”, e com sua escalada ao poder do Estado, durante a Idade Moderna, as relações políticas, econômicas, sociais e culturais ganham outro contorno. O capitalismo é um modo de produção baseado na exploração do trabalho, o que gera riquezas neste novo mundo é a utilização da mão de obra alheia, desta forma o trabalhador perde a condição de ser humano, para ser uma mercadoria, exposta nas prateleiras do mercado de trabalho.
Ao longo da história do capitalismo a humanidade foi obrigada a ir se adaptando gradativamente às transformações culturais impostas pelo modelo de produção. Inicialmente vivenciamos a fase inferior do capitalismo, revolução comercial, ou “mercantilismo”, onde o poder estava no Estado Absolutista, onde o poder divino dos reis prevalecia sobre a racionalidade burguesa, e culturalmente era essa relação ainda divinal que determinava a aceitação da grande maioria da população ao processo de empobrecimento e a subordinação aos interesses do Estado e da burguesia por trás do Estado Absolutista.
A história europeia vai desenvolvendo e a mesma burguesia que há três séculos trabalhavam para a consolidação da revolução comercial, e do Estado Absoluto, percebe que para que seus interesses continuassem sendo atendidos pelo novo modelo de desenvolvimento capitalista, era necessárias mudanças na estrutura do sistema, essas mudanças, primeiro, vão surgir no campo do pensamento, era fundamental a construção de outra mentalidade social, que atendesse aos novos desafios traçados pela burguesia para continuar acumulando riquezas. Surge então o ILUMINISMO E O LIBERALISMO ECONÔMICO, mudanças filosóficas e econômicas no cenário da história, que paralelas ao nascimento das REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS, colocaram definitivamente a burguesia na direção do Estado Democrático de Direito.
As duas teorias apontadas acima provocaram uma mudança radical na sociedade, foi alimento para as revoluções burguesas na Europa no século XVIII e XIX, na América com as rupturas com a empresa colonial europeia, e ainda hoje, servem de bases estruturantes do modo de produção capitalista. Mas estas teorias filosófica e econômica não atuaram sós na consolidação do modo de produção, não dá para deixar de lembrar que este momento a religiosidade ainda era fundamental nas vidas dos indivíduos e da sociedade e o PROTESTANTISMO, com sua teologia de conformidade com a ordem política e mesmo a CONTRA REFORMA CATÓLICA, a partir do Concílio de Trento, foram determinantes para a montagem de uma cultura teológica de aceitação da ordem social nascente.
À medida que o modelo de desenvolvimento capitalista foi ganhando corpo e se tornando hegemônico em todo o planeta, a classe dominante começa compreender que tudo poderia ser fonte de riquezas, tudo poderia ser transformado em mercadoria, ao mesmo tempo, desenvolvem também a capacidade de utilizar tudo que estivesse nas relações da classe que vive do trabalho contra o próprio trabalhador. Neste momento, a família, a escola, as igrejas e, sobretudo, os meios de comunicação de massa, passam à condição de ferramentas para a difusão da ideologia e da construção de uma cultura política-social, que atendesse aos interesses de manutenção da ordem estabelecida pela burguesia.
Ao falar sobre meios de comunicação de massa, no primeiro momento, séculos XVIII e XIX, pensamos imediatamente na impressa escrita, e depois, no cinema, primeiras expressões de comunicação de massas, em seguida no início do século XX, surge o rádio. Segundo pensadores da Escola de Frankfurt, o advento dos meios de comunicação de massa, criaram uma nova modalidade de produção cultura, a “indústria cultural de massas”, onde a classe dominante, detentora dos meios de comunicação, passa a produzir a cultura a partir da sua visão de mundo, impondo-a radicalmente sobre a sociedade, substituindo as culturas populares e determinando os caminhos a serem seguidos pelos trabalhadores.
A partir do século XX, se tornou um padrão da sociedade capitalista à utilização dos meios de comunicações de massas como principal ferramenta para a construção de uma cultura social a partir da perspectiva daqueles que dominam o sistema econômico e político. Culturas milenares foram aos poucos sendo abandonadas, posto que elementos populares tradicionais sucumbiram aos interesses do mercado, que gradativamente foi transformando tudo em mercadoria. As artes plásticas, a música, as danças, a religiosidade, tradições folclóricas, tudo ganhou valor de mercado, tudo passou a transmitir a ideologia burguesa a serviço dos interesses da classe burguesa.
Desde Getúlio Vargas, tudo em que a burguesia toca se transforma em ferramenta para transmissão de seu pensamento no Brasil. Com Vargas inicia um programa de controle cultural sobre o povo brasileiro. Desde os anos 30 do século passado, que a educação se tornou um canal transmissor do pensamento do regime, onde a burguesia nacionalista brasileira transformou o chefe de Estado, numa figura acima do bem e do mal, acima das classes sociais, era o Populismo, ditando as regras do jogo, até os dias atuais, muitos dos que viveram o momento, bem como a história oficial brasileira, pensam e apresenta o governante como o “pai dos pobres”, mas não foi só a educação do regime, responsável por esta afirmação. É bom lembrar que é neste governo que surge no Brasil, o rádio, e a primeira rádio em cadeia nacional, que divulgava o pensamento do regime para todo o país. No cinema, sobretudo, na Atlântida, empresa cinematográfica do período, o orgulho nacional estava estampado nos filmes, geralmente parodias da cultura norte-americana, elevando a cultura nacional e a defesa da soberania cultural brasileira. Características também percebíveis na produção musical do período.
Por outro lado, a Igreja Católica no mesmo período tomava outro rumo na America Latina, após a publicação da Rerum Novarum e mais tarde com o Concílio Vaticano II, a opção pelos pobres, começa a ganhar destaque na estrutura da Igreja, principalmente ao “sul do equador”, nascia uma nova teologia, voltada para as lutas populares, para superação da pobreza, tanto espiritual, quanto material, movimentos sociais com base na Teologia da Libertação nasceram por toda a America Latina, nasce uma nova ideologia social na Igreja, mudando o jeito de pensar o “ser Cristão”, o que demonstra mais uma vez que a ideologia e a cultura são fundamentais para a construção de uma prerrogativa política para o bem ou para o mal da sociedade.
A carruagem da história continua seu caminho e traz os anos 50, com ele os avanços das tecnologias da comunicação, sobretudo, com o advento da televisão, que muito rapidamente se torna o principal meio de comunicação de massas e com a mesma velocidade a classe burguesa a cada período da história mais hegemônica, passa a utilizar desta nova ferramenta a seu favor. Trataram de universalizar o acesso ao aparelho em tempo muito menor do que o dispensado para a universalização da educação básica. Nota-se que, já na década de 70, o país já tinha uma grande emissora de TV e outras emissoras menores com o objetivo de atender a todas as faixas etárias da população, a todos os níveis de formação educacional, a todas as classes sociais.
A televisão foi pensada pela burguesia brasileira, a partir de um projeto de dominação cultural, a programação obedecia claramente a um padrão, de estimulo ao estilo de vida norte americano, ao advento da sociedade de consumo, a negação de tudo que estivesse de encontro às prerrogativas burguesas de sociedade, a construção de um novo modelo de sociedade onde a família celular e tudo que pudesse consolidar os alicerces de uma sociedade estruturada, justa e humanizada, fossem dilapidadas pelos interesses do capitalismo. É importante ressaltar que a televisão no Brasil é privada, pertence à classe burguesa, as concessões foram distribuídas de forma planejada pela Ditadura Militar aos seus pares políticos, sob-regras claras para a manutenção destas concessões, estão todas, a serviço da classe dominante brasileira, que neste momento do surgimento da TV não era mais a burguesia nacionalista, agora o país estava nas mãos das antigas oligarquias internacionalistas, agora travestidos de burguesia liberal brasileira, sob a direção de militares a serviço dos EUA.
Já na década de 60 surge o exemplo claro que tudo estava a serviço desta burguesia. O Brasil e o mundo vivam uma efervescência cultural, com o rock and roll e o movimento Hippie, o mundo da juventude ganhava novos contornos, já não se aceitavam os velhos padrões morais, determinados pelo capitalismo, à juventude buscava através da música uma nova forma de viver, questionavam a ordem social, instituíam novos padrões de comportamento e de conhecimento da história e do mundo. No Brasil, jovens artistas, universitários, membros da Igreja Católica, colocava em cheque a ordem política vigente no país. Os ventos do “socialismo soviético” sopravam em direção a América Latina, já havia acontecido a Revolução Cubana.
Temendo uma tomada de posição desta nova juventude à esquerda, os norte-americanos, trabalhando em parceria com as burguesias internacionalistas da América Latina, tramaram golpes militares por todo o continente, claro que precisou de uma justificativa ideológica, “a defesa da liberdade, da família, da pátria”, contra a ameaça comunista vinda da Europa oriental. Mas também precisavam consolidar esse discurso para que seu projeto tivesse êxito, nada melhor do que a cultura. No Brasil, logo após a tomada do poder pelos militares, surge a JOVEM GUARDA, movimento musical que tendo o rock and roll, como base, demonstrava certa rebeldia juvenil, emoldurada pela ideologia burguesa, rebelde, mas nem tanto, boa para a juventude de classe média pudesse se rebelar, uso de gírias, roupas joviais constituindo modas, músicas dançantes, mas sem nenhum conteúdo político, para não estimular o questionamento ao regime. O movimento da Jovem Guarda foi estimulado pelas elites para contrapor a movimentos de juventude como o Teatro de Arena e ao CPC, movimentos que seguiam uma tendência mundial de luta por uma nova sociedade que surgia no meio juvenil. A repressão à música brasileira chegou a um estágio tal durante a década de 70, que artistas brasileiros passaram a cantar em Inglês para fugir da regulação da censura militar, somente tinha liberdade para cantar aqueles que defendiam os interesses do sistema.
No final dos anos 60, o Brasil passa a viver o que foi chamado pela história de Gigantismo. A política do Gigantismo foi desenvolvida pela mídia burguesa, leia-se Rede Globo, e os governos militares para desenvolver a ideia de que o Brasil caminhava para um futuro brilhante, já tínhamos o maior estádio de futebol do mundo, a maior estátua do Cristo Ressuscitado do mundo, agora iríamos construir a maior usina hidrelétrica, a estrada que ligava o Oceano Atlântico ao Pacífico, e outras obras consideradas pelo governo militar fundamentais para o desenvolvimento do país, como as usinas nucleares de Angra dos Reis. Mas essa política esquecia-se de dizer que nossa divida externa e interna crescia rapidamente, que a pobreza no país era gigantesca, que a inflação crescia sem controle, que o déficit em moradias aumentava consideravelmente, a qualidade da educação e saúde se deteriorava com o avanço das políticas liberais desenvolvidas pela ditadura.
Para abafar os baixos índices do IDH nacional, surge outra expressão de nossa cultura como acalentador das mágoas, como disfarce para o descaso com o povo, passa-se a utilizar o futebol, expressão máxima da formação cultural do povo brasileiro, que passa a fazer parte do ambiente ideológico das elites, sobretudo, a partir do tri campeonato brasileiro, que coincidentemente aconteceu exatamente no ano em que João Havelange ganhou notoriedade como candidato a direção da FIFA. Desde então, o futebol passa a ser importantíssimo para a manutenção da ordem política, constituindo-se em uma das ferramentas de controle ideológico com maior projeção na sociedade brasileira, em todos os momentos de crise é fácil perceber que o esporte aparece como solução ou problema a ser resolvido. Basta lembrar que enquanto jovens eram torturados, meninas estupradas, militantes assassinados por todo o país, nos porões da ditadura militar, a massa de senso comum, torcia para acontecer o milésimo gol de Pelé no início dos anos 70.
O futebol também passa a fazer parte do ideário de formação cultural do regime, assim como o carnaval, é construído um ambiente cultural, onde o Brasil passava a ser o país do carnaval, das mulatas e do futebol, enquanto, a maioria da população mergulhava na pobreza material e, sobretudo cultural, a televisão assume o lugar dos livros, a leitura perde seu espaço até mesmo nas escolas, os livros didáticos eram classistas e ufanistas, foram criadas disciplinas como OSPB (Organização Social e Política Brasileira), EMC (Educação Moral e Cívica), Educação Para o Lar, com o objetivo claro de difundir através da educação a ideologia do regime político, claro que para que os professores não saíssem da linha determinada pela ditadura havia um patrulhamento intensivo da educação.
Na contramão da história, a Igreja Católica e setores da Igreja Protestante marchavam rumo a Teologia da Libertação, setores do operariado fabril se organizavam em sindicatos livres buscando melhoria da qualidade de vida e de trabalho, sobretudo, no ABCD paulista. Era o início das lutas da classe que vive do trabalho, por um novo país. Desta forma o avanço da burguesia sobre o ambiente cultural se ampliava, o cinema passou a seguir uma linha meramente pornográfica, tendo como base o próprio cinema norte americano, que promovia uma ruptura ideológica com o movimento Hippie, transformando o “Amor Livre” em “sexo livre”.
Na produção literária escritores que tratavam do individual, do esoterismo, romances norte-americanos, fotos novelas, revistas sobre moda e decoração de ambientes, jornais que seguiam os mesmos padrões ideológicos dos jornais televisivos ganharam espaços foram universalizados para a sociedade brasileira. Programas como o de Chacrinha, Programa do Bolinha, que passava uma visão anárquica da vida, foram tirados do ar, o Cinema Novo de Glauber Rocha, perdeu espaço, para o erotismo o “cinema pornochanchada”, que servia aos interesses do capital, deturpando a ideia de amor, superando a perspectiva de relacionamentos saudáveis e humanizados, dando ao sexo um caráter promiscuo e banal. Essa compreensão do mundo e da vida leva a desconstrução da família celular, o que certamente produziria gerações futuras, também desestruturadas, presas fáceis para a ideologia burguesa, um retrato do que assistimos atualmente.
A partir de 1977, a Ditadura começa a perder força, na Igreja Católica, volta a se organizar as Pastorais militantes, CEBs, Pastoral da Juventude, Pastoral Operária, entre outras. No ABCD, se organiza o movimento grevista, lutando por melhores condições de trabalho, a partir dos metalúrgicos e dos trabalhadores de montadoras de carros, militantes partidários de esquerda e centro, por dentro do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), único partido de oposição permitido pela ditadura militar, iniciam lutas pelo fim da ditadura militar e pela anistia política dos exilados brasileiros, pela abertura política e pela redemocratização do país. Uma nova mentalidade política começa a se formar no horizonte do povo brasileiro, sobretudo, da juventude.
Paralelamente a este movimento de retomada da consciência coletiva no país, e diante do enfraquecimento dos “anos de chumbo”, era necessário criar outras formas de dominação, rapidamente às elites internacionalistas brasileira, escoradas na ditadura militar, volta à cena, investindo numa produção cultural para o momento histórico, tomando como base os rumos sociais da história do país. Mundialmente surgia uma efervescência de uma musicalidade voltada para a dança, para festas, os ritmos dançantes norte-americano, ingleses e franceses ganhavam espaços sociais, as danceterias ou discotecas espalhavam por todos os cantos do país, no Brasil esta tendência se fortalecia, sobretudo, após a exibição da novela global, Dancin’ Days, que fez espalhar discotecas pelos mais longínquos cantos do país.
Neste clima festivo no país, a tendência musical era seguir a “onda” do momento, atrair a juventude através da música, dos romances e livros de autoajuda, outra tendência cultural do início dos anos 80 que agradava a juventude era o “esoterismo”, escritores que publicavam nessa linha, era certeza de sucesso, astrologia, numerologia, vidência, tudo se torna apaixonante para essa nova geração de jovens. Ao mesmo tempo em que afastava parte significante desta geração das discussões políticas, econômicas, criava a ideia de felicidade, de uma geração festiva, só para ilustrar isso, o trecho desta canção, mostra bem o que pensava setores significativos da “geração Coca Cola”, “se há uma crise lá fora não foi eu quem fiz, então viver é um lance legal”, apesar de ser uma bela canção, mas retrata bem o que deveria ser ouvido, dançado e curtido pela nova geração de jovens.
Surge um movimento musical em São Paulo e no Rio de Janeiro, seguindo basicamente os padrões ideológicos e culturais da Jovem Guarda uma música para a classe média, estimulante de uma rebeldia juvenil, mas descolada das grandes lutas que a sociedade deveria enfrentar no período de enfraquecimento da ditadura militar no país, é preciso deixar claro, que outros países da América Latina, passavam pelo mesmo processo cultural. Surge no país, uma música destinada a este público, jovens de classe média e filhos das elites dominantes, que certamente ira chegar a todas as camadas sociais no país.
A partir de meados da década de 80, vindo de Brasília, com eco em São Paulo, e na Bahia, o Pop Rock nacional, assume um caráter questionador da realidade social, surge um movimento “Pós-Punk e o Punk”. Na Bahia, a chamada música de trio, ou música baiana, também passa a questionar a realidade social, traz para o debate temas como preconceito racial, preconceito religioso, a questão dos moradores de rua, a pobreza, despertando na juventude, prerrogativas de transformação social, questionando a ordem social estabelecida pela burguesia e apontando para uma nova ordem de justiça social e igualdade.
O resultado desta nova musicalidade foi o crescimento do Partido dos Trabalhadores, e de outros movimentos de esquerda no país, o surgimento de uma juventude militante, a retomada do movimento estudantil, o crescimento da Teologia da Libertação na Igreja Católica, o aumento das pastorais militantes por todo o país, o fortalecimento de movimentos populares a organização das chamadas minorias, que iniciam lutas pontuais contra o preconceito racial, de gênero, pela emancipação das mulheres. Essa tendência politizadora começa a mudar a forma de a juventude ver o mundo, que culminou com a disputa eleitoral de 1989, quando o candidato do PT, mesmo tendo contra si, toda a organização das elites dominantes e da mídia burguesa, conseguiu chegar ao segundo turno, numa disputa apertada contra o candidato da burguesia, perdendo por poucos votos e em função de uma série de armações eleitorais divulgadas pela mídia, com destaque para a Rede Globo, que trabalhou incansavelmente para a eleição do candidato da burguesia.
Mas o processo de construção de uma ideologia capaz de consolidar uma cultura burguesa na história futura do país não tardou em acontecer. Os pensadores da burguesia nacional, percebendo o movimento cultural da sociedade brasileira, inicia um movimento de contracultura à postura libertária crescente no país. Para isso foi necessário resgatar um antigo modelo de produção musical tendo como base a música dos anos 40 e 50, agora com uma roupagem country norte-americana, estilo moderno ditando moda, na forma de vestir, no gosto musical, na forma de ver o mundo, ressurge a música Sertaneja, de 1988 a 2002, várias duplas sertanejas surgiram no país, seguindo a escrita de Chitãozinho e Chororó. Uma música ultrarromântica, estimulante de amores impossíveis, ou paixões não correspondidas, um sofrimento individualizado, descontextualizado das questões sociais coletivas, objetivando a construção de uma mentalidade que buscasse o caminho individualista e a resolução destes problemas seguia o mesmo pressuposto individual.
Outro fator preponderante foi o estimulo ao futebol, agora a partir de uma nova perspectiva, claramente a mídia passou a investir em alguns clubes de futebol, dando um foco maior, mais espaço midiático, produzindo resultados de campeonatos, atraído investimentos para determinados clubes que se tornaram de massa, sendo utilizados como ferramentas ideológicas para os interesses da classe burguesa dominante no país. O mesmo processo também passou a acontecer globalmente, a copa do mundo, deixou de ser disputada por paixão, para ganhar o status de uma mercadoria, servindo aos interesses de patrocinadores e empresários, que passaram a fabricar resultados a partir da necessidade comercial das empresas patrocinadores em comum acordo com a FIFA e Federações de Futebol por todo o mundo.
A conjunção destes fatores culturais determinou uma nova ordem política, econômica e cultural, ideal para a manutenção do status quo das elites pelo mundo o que não era diferente no Brasil. Desta forma a classe dominante brasileira, a partir dos anos 90 do século passado, desenvolveu um projeto cultural e ideológico que ao mesmo tempo em que se tornou um negocio extremante rentável para o mercado fonográfico nacional, e para a nova mercadoria chamada de futebol, servia como ferramenta de dominação social, política e econômica dos trabalhadores. De forma projetada e rigorosamente articulada, a música, os esportes, a televisão, o rádio, o cinema e todo tipo de comunicação de massa, passaram a forma consciências, estabelecer modismos, estilos de vida. As três gerações de juventude, a partir dos anos 80 do século passado, tem sido moldados por este conjunto de ferramentas, que se tornaram o braço forte da classe dominante, que conseguiu nas últimas décadas estabelecer sua ideologia de forma inquestionável na sociedade brasileira, os poucos gritos contrários, são violentamente silenciados. Sem espaço midiático, os bons artistas nacionais sucumbiram aos interesses do mercado, os que resistem são lançados ao ostracismo total, desportistas que ousam se manifestar contra a ordem estabelecida, perdem espaços midiáticos e são isolados ou esquecidos pela grande mídia. Os grandes pensadores nacionais se tornaram desconhecidos do grande público, a produção artística foi substituída por um produto meramente mercadológico e descartável, a televisão aberta nacional e internacional se tornou uma reprodutora do ideário dominante, bem como, as rádios e revistas de grande circulação.
O mesmo caminho seguiu as tradições festivas e culturais do país, que ganharam um valor de mercado e atualmente nada mais é, do que mercadorias expostas nas prateleiras do mercado neoliberal, substituindo costumes, tradições populares, pela necessidade de geração de lucro, tanto para produtores de eventos, quanto para o Estado Burguês. Este modelo de sociedade tem sido pensado e colocado em prática com o objetivo de garantir a manutenção da ordem dominante burguesa, ampliando o processo de dominação cultural, o que certamente favorecerá a permanência do capitalismo como modo de produção hegemônico por todo o planeta, pois esse processo que hoje está em curso no Brasil é também desenvolvido em todos os cantos desta nossa nave mãe e certamente não será fácil derrota-lo, já que ele se estabeleceu como ideologia.
Só para ilustrar o que foi discutido acima, vejam a qualidade da produção musical hoje no Brasil e no mundo. Veja quem são os grandes ídolos das atuais gerações e como são pensadas as músicas, as danças, os eventos culturais como o Carnaval, e o São João no Brasil. Vejam como está o nosso futebol, quem são os grandes ídolos do nosso esporte de forma geral? Onde estão os jovens nascidos de famílias de trabalhadores? É de fato um novo momento, pensado e construído gradativamente pelos senhores do modo de produção capitalista.
O culto a estereótipos e caricaturas de humanidade, a ostentação e a busca pelo “TER”, em detrimento de uma mentalidade humanizadora da sociedade, a busca irracional pela acumulação de riquezas e a necessidade juvenil de se estabelecer como inseridos em um grupo social, a construção de uma mentalidade coletiva, fútil, banal e individualista, voltada para a propriedade dos itens postos como “moda”, tem sido a tônica deste novo momento social e histórico. É esta nova geração que será responsável pelo futuro da humanidade, que herdarão a responsabilidade de construir uma nova ordem social onde prevaleça o cuidado com a vida, com o Planeta Terra, com a construção de uma um mundo mais justo, mais fraterno do que o atual. Diante deste processo de desconstrução da humanidade com ser humano, as gerações futuras estarão prontos para garantir essa nova ordem?
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* João Paulo Pereira é licenciado em História pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia em 2001, Especialista em Gestão Escolar, Professor fundamental II da rede pública municipal de Anagé e Professor de ensino médio na rede estadual em Vitória da Conquista, Bahia.
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