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PCB 100 Anos – Rápidas Rememórias da Minha Juventude!
*por Edwaldo Alves Silva
Em 25 de março de 2022 foi comemorado o centenário do PCB, fundado como Partido Comunista do Brasil/PCB. Esse fato histórico inevitavelmente trouxe-me a lembrança da juventude e a minha formação política nessa organização. No mesmo ano de sua fundação – 1922 – realizou-se em São Paulo a Semana da Arte Moderna acontecimento que revolucionou a cultura brasileira. É interessante destacar que os dois eventos históricos que completam 100 anos tinham forte influência europeia: o PCB inspirado na revolução proletária de 1917, na Rússia. A Semana de Arte Moderna largamente influenciada por intelectuais e artistas de vanguarda e “futuristas” da Europa.
Sempre perseguido, poucos foram os anos de legalidade do
partido. Esta situação aconteceu apenas em pequeno período na década de vinte,
nos anos trinta concorreu às eleições sob o Bloco Operário Camponês e no após segunda
guerra teve rápida ascensão eleitoral legal, bruscamente interrompida pela
cassação do seu registro em 1947, quando se iniciava a chamada “guerra fria” em
todo mundo. Em 1961, o partido alterou o nome de partido Comunista do Brasil
para Partido Comunista Brasileiro, mas mantendo a sigla histórica PCB. Essa mudança foi a forma
encontrada para se defender das tentativas das forças reacionárias de impedir o
registro legal da organização acusando-a de suposta vinculação e subordinação internacionalistas
à potência estrangeira, no caso a extinta União Soviética. Além da simbologia e
da política em favor dos trabalhadores, do povo e dos interesses nacionais também
ficou conhecido como o “partidão”, porque durante anos foi reconhecido como a
principal organização política de esquerda no Brasil. A alteração do nome do
partido também fez eclodir as profundas divergências internas existentes no
interior do partido, principalmente em sua Comissão Executiva Nacional. Desde a
denúncia da política de culto à personalidade e dos crimes de J. Stalin, no XX
Congresso do PCUS, alguns dirigentes
históricos não aceitavam as novas concepções contidas na Declaração de março de1958,
acusando-as de revisionistas. Esses fatos desencadearam a ruptura de dirigentes
nacionais que organizaram um novo partido recuperando o nome “do Brasil”, mas
criando uma nova sigla: PCdoB. A
nova organização imediatamente vinculou-se ao Partido Comunista Chinês que na
ocasião continuava a defender o nome e a política de J. Stalin, logo o PCdoB ligou-se ao Partido do Trabalho
da Albania, stalinista e governante no pequeno país europeu. No centenário de
fundação do Partido, os dois PC’s comemoraram
e rememoraram a história dos comunistas e a suas lutas em favor dos
trabalhadores, da democracia, dos interesses nacionais e do socialismo.
Ingressei na juventude comunista exatamente neste momento, em
1962, em Santos. Aliás, a UJC não
existia mais porque o Comitê Central a extinguiu porque decidiu que a autonomia
da UJC criava muitos problemas. Foi
substituída pelo Comitê Juvenil que era ligado diretamente ao Comitê Municipal
que designava um assistente para manter a ligação. O Comitê Juvenil era constituído
basicamente por estudantes, que se organizavam nos colégios e faculdades,
formando as Organizações de Base (OO.BB.)
O trabalhador jovem se organizava em seu local de trabalho ou no seu bairro de
moradia. Como eu também trabalhava sempre busquei me vincular aos trabalhadores
comunistas. O PCB, em Santos, era
majoritariamente operário, formado por estivadores, portuários, petroleiros,
químicos, metalúrgicos, bancários, comerciários e trabalhadores em geral. Apesar
da gente achar que era subestimado e desprezado pelos dirigentes, hoje, entendo
que não havia discriminação contra os estudantes, apesar de alguns mais
“obreristas” nos considerar uns “espiroquetas” (atualmente o que se chama
“porra-louca”) e que éramos bons para agitar, distribuir panfletos e pichar
muros. Apesar disso, é interessante notar que o secretário político municipal
era um jovem estudante de direito de 21/22 anos.
Santos possuía um
fortíssimo movimento operário/sindical, organizações de bairros e representação
estudantil. Eleito diretor do Centro dos Estudantes de Santos logo participei
do tripé da política partidária: Fórum Sindical de Debates e Sindicatos, União
das Associações de Melhoramentos de Bairros e o Centro dos Estudantes de
Santos, todos sob o comando do PCB. Na
época, o prefeito era do PTB então pontualmente
um aliado, nas bases operárias era comum alianças em alguns sindicatos e em
outros renhida disputa.
Essa situação política provocava divergências partidárias
internas principalmente quanto envolviam ações com o movimento estudantil.
Lembro-me de uma manifestação dos estudantes contra o aumento das passagens no
transporte coletivo com barreiras no tráfego, passeatas, ocupação da prefeitura
e outras ações que inicialmente contaram com total apoio da direção do partido
até que um acerto no gabinete do prefeito provocou a orientação de encerrar o
movimento, mesmo sem o atendimento completo de todas as reivindicações
iniciais. A situação interna ficou tensa por um bom tempo. Mas, logo a gente voltou
a funcionar como tropa de agitação nas muitas greves que ocorreram, algumas de
importância nacional como as greves políticas durante o governo Jango e às
vésperas do golpe militar.
Menciono alguns acontecimentos da época para tentar
ilustrar o cenário em que vivia um jovem comunista naquela que era conhecida
como a “cidade vermelha”. É fácil perceber que o partido não tinha registro
legal mas atuava abertamente, em que pese ocasionalmente alguns serem presos e
nas ações de massas de ruas sofrerem dura repressão. A institucionalidade
burguesa sempre buscou manter o partido na ilegalidade para impedi-lo de
participar das eleições com a sua própria cara. No momento histórico atual de
fortalecimento da democracia no pós-ditadura, a existência legal dos partidos
comunistas e das organizações de esquerda é altamente positivo e verdadeiro
aperfeiçoamento das instituições democráticas. No entanto, as classes
dominantes brasileiras e seus representantes não desistem de seus objetivos
antidemocráticos, buscando impor por meio da mídia comercial e social recheadas
de calúnias e desinformações, de alterações legislativas restritivas e golpes
como os desferidos contra a presidenta Dilma e o líder do PT Lula. Hoje, é
evidente que o anacrônico anticomunismo é desfechado contra o PT e a esquerda
em geral objetivando criminalizar suas organizações. ,
Insisto nesse tema
porque julgo importante precisar as condições de clandestinidade e ilegalidade vividas
pelo PCB. O partido começou a
enfrentar dura repressão após a derrota da insurreição militar de 1935 agravada
com o golpe de 1937 que instalou a ditadura do Estado Novo getulista. Após
curto período de legalidade 1945-1947, foi cassado o registro e seguiu-se um
período de ilegalidade mas sem violenta repressão policial. O golpe cívil-militar
de 1964 trouxe novamente a repressão com prisões, torturas e assassinatos para
os comunistas, democratas e a esquerda em geral. Faço a distinção entre
ilegalidade e clandestinidade porque são realmente diferentes. Quem as viveu
sabe disso. Nem sempre o partido funcionou observando as condições reais da
repressão. Nos períodos de ilegalidade o partido atuava abertamente não podia
agir com o seu nome e seus militantes não podiam se organizar em partido (como
se isso fosse possível!). Era um absurdo político, podia ser comunista (livre
opinião) mas não podia se organizar em partido. Meu exemplo é marcante: fui
sequestrado, preso em local repressivo clandestino, torturado, processado e
condenado não por ser comunista, mas por tentar organizar o partido. Hoje, uma
maluquice como essa é vista como uma piada, mas em outros momentos históricos o
sistema político-jurídico considerava tal aberração normal e legal.
O PCB nesses cem
anos viveu raros momentos de legalidade, muitos de ilegalidade e também de
clandestinidade. Na ilegalidade prosseguia com a sua política sem
identificar-se abertamente, na clandestinidade desenvolvia a política em favor
dos trabalhadores e da nação buscando preservar a vida de seus militantes. Nunca
se abateu mesmo diante das mais duras perseguições e repressão. A história
brasileira, infelizmente, é manchada pelo sangue de heroicos combatentes
comunistas que dedicaram sua vida na luta pela democracia, o progresso social e
o socialismo. Atualmente a derrota da ditadura militar e o advento democrático
garante o pleno funcionamento legal dos PC’s e dos comunistas que militam em
outros partidos e organizações de esquerda.
O PCB ontem e o
Partido dos Trabalhadores hoje são as minhas escolas de consciência e de vida.
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